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Nova MP para a soja se impoe

OESP, Notas e Informacoes, p.A3
31 de Ago de 2004

Nova MP para a soja se impõe
Está pronta no Planalto a minuta da segunda medida provisória destinada a autorizar o plantio de safras de soja transgênica. Segundo o ministro da Coordenação Política, Aldo Rebelo, o presidente "não está disposto" a assiná-la. Os seus motivos são compreensíveis. A primeira MP, de setembro do ano passado, custou politicamente caro a Lula, embora fosse a resposta possível a um fato consumado - a ampla disseminação da sojicultura transgênica, sobretudo no Rio Grande do Sul, sem uma decisão cabal da Justiça quanto à sua legalidade.
Os ecoxiitas da administraçã/o, empenhados em impedir o uso de sementes geneticamente modificadas (GM) no Brasil, a pretexto da defesa do ambiente, arrancaram a promessa de que a iniciativa não se repetiria. Além disso, o governo alega que fez a sua parte, enviando ao Congresso, um mês depois, o projeto da Lei de Biossegurança. Por fim, o anúncio de que não pretende editar nova MP a respeito é uma forma de pressionar os parlamentares a votar logo a matéria. Na realidade, a omissão tende a beneficiar as forças das trevas. Vejamos por quê.
Os fundamentalistas conseguiram aprovar na Câmara uma versão da proposta governamental, dando ao Ibama - uma trincheira de resistência à biotecnologia - a última palavra sobre a segurança do plantio comercial de transgênicos. Essa atribuição cabia à Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio), o colegiado de especialistas cuja própria heterogeneidade é uma garantia contra a aprovação de pareceres preconcebidos. (Um tribunal federal, aliás, já considerou a CTNBio competente para autorizar, caso a caso, o cultivo de variedades GM.) Quando o projeto começou a tramitar no Senado, na primeira semana de agosto, a sensatez tornou a prevalecer. A comissão de Educação aprovou o substitutivo do paranaense Osmar Dias que devolve à CTNBio as atribuições originais, cabendo a decisão final sobre o plantio comercial de transgênicos a um conselho de nove ministros. Ficou-se nisso. O Congresso só voltou a deliberar na semana passada, na segunda rodada do impropriamente chamado "esforço concentrado" (cujo pífio produto, nessa etapa, foi a aprovação de três medidas provisórias).
O ócio legislativo, neste ano eleitoral, deixou no limbo a questão dos transgênicos. De um lado, está chegando a hora da semeadura da safra 2005 de soja. De outro, os senadores regressaram a seus Estados sem nem sequer votar o requerimento de urgência para a matéria, dispensando-a de passar por três outras comissões antes de ir a plenário. Na remota hipótese de que a urgência seja concedida, e o substitutivo venha a ser aprovado nas próximas sessões deliberativas, de 14 a 16 de setembro, o projeto melhorado terá de voltar à Câmara.
Disso tratam de se aproveitar os partidários do retrocesso. Eles alegam espertamente que, para a Lei de Biossegurança ser sancionada em tempo compatível com o calendário agrícola, o Senado deveria rejeitar o dispositivo em pauta e aprovar o projeto tal qual veio da Câmara. Pois essa versão, que entrega ao Ibama o futuro do agronegócio brasileiro, prorrogou por um ano a medida provisória que liberou o cultivo e a comercialização da última safra transgênica de soja. Mas, a partir de 2005, o plantio dependerá do licenciamento do Ibama.
O trade off, evidentemente, é contrário ao interesse nacional. Equivaleria a vender a primogenitura (a oportunidade que se abre ao País de ingressar na era da biotecnologia para expandir a produção agrícola competitiva, com redução de custos e ganhos de segurança) em troca de um prato de lentilhas (uma concessão válida por uma temporada e restrita a um setor, a que se seguirá um amplo e duradouro sistema de proibições, abertas ou disfarçadas, ao arbítrio daqueles que se orgulham de querer ver o Brasil "livre de transgênicos").
Nesse cenário, a prioridade de um governo que apregoa os seus compromissos com o progresso do Brasil só pode ser a aprovação do substitutivo do senador Osmar Dias - o quanto antes se possível, leve o tempo que levar se necessário, porque a alternativa é impensável. Perto disso, a edição de outra MP para a soja, ou a promulgação de um decreto legislativo com o mesmo fim, será o menor dos males. Lula não desejará jogar de novo na ilegalidade quase todo um setor, que se prepara para produzir 60 milhões de toneladas de grãos.
Pois, com ou sem MP, as sementes transgênicas continuarão a ser as preferidas dos sojicultores. Ainda mais agora, com a queda das cotações no mercado mundial, pressionando por cortes adicionais de custos.

OESP, 31/08/2004, p. A3

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