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O declínio da moderna biotecnologia no Brasil

CB, Direito & Justiça, p. 1
Autor: MINARÉ, Reginaldo
07 de Nov de 2005

O declínio da moderna biotecnologia no Brasil

Reginaldo Minaré
Advogado, diretor Jurídico da ANBio (Associação Nacional de Biossegurança)

Relatório elaborado pela Comissão Européia, em 2004, e disponível em sua página na Rede Mundial de Computadores, afirma que a indústria biotecnológica tem continuado a se desenvolver no mundo e que após leve queda na confiança dos investidores, a partir de 2000, iniciou-se, em 2003, uma recuperação nos Estados Unidos e na União Européia (UE).
Enquanto a UE identifica um aquecimento dos investimentos em biotecnologia, a partir de 2003, no Brasil a situação é radicalmente contrária, e os números disponíveis na página da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) não deixam dúvidas.
Para ilustrar a situação, basta fazer uso do índice referente à pesquisa de campo com organismos geneticamente modificados (OGMs,) que é uma etapa de fundamental relevância para o desenvolvimento tecnológico na agricultura, setor que é responsável por significativa parcela do Produto Interno Bruto, PIB, brasileiro.
De 1997 a 2002, a CTNBio emitiu pareceres favoráveis à realização de 621 experimentos de campo com OGMs, ou seja, uma média anual de 103,5 experimentos. De 2003 a 2005, a CTNBio emitiu 40 pareceres em pedidos de experimentos de campo com OGMs, ou seja, uma média anual de 13,3 experimentos. Verifica-se, portanto, que a soma dos três últimos anos é menor que a média anual dos seis anos anteriores a 2003.
Para complicar ainda mais a situação da biotecnologia no Brasil, desde 24 de março de 2005, por falta de regulamentação da Lei 11.105/05 (lei que disciplina as atividades no âmbito da engenharia genética), a CTNBio não está funcionando e nenhum projeto está sendo avaliado. Todos os pleitos envolvendo engenharia genética, inclusive projetos de pesquisas, não caminharam nenhum passo, desde março de 2005. Estamos, portanto, já no oitavado mês de total paralisação do setor.
O artigo 84 da Constituição Federal (CF), que dispõe sobre a competência privativa do presidente da República, estabelece em seu inciso IV que compete ao chefe do Poder Executivo expedir decretos e regulamentos para fiel execução das leis. Já o inciso I, do parágrafo único, do artigo 87 da CF dispõe que compete ao ministro de Estado referendar os atos e decretos assinados pelo presidente da República.
Com relação à obrigatoriedade ou não do referendo ministerial em decreto assinado pelo presidente da República, as opiniões doutrinárias são divergentes. Alguns entendem que um decreto assinado pelo chefe do Poder Executivo e não referendado pelo ministro da área relacionada deve ser considerado um ato nulo. Outros entendem que o fato do decreto não ser referendado por ministro não interfere na sua validade e que não será por isso que o ato deixará de valer e ter eficácia.
Essa divergência quanto à função da referenda ministerial já chegou ao Supremo Tribunal Federal (STF), e o ministro Celso de Mello, em decisão proferida no Mandado de Segurança 22706-1, reconheceu que esta não se qualifica como requisito indispensável de validade dos decretos presidenciais.
Sem dúvida, a decisão do ministro Celso de Mello e a posição dos doutrinadores que defendem entendimento semelhante apresentam maior razoabilidade com o trato da matéria. Pois, em nosso sistema presidencialista, os ministros são meros auxiliares do presidente, e são nomeados ou demitidos a critério do próprio presidente. Assim, o ministro que não concordar com o pensamento de seu chefe, negando-se a referendá-lo e não o convencer com sua argumentação, caso não peça para deixar o cargo poderá ser demitido. A questão, portanto, é tema de relacionamento do ministro com o presidente da República.
Outra hipótese que reforça a razoabilidade desse entendimento é o fato de que vários decretos são interministeriais, e vários são os Ministros que os referendam após a assinatura do presidente da República. Não é razoável que um decreto não possa ser publicado se um Ministro resolver não referendá-lo, pois se chegaria ao absurdo do País ficar esperando que o presidente da República convencesse o subordinado teimoso ou o demitisse, nomeando outro com disposição para fazê-lo.
Diante, portanto, do comando contido no texto da CF, do entendimento da maioria dos doutrinadores e da decisão do STF, resta cristalino que a pessoa competente para expedir decreto necessário à fiel execução de uma lei não é outra senão o Presidente da República. Concluindo, é de se imputar ao chefe do Poder Executivo quaisquer conseqüências oriundas do retardo no processo de regulamentação da Lei de Biossegurança.

CB, 07/11/2005, Direito & Justiça, p. 1

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