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Nada de agrotoxicos

CB, Brasil, p.16
18 de Set de 2004

Nada de agrotóxicos
Há no Brasil mais de 800 mil hectares plantados com alimentos orgânicos. Apesar de custearem mais, tais produtos conquistam o consumidor. Estima-se que, em Brasília, esse mercado cresça 30 % ao ano
Hércules Barros
Da equipe do Correio
A consciência do bem-estar e da preservação ambiental fez crescer a procura por alimentos orgânicos, produzidos sem agrotóxicos no Brasil. Sem números oficiais sobre o consumo de tais produtos, o governo federal tem por base levantamento da Federação Internacional dos Movimentos de Agricultura Orgânica (Lfoam). Os dados da Ifoam revelam mais de 800 mil hectares plantados com alimentos orgânicos. No mundo, o Brasil está em 50 lugar em área de produção. A preocupação com a saúde tem sido o principal fator da mudança de hábito alimentar do consumidor brasileiro.
Foi em busca de viver bem e mais que, há dois anos, a educadora aposentada Namir Jacobson, 54 anos, radicalizou o cardápio. Hoje, ela só consome esse tipo de comida. "Há oito anos soube que tinha um problema sério de saúde. Comecei a dieta com orgânicos devagar, em 1999. A minha recuperação atualmente é tão boa que os médicos me dispensam de controle mais rígido da doença. Sofro menos", ressalta. Jacobson passou por uma cirurgia no crânio há 35 dias.
A preocupação de Namir com a saúde é a mesma de outros consumidores de orgânicos Brasil afora, segundo o diretor comercial de frutas, legumes e verduras do grupo Pão de Açúcar, Leonardo Miyao. Mesmo pagando mais, os que cultivam qualidade de vida e alimentação saudável estão em todas as camadas sociais. Miyao constata essa realidade na comercialização de alimentos da própria rede de supermercados. "Lojas na periferia de São Paulo estão pedindo para abrir setor de orgânicos, mas não tenho como garantir abastecimento", lamenta.
Segundo Miyao, o consumo de orgânicos em São Paulo vem crescendo 10% ao ano e poderia chegar ao dobro se houvesse mais oferta. Para ele, o pequeno produtor tem dificuldade de conseguir manter os pedidos. Para Tereza Cristina de Oliveira Saminêz, assessora do Programa de Desenvolvimento da Agricultura Orgânica do Ministério da Agricultura, é isso que torna o produto mais caro. Miyao ameniza e diz que a situação já foi pior. "Hoje os preços são em média 20% mais caros. Há dois anos, as folhagens chegavam a um valor 100% maior que as convencionais".
Fronteira agrícola
A dificuldade não está só no preço. O acesso aos alimentos orgânicos é um problema de fronteira agrícola. A cirurgiã-dentista, Georgina Ferreira Ramos mora no município de Santa Terezinha (MT) e diz que lá é impossível comprar esse tipo de produto. "O que é vendido na minha cidade vem de Anápolis (GO) e é só convencional". Ela está em Brasília a passeio e foi à feira de alimentos orgânicos na entre quadra 315/316 Norte na última quinta-feira, a pedido da tia que a hospeda.
A feira, em frente à Igreja Messiânica Mundial do Brasil, é um dos vários pontos de venda de alimentos orgânicos em Brasília. Os produtores se espalham por outros locais de comercialização de hortifrutigranjeiros. Os preços variam conforme o local, as formas de produção e a qualidade do produto. Geralmente, os alimentos orgânicos custam mais nos supermercados.
O Extra trabalha há quatro anos com espaço exclusivo para orgânicos, e o controle de qualidade dos produtos é feito pela própria rede, com visitas à propriedade do fornecedor. 0 diretor do Extra do Setor de Indústria e Abastecimento (SIA) de Brasília, Ricardo Denaldi, atribui a diferença de preço à complexidade do processo que envolve o orgânico: Segundo Denaldi, o consumo de orgânico em Brasília cresce em torno de 30% ao ano.
Os Centros Estaduais de Abastecimento S/A (Ceasa), acabam concentrando boa parte dos pequenos produtores de orgânicos. No Ceasa de Brasília, aos sábados, tem a feira da Associação dos Participantes do Mercado de Produtos Orgânicos de Brasília. Ela concentra hoje 25 produtores que tiveram assessoramento da Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Distrito Federal (Emater). "A procura por alimentos orgânicos tem crescido tanto que há perspectiva de mais 55 produtores se associarem a esse mercado na Ceasa até o fim de 2005", revela Roberto Guimarães Carneiro, coordenador do programa de agricultura do Emater.
Na feira convencional do Ceasa existem também outros três agricultores independentes com banca, vendendo suas produções separados da associação. Milton de Oliveira da Silva é um deles. Ele vende hortaliças desde 1983, e a partir de 1999 resolveu investir em produtos sem agrotóxicos. "Decidi mudar para os orgânicos por causa da procura dos clientes por esse tipo de produto. Como já trabalho no galpão central, decidi não sair daqui".

