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O impacto ambiental não é contabilizado

O Globo, Economia, p. 28
Autor: GIANNETTI, Eduardo
17 de Jan de 2010

O impacto ambiental não é contabilizado
Economista defende que PIB e sistema de preços levem em conta critérios verdes, como poluição e desmatamento

Entrevista: Eduardo Giannetti

Economista de formação e professor do Instituto de Estudos e Pesquisas (Inesp), o mineiro Eduardo Giannetti, 52 anos, está convencido de que o modo convencional como os países medem sua economia está anacrônico. Não só a forma com que "contabilizamos a economia", mas o sistema de preços vigentes também deixa a desejar no tocante aos impactos ambientais. Defensor de um PIB (Produto Interno Bruto, conjunto de bens e serviços do país) verde, Giannetti resume porque as decisões importantes foram adiadas para a próxima Conferência do Clima : "É que o ideal para cada país é que todos façam esforço, menos ele".

Liana Melo

O Globo: O senhor virou um crítico feroz do PIB. Por quê?

Eduardo Giannetti: Tanto o sistema de preços como a forma como contabilizamos os fatos em economia deixam a desejar no tocante ao impacto ambiental.

Como assim?

Giannetti: Vamos supor que uma comunidade, ao se desenvolver, polui todas as fontes de água potável e passa a ser obrigada a engarrafar água e distribuí-la. O PIB desse país vai aumentar, no lugar de diminuir. Tudo porque algo que não era transacionado pelo mercado e que não passava pelo sistema de preços passou a ser contabilizado.

O senhor poderia dar um exemplo desse anacronismo do PIB, no caso brasileiro?

Giannetti: Se derrubamos nossa floresta para vender madeira no mercado internacional, o PIB brasileiro vai dar um salto fantástico. Só que, ao optarmos por esse caminho, estaremos empobrecendo as gerações futuras. É mais ou menos como vender a prata da família para ir jantar fora.

O senhor também considera o sistema de preços caduco?

Giannetti: Claro, ele padece de defeitos gravíssimos. O sistema de preços não registra o impacto ambiental das ações humanas. Basta compararmos o custo de geração de energia em uma usina eólica com uma termoelétrica: US$ 0,17 contra US$ 0,03 o quilowatt/hora.
Nesse custo monetário, não está embutido o valor real da poluição provocada por uma termoelétrica.

Então a tonelada de gás carbônico gerada deveria ser precificada?

Giannetti: É preciso mudar o sistema de preços, porque ele só capta o custo monetário das atividades econômicas. O impacto ambiental não é contabilizado. O sistema de preços capta apenas uma parcela do custo, que é a monetária.

No lugar de precificar o custo das emissões de CO2, embutir um imposto no preço final do produto não seria uma alternativa?

Giannetti: Estou convencido de que só teremos uma mudança estrutural nas decisões de investimento e nas de consumo à medida que o impacto ambiental for incorporado aos produtos, na forma de preço e não de imposto voluntário. As pessoas se declaram preocupadas com o aquecimento global, mas quando se fala em pagar voluntariamente, ninguém quer pagar a conta.

Um dos motivos de a COP-15 (Conferência do Clima de Copenhague) não ter avançado é porque ninguém quer pagar a conta?

Giannetti: O ideal para cada país é que todos façam esforço, menos ele.

O Protocolo de Kioto expira em 2012, e o resultado não é dos mais alvissareiros. Por quê?

Giannetti: O Protocolo de Kioto revelou-se um acordo com uma série de problemas. Alguns dos países signatários, como a Espanha, não fizeram nada. Os espanhóis aumentaram suas emissões de CO2 após a assinatura do acordo, enquanto os Estados Unidos, que sequer são signatários, avançaram mais que a Espanha. Precisamos ter mecanismos para garantir o cumprimento do acordo.

O senhor se considera uma pessoa pessimista?

Giannetti: O que me preocupa no Brasil é a combinação da nossa história com a nossa geografia. Geograficamente, fomos premiados com um patrimônio ambiental único. Só que nossa história é pautada pelo imediatismo. Faz parte da nossa formação histórico-cultural essa incapacidade de agir no presente tendo em vista o futuro e o longo prazo. Um dia de sol no planeta, pelo que ele tem de luz e calor, vale mais do que todas as reservas de petróleo no mundo. (Liana Melo)

O Globo, 17/01/2010, Economia, p. 28

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