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O "corredor polonês" da usina de Belo Monte

Valor Econômico - http://www.valoronline.com.br
Autor: Roberto Messias Franco
31 de Mar de 2010

As cidades devem se preparar porque Belo Monte vai atrair para a região 100 mil trabalhadores com seus familiares

A menos de um mês do leilão para escolher o grupo de investidores que construirá a Usina Hidrelétrica de Belo Monte, vale uma reflexão sobre a licença concedida pelo Ibama. As 40 condicionantes da licença prévia transformaram-se em uma espécie de "corredor polonês" pelo qual o empreendedor terá de passar antes de iniciar as obras.

A licença prévia não autoriza obras, mas prepara o caminho. As exigências severas visam assegurar a viabilidade da hidrelétrica, mitigar danos ambientais e melhorar as condições de vida da população a ser atingida com o projeto.

Ao longo de seis anos consecutivos, o empreendedor terá de testar o hidrograma de consenso e verificar se o volume mínimo de água previsto para passar pelo trecho de vazão reduzido é suficiente para gerar energia, manter o modo de vida da população e conservar o meio ambiente, ao mesmo tempo.

Os testes deverão estar associados a um robusto plano de monitoramento de aspectos socioambientais como qualidade de água, quelônios, pesca, navegação e modo de vida da população do trecho no Xingu conhecido por Volta Grande.

Em consonância com a Agência Nacional de Águas, o Ibama cobrou do empreendedor a apresentação de projeto de transposição das embarcações no barramento no sítio Pimental. O empreendedor também deverá apresentar soluções que permitam aos ribeirinhos e índios continuarem navegando no trecho do rio Xingu submetido à vazão reduzida e no rio Bacajá, durante a construção e a operação da usina.

A expectativa de atrair cerca de 100 mil trabalhadores com seus familiares para atuarem diretamente na obra ou assumirem empregos indiretos levou o Ibama a determinar ações antecipatórias em Vitória da Altamira, Vitória do Xingu, Brasil Novo, Anapu e Senador José Porfírio. Essas ações servirão para melhorar os serviços de saúde, educação, saneamento e segurança à população e integram os Planos de Requalificação Urbana, Articulação Institucional e Ações Antecipatórias.

O afluxo populacional preocupa pois a região não possui infraestrutura adequada para a população atual. Por isso, o Ibama solicitou investimentos prévios, ou seja, anteriores ao início das obras com o objetivo de minimizar os efeitos da sobrecarga sobre os serviços básicos e essenciais. A implementação dos serviços deve ocorrer de forma gradual, condicionada aos indicadores socioeconômicos pré-estabelecidos.

Antes de pedir a licença de instalação (necessária para o início das obras), o empreendedor deverá ter assinado com entidades governamentais todos os convênios para a execução de tais planos de requalificação. Também deverá entregar ao Ibama um cronograma visando atender gradualmente à demanda suplementar provocada por Belo Monte, "de forma a garantir que os indicadores socioeconômicos sejam sempre melhores que os do marco zero".

O Ibama fez exigências rigorosas também em relação à conservação da natureza. O empreendedor havia apresentado a proposta de criar duas unidades de conservação para proteger os igarapés e o Ibama pediu outras três (uma de proteção integral e duas de uso sustentável) para proteger cavernas de alta relevância, as praias de reprodução de quelônios e o ambiente de pedrais, ao final do remanso do reservatório do Xingu e a confluência dos rios Xingu e Iriri .

A unidade de proteção dos quelônios deverá funcionar como um laboratório natural de pesquisa para avaliação do impacto da obra no comportamento e estado de conservação do rio, das ilhas, das praias, da fauna e da flora. O espaço poderá também ser explorado pelo turismo ecológico.

O empreendedor também terá de elaborar um programa de manejo de quelônios de longo prazo, com duração mínima de 20 anos, a ser aplicado abaixo e acima da usina. A proposta envolve ações relativas à reprodução, uso sustentável, avaliações genéticas, entre outros. Prevê também o treinamento de ribeirinhos, populações tradicionais e indígenas para manejar essas espécies, com monitoria permanente do Projeto Quelônios da Amazônia, e programa de educação ambiental.

Além de constar como público alvo dos programas de quelônios, os indígenas serão contemplados em outros planos específicos seguindo orientação integral da Fundação Nacional do Índio (Funai) para que seus modos de vida sejam mantidos. As terras indígenas Arara da Volta Grande e Paquiçamba, situadas no trecho da Volta Grande do rio Xingu, e a dos Jurunas, do Km 17, foram inseridas no Grupo I da Funai, que engloba as áreas onde os impactos se darão de forma direta.

Uma das condicionantes prevê a largura média de 500 metros para as Áreas de Preservação Permanente em torno dos reservatórios e dos canais com o objetivo de garantir a qualidade da água, a preservação de corredores para a fauna e a proteção de cavernas. Segundo a legislação ambiental, a APP varia de 30 a 500 metros.

Outra preocupação foi com o grande volume de pedras e terras a ser removido durante a construção. O Ibama determinou o aproveitamento dos materiais provenientes das escavações obrigatórias durante a construção da usina ou outras construções associadas, como casas, estradas, aterros. Salvo autorização prévia, estão proibidas aberturas de novas jazidas para atender essas obras.

O empreendedor terá também de assinar termo de compromisso com as prefeituras que estão inseridas dentro da área de influência da hidrelétrica e ainda não possuem planos diretores, assegurando a elas recursos técnicos e financeiros necessários para elaborar esses documentos.

Quando cumprir todas as condicionantes, o empreendedor estará habilitado a pedir ao Ibama a licença de instalação. Só então, poderá começar as obras.

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