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MPF/AM: decisão judicial garante salário-maternidade às mães da etnia kanamari menores de 16 anos

MPF/AM - http://noticias.pgr.mpf.gov.br/
10 de Dez de 2012

Liminar em ação civil pública determina também que INSS revise os requerimentos feitos nos últimos cinco anos para conceder o benefício às índias que tiveram o pedido negado

A Justiça Federal atendeu ao pedido do Ministério Público Federal no Amazonas (MPF/AM) e determinou, em caráter liminar, que o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) deixe de exigir idade mínima de 16 anos para concessão do benefício previdenciário salário-maternidade às mulheres indígenas kanamari.

O pedido foi feito em ação civil pública ajuizada pelo MPF/AM no mês de novembro deste ano e tem por base a característica diferenciada do povo kanamari em relação à maternidade, apontada em laudo antropológico elaborado pelo analista pericial da Procuradoria da República no Amazonas (PR/AM). Conforme o parecer que fundamentou a ação, as características culturais e sociais da etnia levam as indígenas menores de 16 anos a trabalhar em regime de economia familiar e a ter filhos.

O procurador da República Julio José Araujo Junior, autor da ação, destaca que os costumes do povo indígena kanamari incluem um modo de produção coletivo e padrões culturais diferenciados, em que as concepções de família, maternidade, casamento e papéis sociais são totalmente distintas daqueles da sociedade não indígena. "Por essa razão, o entendimento do INSS se mostra incompatível com a Constituição da República e com convenções internacionais firmadas pelo Brasil, além de contrário à legislação infraconstitucional correspondente, pois está dissociado da visão multicultural prevista na lei fundamental, por meio da qual o direito à igualdade não pode ser visto apenas como fonte formal ou material de equiparação de indivíduos, mas também como diretriz para o reconhecimento da diferença", afirmou o procurador.

De acordo com o mais recente censo feito pela Fundação Nacional de Saúde (Funasa), datado de 2010, pouco mais de 3,1 mil índios kanamaris vivem no Amazonas, a maior parte deles na região do rio Juruá e seus afluentes. Conforme informações do programa Povos Indígenas no Brasil, também habitam regiões mais distantes, como no médio rio Javari e rio Japurá.

A decisão liminar destaca que o pedido foi precedido de representação do pesquisador Stefan Dienst, o qual esteve nas aldeias kanamaris a serviço do Ministério da Ciência e Tecnologia para desvendar a linguagem e cultura daquele povo e pôde constatar essas peculiaridades socioculturais.

A juíza federal Jaiza Fraxe destaca ainda que o tratamento diferenciado aos povos indígenas kanamaris se justifica em razão do fato de que as mulheres "nasceram e cresceram, há centenas e centenas de anos, com a única realidade que conheceram pela tradição de seus antepassados: trabalho na roça da aldeia, em combinação com vida sexual precoce e reprodução antes dos 16 anos". A decisão ressalta que situação similar foi constatada em relação às indígenas kaigang, no Rio Grande do Sul.

A Justiça Federal determinou também que o INSS revise todos os requerimentos de concessão de salário-maternidade das mulheres kanamaris apresentados nos últimos cinco anos e conceda o benefício a todas que tiveram o pedido negado por não terem a idade mínima exigida pelo instituto. Em caso de descumprimento da decisão liminar, há a previsão de multa diária de R$ 1 mil.

Danos morais coletivos - A ação civil pública segue tramitando na 1ª Vara Federal sob o no 18137-48.2012.4.01.3200. Ao final do processo, a Justiça Federal deverá analisar pedido do MPF/AM sobre o pagamento de indenização por danos morais coletivos ao povo indígena kanamari no valor de R$ 100 mil, por parte do INSS.

De acordo com a Convenção no 169, é responsabilidade dos governos proteger os direitos dos povos indígenas e garantir o respeito pela sua integridade, por meio de medidas "que promovam a plena efetividade dos direitos sociais, econômicos e culturais desses povos, respeitando a sua identidade social e cultural, os seus costumes e tradições, e as suas instituições".

Para o MPF, garantir às indígenas kanamaris o direito ao benefício mesmo não tendo a idade mínima exigida pelo INSS é uma dessas medidas citadas pela OIT e a negação desse direito pelo órgão previdenciário, ao ignorar as singularidades socioculturais do povo kanamari, é ilegal e desrespeita a Constituição Federal, causando danos morais a toda a comunidade. "A ideia de dano moral coletivo não exige que haja perturbação física ou psíquica de algum integrante do grupo, e sim que haja uma ofensa a um interesse difuso, coletivo ou individual homogêneo coletivamente considerado, a um sentimento geral daquele grupo de pessoas", explicou o procurador da República Julio Araujo, autor da ação civil pública.

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