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No IDH Ambiental, Brasil dá salto

O Globo, Economia, p. 33-34
26 de Mar de 2007

No IDH Ambiental, Brasil dá salto
Pelo critério da sustentabilidade, EUA despencam em ranking mundial recém-criado

Liana Melo

Se a ONU passasse a incorporar a variável ambiental na avaliação feita, anualmente, pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), uma espécie de dança das cadeiras seria promovida entre as nações. Os Estados Unidos despencariam no ranking, enquanto o Brasil subiria alguns degraus. É que hoje não basta responder apenas a perguntas como: o que é a pobreza? Como medi-la? Quem são os pobres?

E por que são pobres? Desde que o ganhador do Prêmio Nobel de Economia Amartya Sen surpreendeu o mundo, nos anos 90, afirmando que a definição e a medição da pobreza não são uma questão apenas de cifras e médias, muita coisa mudou. Hoje, a pobreza ganhou um aliado de peso na classificação dos países. Os graus de poluição e depreciação dos recursos naturais passaram a ser medidas fundamentais para identificar se um país é mais ou menos sustentável.

Foi na tentativa de responder a essa pergunta que surgiu o IDH Ambiental, um índice híbrido calculado pelos técnicos do BNDES. Ele é uma combinação dos indicadores que compõem o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), de Amartya Sen, e das variáveis do Índice de Sustentabilidade Ambiental (ISA) - uma criação acadêmica concebida nos laboratórios das universidades americanas de Yale e Columbia.

Como nem todos os países que adotam o IDH (um total de 177) usam também o ISA (calculado apenas para 146 nações), o IDH Ambiental só pode ser aplicado nos países que aparecem concomitantemente nas duas listas.

Conclusão: o ranking do IDH Ambiental incluiu apenas 139 países.

Brasil sobe do 54o para o 39o Lugar
O Brasil, por exemplo, saiu bem na foto nesse novo índice. Ele ocupa a 39ª posição, enquanto, no IDH tradicional, está 15 degraus abaixo, ou seja, em 54o lugar entre 139 nações. No entanto, se o país for avaliado apenas pelas variáveis ambientais, ele estará ainda melhor. O Brasil passa a ocupar o 11olugar no ranking do ISA.

- É que, pela concepção da sustentabilidade, não basta verificar o estágio atual do desenvolvimento econômico. É preciso considerar também os aspectos ambientais do desenvolvimento humano - explica Márcio Macedo da Costa, que ajudou Ana Raquel Martins na elaboração do IDH Ambiental.

Assim como o ISA, o IDH Ambiental é uma construção acadêmica desenvolvida por Ana Raquel na sua dissertação de mestrado apresentada na Universidade Federal Fluminense (UFF). Macedo foi seu orientador. Ambos são do BNDES.

É fácil entender a dança das cadeiras no caso brasileiro. Quando a questão da sustentabilidade é incluída, economias maiores, que demandam mais energia e recursos naturais, são mais penalizadas. O Brasil, por exemplo, tem atributos interessantes, já que detém ativos ambientais importantes, como disponibilidade de água e de terras.

Ninguém duvida dos avanços propostos por Amartya Sen no IDH. Ele foi o primeiro a aplicar à economia uma visão social, inovadora e mais realista e humana. Antes, o grau de desenvolvimento dos países era medido única e exclusivamente pelo Produto Interno Bruto (PIB, produção de bens e serviços). Foi ele quem permitiu que as múltiplas facetas da pobreza fossem traduzidas em números. Ao harmonizar IDH e ISA, os técnicos do BNDES se propuseram apenas a complementar o índice do Pnud, que mensurava indiretamente a sustentabilidade, traduzida no IDH pelos indicadores de longevidade e renda.

Maior poluidor do mundo, os Estados Unidos, por sua vez, despencam do oitavo lugar no IDH tradicional para a 15ª posição no IDH Ambiental. É que o país de George W.

Bush ficou abaixo da média em praticamente todas as 76 variáveis ambientais consideradas pelo ISA, em que ficou em 44o lugar. O fato de os EUA não terem assinado o Protocolo de Kioto e se recusarem a cumprir compromissos de redução de emissões de poluentes influenciaram decisivamente para empurrar o país ladeira abaixo nesse índice.

- O ISA apresenta uma conclusão já conhecida, porém ainda não provada, de que a relação entre renda e preservação ambiental não ocorre de forma direta. Ou seja, uma não é necessariamente conseqüência da outra - analisa Macedo. Ele faz questão de ressaltar que os dois não tiveram a pretensão de questionar o IDH, apenas mostrar que esse índice não deve ser utilizado sozinho para apontar exemplos a serem seguidos.

