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O Brasil tem uma meta climática decepcionante, lamenta pesquisador

O Globo, Sociedade, p. 8
Autor: WASCOW, David
01 de Fev de 2021

'O Brasil tem uma meta climática decepcionante', lamenta pesquisador

David Waskow, diretor da Iniciativa Internacional de Clima da ONG WRI, afirma que países que não combaterem gases estufa ficarão para trás na economia no século XXI

Renato Grandelle

RIO - Uma das primeiras ordens executivas assinadas pelo presidente americano Joe Biden ao entrar no Salão Oval, na quarta-feira passada, sacramentou o retorno dos EUA ao Acordo de Paris. O republicano Donald Trump anunciou em 2017 o desembarque do maior documento climático da História, que havia sido assinado dois anos antes por cerca de 190 países, e levou Washington à condição de pária nas negociações ambientais. Agora, seu sucessor na Casa Branca busca algo como uma redenção nacional junto à comunidade internacional. Este é o diagnóstico de David Waskow, diretor da Iniciativa Climática da ONG World Resources Institute.

Waskow acredita que boa parte dos governantes está engajada nas discussões ambientais. Há, no entanto, aponta, alguns resistentes, e entre eles está o presidente Jair Bolsonaro. O diretor do WRI defende novos financiamentos para a conservação da Amazônia, mas critica a falta de ambição do Brasil no combate às mudanças climáticas - a inoperância, segundo ele, pode fazer com que o país perca espaço na economia global.

Os Estados Unidos retornaram ao Acordo de Paris, como prometido pelo presidente Joe Biden. O que esta medida significa para o país e o mundo?

Biden deixou claro seu compromisso de colocar a mudança climática no centro de sua política externa. Este tema não será isolado de outras pautas do país, como a economia e a segurança. Será fundamental para a forma como a Casa Branca vai se relacionar com outros países.

Ainda na campanha eleitoral, Biden afirmou que as florestas tropicais no Brasil estão sendo destruídas. O presidente Bolsonaro escreveu no Facebook que interpretou este comentário como uma ameaça de sanções econômicas, e reiterou a soberania brasileira. Como será o relacionamento entre estes líderes?

Biden já sinalizou claramente que quer trabalhar com países dispostos a enfrentar as mudanças climáticas - e isso deve ser feito por diversas maneiras, da promoção de energias renováveis ao investimento em resiliência contra eventos extremos. Provavelmente os primeiros esforços do novo governo americano serão voltados para ajudar o brasileiro a proteger seus recursos naturais na região amazônica. Acho que haverá um solo fértil para essas ações, considerando o apoio que essas iniciativas têm angariado entre o empresariado e governos estaduais.

Os EUA deveriam participar de algum financiamento contra a devastação da Amazônia?

Sem dúvida. Além do Fundo Amazônia (sustentado por doações feitas por Alemanha e Noruega), a comunidade internacional deve discutir a criação de um novo financiamento para a conservação da floresta. É uma pauta que deve ser tratada pelos governos.

Sem Trump na Casa Branca, qual será o destino do governo brasileiro, que era fortemente alinhado ao republicado, em fóruns ambientais, como a Conferência do Clima?

Será fundamental que todos os países encontrem maneiras construtivas para o avanço da implementação do Acordo de Paris, bem como em outros fóruns internacionais. O acordo envolve mais de 190 países e é voltado para questões complexas, como as negociações relacionadas ao mercado de carbono, ao mesmo tempo em que tenta reduzir as emissões de gases de efeito estufa.

Por que os temas ambientais são cada vez mais importantes para as relações diplomáticas e comerciais?

A mudança climática é a maior ameaça à Humanidade e às nossas sociedades no século XXI, e as formas de combatê-la, como proteger florestas e recursos naturais, podem estar entre as maiores impulsionadoras do crescimento econômico e da prosperidade nas próximas décadas.

Um estudo do WRI Brasil mostra que a adoção de uma economia verde pode render ao país US$ 535 bilhões até 2030, além da criação de 2 milhões de empregos. Setores como como agricultura, infraestrutura e inovação industrial não são prejudicados - pelo contrário, poderiam ter a produção aumentada e ser mais competitivos no mercado. Seria bom para o Brasil e para os brasileiros.

Então, tanto os impactos das mudanças climáticas quanto as ações necessárias para reduzir as emissões integram os desafios econômicos e internacionais que os países enfrentam e que terão de enfrentar em suas relações diplomáticas.

No final do ano passado, em uma convenção global, diversos governos apresentaram novas metas para enfrentar as mudanças climáticas. O Brasil não seguiu este caminho - divulgou um documento que flexibilizaria ainda mais o controle de emissões. O que podemos esperar a partir de agora?

Todos os países devem estabelecer metas para zerar suas emissões de gases de efeito estufa até 2050. Para isso, esperamos que eles apresentem, desde agora, os compromissos que seguirão até 2030. São estas metas que apontarão qual será seu status a longo prazo, ou seja, no meio do século.

A China avançou significativamente, mostrou muito bem como pretende zerar suas emissões. A União Europeia e o Reino Unido também adotaram metas bastante ambiciosas que devem cumprir até 2030. Na América Latina, vimos que Chile, Colômbia e Peru também estão seguindo o caminho certo.

Esperamos que, em 2021, outras nações juntem-se ao grupo das mais ambiciosas - temos grandes expectativas em relação a EUA, Canadá, Japão, Coreia do Sul e África do Sul.

O Brasil tem uma meta climática decepcionante para 2030. O mesmo pode ser dito sobre Austrália e México. As nações que não se planejarem a partir de agora, de forma assertiva, ficarão para trás na economia do século XXI.

O Globo, 01/02/2021, Sociedade, p. 8

https://oglobo.globo.com/sociedade/sustentabilidade/o-brasil-tem-uma-me…

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