Controle ainda é irregular
A garantia de controle de qualidade dos alimentos orgânicos não tem respaldo oficial. As certificadoras que hoje emitem o selo de qualidade controlada ainda dependem de regulamentação por parte do governo federal. 0 Ministério da Agricultura presume que existam 26 delas, entre nacionais e internacionais, atuando no Brasil. "Todo o sistema produtivo, do plantio à venda, ainda não é regulamentado por lei", afirma Tereza Saminêz, do Programa de Desenvolvimento da Agricultura Orgânica do Ministério da Agricultura.
Segundo Saminêz, a regulamentação da Lei no 10.831 inclui o sistema oficial de certificação dos orgânicos, e entra
em consulta pública até fevereiro de 2005. "No final do primeiro semestre, o sistema deve ser instalado, mas nem toda propriedade orgânica vai precisar de certificado", adianta. Ela conta que o credenciamento é facultativo aos pequenos produtores e às associações com comercialização direta ao consumidor.
Confiança
Para decidir sobre a certificação opcional, o Ministério da Agricultura levou em conta a relação de confiança entre o pequeno agricultor e o consumidor de varejo. "A certificação, por ter um custo significativo, não pode ser um impedimento ao pequeno produtor. Se ele tem certificado hoje, é por opção. Nesse setor, produtor e consumidor são exigentes", diz.
Saminêz ressalta que, havendo distância entre o produtor e o consumidor, a certificação é obrigatória. É o caso dos supermercados. "0 consumidor, quando não conhece o fornecedor, precisa de selo das certificadoras". A medida do ministério pode contribuir para aumentar ainda mais a diferença de preços entre supermercados e feiras. Mesmo assim, donos de supermercados e feirantes são a favor da certificação. Por outro lado, a não obrigatoriedade dos certificados aproxima o preço do orgânico do valor do alimento convencional. (HB)

Química difícil de sair
Os convencionais
Frutas, verduras e legumes O Lavar verduras e deixá-las de molho em vinagre ou retirar a casca dos vegetais não elimina resíduos dos agrotóxicos sistêmicos, que se instalam no interior do vegetal.
Carne, leite e laticínios
O Os animais e derivados tratados com dieta baseada em forragens de pastos sob uso de agrotóxicos, com hormônios sintéticos e rações com proteína animal, farinha de ossos e de sangue, não estão livres de possíveis distúrbios fisiológicos e de comportamento.
Açúcar
O processamento do açúcar convencional usa enxofre, em produtos à base de sulfato, para branquear o açúcar.
Frango e ovos
O uso de anabolizantes, antibióticos e rações industrializadas deixam resíduos e interferem no sabor.
Café e grãos
O A monocultura leva ao desequilíbrio ecológico, à erosão e ao aumento no ataque de pragas e doenças.
Os orgânicos
Apresentam sabor mais forte que os vegetais convencionais.
Costumam ter tamanho menor porque não contêm aditivo
Demoram mais para cozinhar por ter mais nutrientes.

CB, 18/09/2009, 16

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