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Moratória já!

JB, Caderno B
Autor: UTZERI, Fritz
25 de Mai de 2005

Moratória já!

Fritz Utzeri

Calma, leitores, não estou falando da política econômica (embora continue achando isso uma boa idéia), refiro-me à Amazônia. O Brasil precisa tomar decisões enérgicas e inadiáveis, sob pena de algum dia, e por motivo justificado, perder a soberania sobre o imenso espaço amazônico. Não é possível mais destruir um patrimônio único no mundo de biodiversidade e riqueza, indispensável para a vida do planeta, em nome de uma soberania irresponsável, que devasta uma Bélgica por ano. Nesse ritmo, até meados do século a Amazônia será um semi-árido e o mundo, um lugar pior para viver. A humanidade e em primeiro lugar nós, os brasileiros, temos a responsabilidade de não deixar que isso continue acontecendo.
O que fazer? A ação exige governo com pulso firme e determinação, e não o arremedo caricato de palhaços (Arrelia, que foi ao céu, me perdoe, você não merece a comparação) que se revezam em Brasília. Em primeiro lugar, será preciso deixar bem claro que, a partir de agora e por um período de 10 anos, o Brasil declara guerra à devastação. Não se derruba mais na Amazônia e quem fiscalizará isso serão as Forças Armadas, às quais o Ibama será provisoriamente incorporado.
Convoque-se urgente uma reunião internacional, no âmbito da ONU, e exija-se que os países desenvolvidos (os maiores consumidores de nossas madeiras) estabeleçam um banimento internacional de madeiras nobres. Ninguém poderá comprar mogno, jacarandá, virola ou qualquer outra madeira de lei. Se quiserem móveis ou pisos como da grande biblioteca de Paris (todo feito de mogno), que usem madeiras locais, pinus ou material sintético. O comércio dessas madeiras nobres deverá ser proibido e seu tráfico condenado e combatido como o da droga. O mal que a destruição da Floresta Amazônica causará à humanidade fará o problema das drogas parecer brincadeira de jardim-de-infância.
A repressão ao corte e contrabando de madeiras, pelas suas características, deve ser muito mais fácil que a repressão às drogas, já que não há comparação de volume/dinheiro entre o contrabando de maconha ou cocaína e o de cedro ou mogno (experimente passar madeira em /mulas/ ou pranchas de surfe ou até em fundos de caminhões, por exemplo, ou transportá-la em aviões). Estabelecida essa moratória e essa proibição (por um período inicial de 10 anos), os países desenvolvidos abrirão um fundo para financiar a compra de material para equipar as unidades militares que farão a fiscalização-repressão e a manutenção da integridade florestal. Unidades militares serão espalhadas pela selva, equipadas com helicópteros, lanchas rápidas (nos rios), pesadamente armadas com força letal e equipamento de monitoramento por satélite. Com base nas informações desses satélites sobre a Amazônia, se deslocarão imediatamente para a região do desmatamento e agirão com rigor.
Para isso duas medidas serão necessárias. A decretação de todas as áreas atuais de floresta como territórios federais e zonas de preservação, portanto, dissociados dos estados em que estão contidos. Nesses territórios vigorará uma lei ambiental específica e duríssima, para combater os devastadores. Quem for pego devastando, além de cadeia dura, deverá ter os seus bens confiscados. A devastação da floresta será considerada crime hediondo contra a humanidade.
A soja e o gado são pragas na Amazônia! Em nome dos ganhos do agrobusiness estamos queimando, liquidando, assassinando um patrimônio biogenético milhões de vezes mais valioso que qualquer plantação de soja ou serraria e privando nossos filhos e netos das possibilidades de usufruir dos benefícios que o aproveitamento racional da floresta trará à humanidade.
Expulsem-se todas as madeireiras da Amazônia, a começar pelas estrangeiras, que já devastaram as florestas tropicais da Ásia. O corte da madeira que for absolutamente necessário e estritamente para uso local deverá ser rigorosamente controlado, supervisionado e feito de modo extrativista, e não mais destruindo 12 árvores a cada castanheira que tomba. Além disso, deveremos incentivar as políticas extrativistas e a pesquisa do patrimônio genético da flora e da fauna amazônicas na busca de princípios ativos de medicamentos, por exemplo.
Esses deveriam ser assuntos em exame no Parlamento e no Executivo de um país sério e determinado, e não a canalhice rastaqüera de um Severino, pedindo ''a diretoria que fura poço'' na Petrobras para um cupincha, ou a repetição de metáforas e platitudes idiotas por um despreparado deslumbrado e incompetente. Somos mesmo um triste país e, como não vamos fazer nada, dentro de alguns anos, com o avanço da devastação, é possível que outros o façam por nós. Perderemos a Amazônia manu militari e, se eu estiver vivo, podem ter certeza de que acharei muito bem-feito. Quem não toma conta nem defende o que é seu está condenado a perdê-lo.

JB, 25/05/2005, Caderno B

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