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'Nunca se precisou tanto da ONU'

O Globo, Mundo, p. 23
Autor: VIOTTI, Maria Luiza Ribeiro
02 de Jan de 2017

'Nunca se precisou tanto da ONU'
A diplomata Maria Luiza Ribeiro Viotti foi a primeira mulher a chefiar a Missão Permanente do Brasil na ONU. Também já foi embaixadora na Alemanha. Secretária-geral de Ásia e Pacífico do Itamaraty, ela foi nomeada chefe de gabinete do português António Guterres, o novo secretário-geral, que tomou posse ontem.
"Se a ONU não existisse, estaríamos numa situação ainda mais caótica e complicada"

CELINA MACHADO
internacio@oglobo.com.br

Com António Guterres à frente da ONU, aumentam as chances do Brasil a uma vaga permanente no Conselho de Segurança?
A reforma do Conselho de Segurança envolve uma mudança na Carta da ONU. No fundo não depende do secretário-geral e sim dos países membros.

Como tornar a ONU mais relevante, já que suas resoluções têm sido ignoradas com frequência por alguns países?
A grande questão é como mobilizar os países para implementarem essas resoluções. Isso não depende muito do secretariado da ONU, mas dos países-membros.

Como a ONU pode pressionar mais os governos em favor dos refugiados?
A ONU precisa e vai fazer mais na gestão de António Guterres para a solução dos conflitos que são a origem do grande fluxo de refugiados. Ele já está muito interessado em se colocar à disposição dos paísesmembros na questão da Síria, nas outras situações de conflito no Oriente Médio. Tenho a impressão de que ele vai procurar ser muito atuante nessas questões.

O que pode ser feito pelos refugiados que chegam à Europa?
É preciso mostrar que os refugiados não podem ser penalizados pelo terror.

O que a senhora considera mais importante para os refugiados?
É muito importante promover a integração dos refugiados à sociedade onde eles se encontram através de oportunidades de emprego, mesmo que temporário.

Como a senhora vê o futuro da atuação da ONU?
Nunca se precisou tanto da ONU como hoje, neste cenário tão conturbado. A ONU pode criar espaços de negociação. Se a ONU não existisse, estaríamos numa situação ainda mais caótica e complicada. Embora a ONU seja uma governança imperfeita, é um espaço que torna soluções viáveis e possíveis.

A que país a senhora daria um prêmio de bom negociador em 2016?
Há alguns exemplos brilhantes. No no início de 2016, tivemos uma evolução muito positiva na situação do Irã, com a negociação pela qual foi possível assegurar a natureza pacífica do programa nuclear e, com isso, a remoção do regime de sanções multilaterais e a recuperação do Irã no seio da comunidade internacional. Foi uma negociação muito bem sucedida e o prêmio iria para todos os atores que participaram, o grupo chamado E3+3, que são os três europeus - França, Reino Unido e Alemanha - mais Estados Unidos, Rússia, China, e o Irã, naturalmente. Outro evento positivo foi a negociação entre Cuba e Estados Unidos, mediada pelo Vaticano e com apoio da Venezuela. Houve também o acordo de paz na Colômbia.

Como foi a experiência como embaixadora na Alemanha?
Muito boa, é um parceiro extraordinário do Brasil. São relações muito positivas, mutuamente relevantes e próximas, que vão continuar sólidas. Há uma presença muito importante da Alemanha no Brasil, através da imigração das comunidades de ascendência alemã, da forte presença de empresas aqui, em torno de 1.400, muitas delas há quase cem anos ou até mais, com relevante comércio bilateral. A cooperação em matérias de ciência, tecnologia, inovação também é muito importante. Houve também um desdobramento muito interessante, pois um grande número de estudantes do programa Ciência Sem Fronteiras escolheu as universidades alemãs para a realização dos seus programas. Tivemos mais de sete mil alunos brasileiros no período entre 2011 e 2014.

E que outras parcerias são relevantes para o Brasil?
Na área de meio ambiente, de desenvolvimento sustentável, temos também uma cooperação de muitos anos com a Alemanha. Há um projeto fantástico, que pouca gente conhece, que é o Observatório da Amazônia, com equipamentos para medir a emissão de gás carbônico pela floresta. A Alemanha valoriza a relação com o Brasil e mantém conosco um mecanismo chamado de Consultas Intergovernamentais de Alto Nível, que eles têm com poucos países.

E quanto às relações com a Ásia e as nações do Pacífico?
Temos uma relação muito tradicional com o Japão. Mas também parcerias novas e muito importantes com a China, que se transformou no principal parceiro comercial do Brasil desde 2009. Há relações muito relevantes com os países da Ásia, que crescem em ritmo acelerado e representam mercados importantes na área de agronegócio, aviões. Com alguns desses países podemos incrementar a cooperação na área de ciência e tecnologia. É uma área extremamente interessante e importante para o Brasil, com a qual temos um acervo de realizações e sobretudo um potencial muito grande ainda a desenvolver. A Índia é um exemplo de país importantíssimo e com o qual também temos uma cooperação tradicional muito forte no plano multilateral e que tem se desenvolvido também muito no plano bilateral, com uma série de iniciativas na área de saúde, agricultura, defesa, uma série de setores nos quais temos aprofundado e fortalecido a cooperação.

O Globo, 02/01/2017, Mundo, p. 23

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