Fica claro no trabalho de Macedo e Ana Raquel que o cuidado com o meio ambiente e a manutenção das potencialidades do desenvolvimento em bases sustentáveis são um desafio tanto para os países desenvolvidos quanto para as nações em desenvolvimento e de baixíssima renda

Traduzindo o economês
Novo paradigma

Uma década separa o Índice do Desenvolvimento Humano (IDH) do Índice de Sustentabilidade Ambiental (ISA). O primeiro é uma invenção do economista indiano Amartya Sen, nos anos 90.

Ele acabou ganhando o Nobel de Economia, em 1998. O ISA foi apresentado no Fórum Econômico Mundial, em 2002. É da combinação dos dois que nasceu o IDH Ambiental.

Esse novo índice contempla os indicadores do IDH - renda (PIB per capita), saúde (expectativa de vida ao nascer) e educação (que inclui taxa de alfabetização de adultos e matrículas no ensino fundamental, médio e superior) - e as 76 variáveis ambientais do ISA. Entre elas, qualidade do ar, biodiversidade, redução da poluição da água e diminuição do desperdício e do consumo.

Os dois índices que compõem o IDH Ambiental têm características distintas. Enquanto no IDH é impossível se deparar com extremos (do tipo um país rico e com baixa expectativa de vida), no ISA tudo pode acontecer. É comum encontrar situações díspares, como um país com grandes áreas preservadas e, ainda assim, desrespeitoso do ponto de vista ambiental.

Seus ativos estão preservados apenas porque seu crescimento econômico é pífio.
(Liana Melo

Potência emergente, China está no 129o lugar no indicador ambiental
América Latina e alguns países africanos superam as nações mais ricas

Liana Melo

A China de Mao Tsé-Tung virou uma espécie de ícone entre os países emergentes.

Sua capacidade de crescer a taxa de dois dígitos (em 2006, o país registrou crescimento de 10,7%), no entanto, faz com que esse gigante asiático ocupe uma posição pouco recomendável no IDH Ambiental.

Seu modelo de crescimento é uma ameaça ao planeta e uma variável importante para acirrar ainda mais o aquecimento global. O país tirou nota baixa em praticamente todos os itens, de poluição do ar a pressão demográfica passando por projetos de ecoeficiência.

A China está entre os dez piores resultados no ranking do Índice de Sustentabilidade Ambiental (ISA), ocupando o 129o. lugar. A péssima avaliação do ponto de vista ambiental levou o país a cair da 71ª posição no IDH tradicional para o 76o lugar, no IDH Ambiental. A Coréia do Sul segue o mesmo exemplo. Ela pulou da 25ª posição no IDH para o 118o lugar no ISA. Depois da ponderação desses dois índices, a Coréia ficou em 30o lugar no IDH Ambiental.

Uruguai tem notas altas em redução da poluição
Argentina, Uruguai e Peru, por exemplo, foram alguns dos países latino-americanos que receberam notas melhores quando analisados com base na variável ambiental. Eles superaram os países de renda per capita elevada, como Japão, Alemanha, Holanda e Bélgica. O Uruguai, que é considerado uma nação de IDH mediano, conseguiu furar o bloqueio das nações ricas e passar a ocupar um lugar de destaque entre os mais bem colocados no IDH Ambiental.

O país tirou boas notas em redução da poluição ambiental e participação ativa em protocolos internacionais.

Ainda no eixo Sul-Sul, outro país que surpreendeu foi o Gabão. Ele saltou da 94ª posição no IDH para o 12o lugar no ISA. No IDH Ambiental, ele ficou na 84ª posição .

A explicação encontrada pelos técnicos do BNDES Márcio Macedo e Ana Raquel é a de que os países desenvolvidos são grandes consumidores de energia e materiais, o que exerce uma forte pressão ambiental.

- Em que medida os latino-americanos seguirão políticas de sustentabilidade em sua trajetória de desenvolvimento que permitam evitar parte dos reveses associados ao maior fluxo de energia e materiais? - pergunta Macedo, preferindo não arriscar palpites.

Nórdicos: destaque em ambiente e qualidade de vida
Os países com as melhores classificações no IDH foram coincidentemente os que conseguiram também ficar no grupo dos 25 maiores do ISA. As exceções ficaram por causa de Coréia do Sul e República Tcheca, que estavam entre os 28 maiores IDHs e acabaram subindo, para ficar lado a lado com os 25 maiores do IDH Ambiental.

Os países nórdicos, além de Suíça, Canadá, Nova Zelândia e Austrália, conseguiram manter a posição de destaque no IDH Ambiental. Além do mérito reconhecido na qualidade de vida medida pelo IDH, esses países também são referência quando o assunto é redução do impacto ambiental.

O Globo,26/03/2007, Economia, p. 33-34

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