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Novidade nos ares

CB, Brasil, p. 14
16 de Jan de 2005

Novidade nos ares
Sinônimo de luxo no século passado, os dirigíveis ganharão o céu brasileiro. Desta vez, no lugar de cabines de passageiros, os galpões vão levar carregamentos de eletrônicos, frutas e grãos

Érika Klingl
Da equipe do Correio

Na década de 20 do século passado, não havia nada mais chique que viajar de dirigível entre a Europa e as Américas. Oitenta anos depois, a moda dos zepelins vai
aterrissar em solo brasileiro.
Mas, desta vez, o conceito será totalmente diferente. No lugar de cabines de luxo para a elite européia, galpões com capacidade de carga de 500 toneladas, para transportar eletroeletrônicos da Zona Franca de Manaus, grãos do Centro-Oeste ou frutas do Nordeste.
No próximo mês, será formalizada a criação da empresa Air Ship Brasil, que cuidará da produção de 20 dirigíveis no país nos próximos 14 anos. O primeiro deve estar pronto em 15 meses.
Trabalhamos com esse prazo porque a tecnologia já é conhecida.
Só temos que definir que técnica usaremos, afirma o futuro presidente da Air Ship Brasil, Arminak Cherkezian. Uma empresa americana-canadense, a Jim Ferguson, e uma alemã, Zeppelins, brigam pela parceria técnica com os empresários brasileiros. De acordo com Arminak, o martelo será batido até junho.
A idéia de usar dirigíveis na Amazônia surgiu no Exército há 14 anos. O coronel Marcelo Augusto Felippes, atualmente no comando do 11o Depósito de Suprimentos, morava na região e estudou durante mais de uma década as vantagens das aeronaves para vigilância, publicidade e transporte de pessoas e cargas.
Na região, o transporte de cargas é dificultado pelas péssimas condições das rodovias e grande número de assaltos nas estradas.
Além disso, muitas localidades do Norte são inacessíveis.
Parcerias
Sem dinheiro para executar o projeto, o comandante-geral do Exército, general Francisco Albuquerque, disponibilizou a pesquisa para empresários civis por meio do Programa de Excelência Gerencial e, no ano passado, a idéia foi comprada por um grupo de cinco empresas de peso no país, como a Itapemirim, uma das maiores no setor de transporte, e a Engevix, de construção.
A decisão do general Albuquerque de abrir os estudos foi uma colaboração do Exército para o desenvolvimento nacional ou o projeto ficaria na gaveta ainda por muito tempo, afirma o coronel Felippes.
A contrapartida oferecida pelas empresas ao governo virá por duas frentes. Em 11 de novembro do ano passado, uma carta foi assinada por todos os envolvidos.
Nela ficou definido que o Exército terá direito a 2% das horas de vôo dos dirigíveis para transporte de suprimentos para fronteira, reservas indígenas ou operações militares. Além disso, cada aeronave carregará um equipamento de vigilância para supervisionar o território brasileiro, principalmente na Amazônia (leia matéria nesta página).
Tempo reduzido
Existem quatro tipos de dirigíveis no mundo. O menor carrega até quatro toneladas, e o maior, chamado de UL500, tem capacidade para levar 500 toneladas. Vamos investir no maior. Se descobrirmos outro nicho de mercado, pensaremos em outros, afirma o vice-presidente de Indústria e Infra-estrutura da Engevix, Gerson de Mello Almado. Ele é o gerenciador do projeto.
Nos Estados Unidos, onde é produzido, o UL500 custa 40 milhões de dólares. De acordo com Almado, a idéia é reduzir cerca de 15% o preço trazendo a produção para o Brasil, o que pode gerar ,mais de sete mil empregos diretos ,e 20 mil indiretos.
Um UL500 tem a mesma capacidade ,de 30 aviões Hércules, ,que são usados pelas Forças Armadas ,no país. A aeronave pode ,voar até 24 horas sem parar, mas o ideal é que a autonomia de vôo seja de 16 horas diárias. A velocidade média é de 120km/h, mas pode chegar a 170 km/h. A estimativa é que uma viagem de 700 quilômetros, como a que liga Manaus a Boa Vista, gastaria cerca de nove horas no dirigível.
Num barco carregado, a mesma distância exige nove dias. O principal desafio da Air Ship Brasil é trazer para cá a produção dos envelopes, fundamentais para a construção dos dirigíveis. Imaginamos que não haverá problemas em trazer uma empresa com essa tecnologia para o Brasil, porque ela poderá fornecer seu produto para o mercado automobilístico, explica Arminak Cherkezian.

Sistema de Vigilância
Na carta de compromisso assinada em novembro do ano passado entre Exército, Petrobras e as cinco empresas civis interessadas em investir no projeto de dirigíveis na Amazônia, um artigo chama a atenção. Cada aeronave produzida no Brasil carregará um sistema de vigilância, instalado pelo Exército. No mesmo dispositivo, fica definido que o equipamento só poderá ser usado dentro do território brasileiro.
A exigência dará novo gás ao Sistema de Vigilância e Monitoramento da Amazônia (Sivam), inaugurado em 2002 pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso. A idéia é garantir a segurança das fronteiras brasileiras e impedir o contínuo processo de degradação ambiental da Amazônia, assim como a atuação de garimpeiros na região.
Controvérsias
O Sivam foi assinado há dez anos com a empresa norte-americana Raytheon.
Na época, o programa gerou forte controvérsia e chegou a ser investigado por comissão parlamentar de inquérito (CPI) do Congresso Nacional. Nada foi provado e o projeto seguiu o curso. A concepção do Sivam, além de estabelecer os meios para o controle do tráfego aéreo e a segurança de vôo, preocupou-se em dotar as agências governamentais de instrumental preciso para monitorar a exploração das reservas minerais e a manutenção da floresta, uma das últimas do planeta.
O trabalho de vigilância é prioritário para o Ministério da Defesa, entre outras coisas, pelo incremento das ações de narcotraficantes e grupos guerrilheiros na fronteira norte. As Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) penetraram diversas vezes o território nacional em busca de remédios, alimentos e munições.
Além disso, fotos de satélite confirmam o avanço de frentes madeireiras ilegais na Amazônia, com a exploração de espécies ameaçadas, como o mogno, e que aceleram o processo de degradação da floresta tropical. Também não se pode minimizar o aumento de garimpos clandestinos, dilapidando reservas minerais e produzindo severo risco ambiental com o despejo de mercúrio nos rios da região. (EK)

CB, 16/01/2005, Brasil, p. 14

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