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Noruega paralisa repasses para o Fundo Amazônia

O Globo - https://oglobo.globo.com/sociedade/
15 de Ago de 2019

Noruega paralisa repasses para o Fundo Amazônia
Ministro do Clima e Meio Ambiente anuncia suspensão de R$ 130 milhões para o Brasil

Renato Grandelle, Cristina Fibe e André de Souza, de Brasília
15/08/2019 - 14:09 / Atualizado em 15/08/2019 - 22:31

O ministro do Clima e Meio Ambiente da Noruega , Ola Elvestuen, anunciou nesta quinta-feira a suspensão dos repasses de 300 milhões de coroas norueguesas, o equivalente a R$ 133 milhões, que seriam destinados ao Fundo Amazônia .

Segundo o jornal norueguês "Dagens Næringsliv" (DN), especializado em negócios, o governo local estaria insatisfeito com a nova configuração dos comitês do Fundo , que está sendo discutida em Brasília. A Noruega e a Alemanha já se declararam contrárias às mudanças .

Por meio de nota, a embaixada do país no Brasil confirmou o corte:

"Dada a conjuntura atual, a Noruega não possui fundamento jurídico e técnico para realizar a contribuição anual do Fundo Amazônia planejada para este ano."

Maiores doadores, Noruega e Alemanha já se declararam contrários às mudanças no Comitê Orientador do Fundo Amazônia (Cofa), responsável pelas diretrizes e acompanhamento dos resultados dos projetos e extinto após decreto do presidente Jair Bolsonaro.

Criado em 2008, o Fundo Amazônia recebeu, até hoje, R$ 3,4 bilhões em doações, sendo que 94% da quantia (R$ 3,19 bilhões) veio da Noruega. O volume de repasses é condicionado ao índice de desmatamento-- quanto maior for seu avanço, menores são as verbas obtidas.

- O Brasil rompeu o acordo com a Noruega e a Alemanha desde o fechamento da diretoria do Fundo Amazônia e do Comitê Técnico. Eles não podem fazer isso sem acordo com a Noruega e a Alemanha - disse Elvestuen ao DN.

O ministro indicou que, nos últimos meses, os índices de devastação da Amazônia se multiplicaram em relação ao mesmo período do ano anterior. De acordo com ele, isso mostraria que o governo brasileiro "não quer mais parar" o desmatamento.

A comunidade científica, segundo Elvestuen, está preocupada que o desmatamento leve o bioma a um "ponto de inflexão" - a devastação seria tamanha que afetaria a formação de chuvas, provocando a destruição de toda a floresta.

- Isso é muito sério para toda a luta pelo clima. A Amazônia é o pulmão do mundo e todos nós dependemos inteiramente da proteção da floresta tropical. Não há cenários para atingir as metas climáticas sem a Amazônia - alertou Elvestuen.

No fim da tarde desta quinta, o presidente Jair Bolsonaro ironizou a decisão da Noruega de cortar as doações.

- A Noruega não é aquela que mata baleia no Polo Norte? Explora petróleo também lá? Não tem nada a dar exemplo para nós. Pega a grana e ajude a (chanceler alemã) Angela Merkel a reflorestar a Alemanha - disse o presidente, após um evento oficial.

O Comitê Orientador do Fundo Amazônia (Cofa), cuja atribuição era determinar diretrizes e acompanhar os resultados obtidos pelos projetos, foi extinto em junho. Nenhuma reunião foi realizada este ano - normalmente, há pelo menos duas.

Programas já são afetados
Em nota, Helder Barbalho (MDB), governador do Pará, estado com maior número de projetos financiados pelo Fundo, disse que fará o que estiver a seu alcance para manter e ampliar as parcerias com a Noruega.

Entre os programas afetados pela revogação do Cofa está o Projeto Frutificar. Aprovada em agosto de 2018, a iniciativa do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam) tinha previsão de ser iniciada neste ano.

A duração prevista do Frutificar é de três anos, com orçamento total de R$ 29 milhões. O programa estimularia a produção de açaí e cacau por mil famílias no Amapá e no Pará.

- É um projeto voltado para comunidades agrícolas de pequeno porte, e que indiretamente contribuiria para a redução do desmatamento - destaca Paulo Moutinho, pesquisador do Ipam. - Quando o governo federal pediu mudanças na operação do Fundo, o programa, que já estava pronto, ficou parado no BNDES. Agora, sem os recursos da Noruega, não sabemos o que vai acontecer com ele.

Adriana Ramos, sócia do Instituto Socioambiental, considera que o corte de doações da Noruega já era previsível:

- A existência do Cofa era uma exigência contratual da Noruega para manter o seu apoio ao Fundo Amazônia. - ressalta. - O comitê foi extinto sem a apresentação de qualquer proposta para substitui-lo. Sua estrutura era importante porque permitia que diversos setores do governo e da sociedade acompanhassem os trabalhos: ministérios, secretarias estaduais, representantes de empresários, cientistas e da sociedade civil.

Para Adriana, a Noruega continuará investindo em programas ambientais da Amazônia, mas sem firmar contratos com o governo federal.

Em nota, a ONG norueguesa Fundação Rainforest reivindica que a iniciativa privada pressione o governo brasileiro a montar uma política ambiental "responsável e previsível":

"A Noruega compra grandes quantidades de soja para agricultura e piscicultura", ressalta o comunicado. "Deve ser claramente dito ao governo brasileiro que uma boa cooperação comercial exige que as autoridades cumpram com acordos e obrigações internacionais".

Na semana passada, em audiência na Câmara dos Deputados, o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, criticou uma suposta "contradição" do governo norueguês , que "fomenta recursos para ONGs" na Amazônia ao mesmo tempo que explora petróleo no Círculo Polar Ártico.

De acordo com o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas, 11% das emissões anuais de gases estufa são provocadas pelo desmatamento de florestas tropicais.

Mudança de rumo
Desde o início do governo Bolsonaro, o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, critica a destinação dos recursos do Fundo Amazônia e as supostas "inconsistências" de sua gestão pelo BNDES.

Para Salles, o fundo teria se transformado num mecanismo de mera distribuição de verbas, sem dispositivos de avaliação dos resultados, o que colocaria em risco os objetivos estabelecidos para a sua própria constituição.

O banco de desenvolvimento afastou a chefe do Departamento de Meio Ambiente , Daniela Baccas, responsável pela administração das doações do Fundo Amazônia. No entanto, a Controladoria-Geral da União e os governos da Alemanha e da Noruega não corroboraram as suas críticas de Salles. A gestão Fundo também foi elogiada em uma auditoria realizada no ano passado pelo Tribunal de Contas da União

O GLOBO entrou em contato com o Ministério do Meio Ambiente brasileiro, mas ainda não obteve resposta.

A Alemanha já havia anunciado o corte de repasses ao Brasil , mas restritos a projetos de preservação da floresta que não estavam ligados ao Fundo Amazônia. O governo brasileiro reagiu afirmando não precisar do dinheiro do país europeu .

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