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Mortalidade de animais preocupa índios

A Crítica-Manaus-AM
Autor: Orlando Farias
26 de Fev de 2002

Todos os motoristas que adentram a reserva uaimiri-atroari - ao Norte do Amazonas -, percorrendo a BR-174 (Manaus-Boa Vista), são orientados por um singelo aviso ocupando imensa placa: "Vá Devagar. Admire a paisagem. Torne-se um defensor da natureza e da causa indígena". O recado, em bom português, visa deter a escalada de mortes de animais silvestres ao longo dos 136 quilômetros da rodovia que cortam a reserva.

A mensagem, porém, parece não estar sensibilizando a todos. A prova está nos números. No ano de 2000 foram contabilizados pelo Programa Uaimiri-Atroari (PWA) - ONG de brancos e índios que administra a reserva - o total de 326 animais atropelados e mortos pelos carros.

No ano seguinte, a mortalidade foi ainda maior: 346 animais mortos. A luz vermelha do alarme acendeu completamente no mês de janeiro último, quando os óbitos de animais por atropelamento cresceram 50% em relação ao mesmo mês do ano anterior.

"É um fato preocupante porque o fluxo de carros vem aumentando consideravelmente na BR-174", atesta o idealizador do PWA e até hoje o seu principal condutor, o indigenista José Porfírio de Carvalho, 61. Apesar de a reserva contar com uma espécie de "guarda florestal" que mantém vigilância permanente em toda extensão do trecho dentro da reserva, boa parte dos motoristas não respeita as recomendações e trafega em alta velocidade.

Pior: sabe-se de acidentes provocados intencionalmente pelos próprios motoristas no momento em que os animais cruzam as pistas. "Temos informações de que muitos motoristas carregam os animais que atropelam propositalmente", revela o coordenador do Programa, o agrônomo Marcílio Cavalcante, 34. "O número de animais mortos na reserva, portanto, é muito maior do que o registrado em nossas estatísticas", diz. Os dados, aliás, pondera o coordenador, referem-se apenas aos animais encontrados mortos na pista da rodovia.

Pela gravidade que os índios conferem ao problema, as mortes de animais passaram a ser documentadas diariamente, incluindo registro fotográfico. O motivo é simples: até hoje o trecho rodoviário da reserva é aberto integralmente aos veículos apenas durante o período do dia, entre 6h e 18h. Pelo raciocínio dos índios, se a estrada for aberta 24 horas, como querem políticos do Estado de Roraima, a "matança será gigantesca e desenfreada", afirma o gerente do Programa Uaimiri-Atroari, Antônio Carlos Andrade do Nascimento, 36.

O gerente fala com base em dados reais do tráfego existente no período noturno, já que se abriu a exceção para caminhões que transportem gêneros alimentícios perecíveis e os ônibus de passageiros. Segundo Antônio Carlos, trata-se de um volume pequeno de veículos. Proporcionalmente, contudo, o número de acidentes dispara.

Duas razões que concorrem para isso são a falta de visibilidade (não há eletrificação na área) e a precária sinalização. "Pela manhã temos que recolher muitos animais mortos da estrada", conta Antônio Carlos Nascimento, que coordena pessoalmente o trabalho de pesquisa em relação aos animais mortos na estrada. "Dá pena ver tantos animais essenciais para a floresta estarem sendo sacrificados", admite com desolação.

A área escolhida pelos guerreiros uaimiris-atroaris como morada sempre foi considerada endêmica e fértil de caça. "Mas se continuar do jeito que vai, não vai demorar para que o nosso povo fique sem alimentos", diz o uaimiri Jeremias Mapyny, 23, que como um dos caçadores da tribo tem sentido a progressiva diminuição da população de animais na reserva.

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