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Nobel no Planalto contra o aquecimento global

O Globo, O País, p. 11
08 de Jun de 2008

Nobel no Planalto contra o aquecimento global
Efeito estufa e demanda por energia são desafios da pesquisadora, nomeada por Minc secretária de Mudanças Climáticas

Bernardo Mello Franco

A posse de Carlos Minc no Ministério do Meio Ambiente levou para o governo uma vencedora do Prêmio Nobel da Paz: a nova secretária de Mudanças Climáticas, Suzana Kahn Ribeiro. Professora da Coppe/UFRJ, ela é a única mulher brasileira no IPCC, o painel de mudanças climáticas que recebeu a láurea com o ex-vice-presidente americano Al Gore.
Carioca do Leblon, a pesquisadora ainda espera a nomeação, mas já desembarcou em Brasília com metas ambiciosas. A principal é convencer o país de que o aquecimento global não é conversa de ecologista. E de que seus efeitos, como a elevação do nível do mar e o aumento das enchentes, serão mais dramáticos para os pobres:
- Os temporais afetam mais quem está no alto da favela do que quem está no asfalto. O aquecimento global vai agravar as desigualdades.
Ex-assessora de Minc na Secretaria estadual do Ambiente, Suzana recebeu a missão de ajudar o país a reduzir a liberação de gases que provocam o efeito estufa. Como o desmatamento ainda responde por 55% do carbono que o Brasil joga na atmosfera, ela quer levar a nova bandeira à velha luta contra as derrubadas. Mas lembra que o problema não está só na Amazônia, maior foco da discussão.
- O deslocamento da fronteira agrícola e a abertura de novas pastagens no Cerrado também dão uma contribuição importante para o aquecimento - diz.
A secretária adverte que o festejado crescimento econômico fortalece outro vilão do clima: a demanda por energia. E anuncia uma possível nova briga entre o Ministério do Meio Ambiente e o setor elétrico. Enquanto a gestão de Marina Silva impôs regras mais rígidas ao licenciamento das usinas, Minc quer obrigar os donos de novas termelétricas a investir parte dos recursos na geração de energia renovável - uma norma que já vigora no Rio por decreto do governador Sérgio Cabral.
- Como o potencial hidrelétrico está se esgotando, a matriz energética brasileira vai ficar mais suja. Esse é o setor mais difícil para reduzir as emissões - diz Suzana.

Agenda ambiental urbana deverá ser fortalecida
Secretária coordenou estudo sobre poluição do trânsito em cidades

Num governo em que ministros fortes ainda vêem o licenciamento ambiental como obstáculo ao crescimento, falar em aquecimento global para forçar gigantes do setor elétrico a investir em usinas ecologicamente corretas pode parecer ingenuidade de pesquisadora recém-alçada ao poder.
A secretária Suzana Kahn discorda. Ela diz que o lançamento da Política Nacional sobre Mudança do Clima, feito na quinta-feira pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, mostra que o governo está cada vez mais preocupado com o problema.
- Isso mostra o interesse do presidente de levar o tema a sério. A luta contra o aquecimento global está prestigiada no Planalto - acredita Suzana, que ajudou a formular o projeto de lei antes mesmo de entrar no governo.
A nomeação da pesquisadora da Coppe é uma das faces de outra mudança anunciada na gestão Carlos Minc: o fortalecimento da agenda ambiental urbana. Antes de ser empossado, o ministro prometeu manter o empenho da antecessora na defesa da floresta, mas sem esquecer os 165 milhões de brasileiros que vivem fora da Amazônia e estariam mais preocupados com problemas como a falta de saneamento e a poluição de rios e lagoas. Suzana entrou para o seleto time do IPCC ao coordenar um estudo sobre a contribuição do trânsito nas grandes cidades para o aquecimento do planeta. No ministério, ela quer exigir que os veículos passem a sair da fábrica com etiquetas informando seu volume de emissão de carbono.
- Ninguém mais compra geladeira que emite CFC, um dos maiores destruidores da camada de ozônio. O governo já tem um programa de etiquetagem dos veículos pronto, mas ainda não conseguiu retirá-lo do papel - reclama a secretária, que também prepara um plano nacional para capturar gás metano dos lixões.
Governo poderia dar bons exemplos
A pesquisadora admite desconfiar das propagandas que prometem neutralizar emissões de carbono, mas diz que a badalação em torno do aquecimento global pode incentivar a iniciativa privada a investir em tecnologias mais limpas. Ao mesmo tempo, quer que o governo dê bons exemplos evitando o desperdício, comprando móveis de madeira certificada e adotando programas rigorosos para economizar energia nos prédios públicos. Animada com o desafio de emprestar sua experiência acadêmica à política, a secretária lembra que o consumidor individual também tem sua responsabilidade na elevação dos termômetros:
- As pessoas tendem a culpar o madeireiro, mas esquecem de verificar se o carvão vegetal do seu churrasco é fruto do desmatamento. (Bernardo Mello Franco).

O Globo, 08/06/2008, O País, p. 11

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