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Mulheres se engajam na luta

A Crítica -Manaus-AM
Autor: Ana Célia Ossame
17 de Set de 2001

Pela primeira vez, uma mulher assume a liderança da Associação das Comunidades Indígenas do Médio Rio Negro

Entre os seus objetivos, Délia quer aprender a fazer projetos para gerar renda ao povo indígena Durante séculos, elas se contentaram em viver à sombra dos caciques, pajés e demais lideranças masculinas nas aldeias indígenas da Amazônia. Mas é da região do Médio Rio Negro, que vem a reação. Pela primeira vez, uma mulher, Délia Veloso Fonseca, 41, assume a liderança de uma entidade indígena, a Associação das Comunidades Indígenas do Médio Rio Negro (ACIMRN). Formada em agronomia e preocupada com o presente e o futuro dos parentes, participou em Manaus, de um seminário para aprender a elaborar projetos voltados para o etnodesenvolvimento, organizado pela Fundação Estadual de Política Indigenista do Amazonas (Fepi). Depois de eleita, Délia não fica na aldeia, esperando cair chuva do céu para plantar a bases de uma liderança cada vez mais fortalecida entre as 30 comunidades daquela região. Para ela, a vitória contra o tradicional preconceito de alguns parentes (forma de tratamento usada entre os índios), é o sinal de que tem carta branca para inovar. Há muitos desafios, inclusive na própria aldeia, mas ela está decidida a dobrar a ignorância, o desconhecimento e a pobreza a que estão submetidos os povos daquela região. A eleição foi assegurada por conta do pai de Délia, José Fonseca, que foi uma liderança muito forte nas comunidades. Os parentes votaram em mim, para que eu trabalhe como meu pai trabalhou pela melhoria da nossa vida, disse ela, que se formou em agronomia no Sul do País, onde estudou no período em que estava fora do Amazonas. A entidade dirigida por ela reúne 30 comunidades de índios e ribeirinhos que enfrentam dias ruins por causa da pobreza e doenças. A Fundação Nacional de Saúde (Funasa) faz visitas anuais ali, porque o acesso é só por meio de barco. E a última vez que a Fundação Nacional do Índio (Funai) foi lá faz três anos. Entre essas comunidades, existe uma que vive isolada das demais etnias indígenas, a nateb. Eles são puros e não deixam nenhum estranho entrar no local onde vivem, por isso somos nós, lideranças, que podemos e devemos entrar para levar medicamentos, acrescentou. Desde que assumiu, aprender é a palavra-chave na vida de Délia. Quero aprender a fazer projetos para gerar renda ao nosso povo, afirmou ela, acreditando que com a exploração do potencial das comunidades, é possível vencer. Para chegar nessas comunidades, que podem produzir artesanato, farinha e castanha, por exemplo, a presidente da ACIMRN não se intimida com as distâncias, vencidas em voadeiras ou canoas. Não tem sol nem chuva. Vou embora, às vezes tendo que ir num dia para chegar no outro, conta ela. Da comunidade do roçado, onde mora, até a do povo nateb, por exemplo, são dois dias de viagem só de ida, numa voadeira com motor de 40HP. Fazia muito tempo que não ia ninguém visitar aquela aldeia e eu já fui este ano, orgulha-se. De lá, dois antropólogos norte-americanos foram barrados. Os dois chegaram lá se propondo a estudar a tribo, mas o cacique não autorizou a entrada deles, disse Délia. Nas comunidades onde existem escolas, estas só têm aula até a 4ª série do ensino fundamental, situação que preocupa Délia. Segundo ela, a ampliação da escola é uma das metas da diretoria. Depois do seminário, Délia está otimista. Foi importante porque aprendi muita coisa, disse ela, que vai levar a experiência adquirida e o desejo redobrado de fazer o melhor para alterar a realidade dos índios do Médio Rio Negro.

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