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Militares simulam ajuda, mas não têm recursos para ações na prática

FSP, Poder, p. A11
13 de Nov de 2017

Militares simulam ajuda, mas não têm recursos para ações na prática

LUCAS VETTORAZZO
ENVIADO ESPECIAL A TABATINGA (AM)

O Amazonlog 2017, exercício de ajuda humanitária na Amazônia liderado pelo Exército brasileiro em parceria com militares da Colômbia, Peru e Estados Unidos terminou neste domingo (12) com a promessa de definir protocolos de ação das Forças Armadas em situações de desastres naturais na região amazônica.
Após uma semana de ações sociais e simulações de desastres a partir de uma base militar montada em Tabatinga (AM), cidade a 1.100 quilômetros de Manaus e que fica na tríplice fronteira entre Brasil, Colômbia e Peru, ficou claro que a despeito do aprendizado, cooperação e troca de informações entre nações, a atuação nos moldes treinados não guarda relação com a realidade de tropas e recursos na região amazônica.
Em uma simulação de um acidente em uma balsa no rio Solimões, por exemplo, ocorrida no sábado (11), foram empregadas três lanchas, dois helicópteros, dois navios da Marinha, um dos quais um hospital flutuante, além de equipes do Ibama e viaturas do corpo de bombeiros local e defesa civil. Em questão de minutos, o fogo estava controlado e as vítimas evacuadas.
Na vida real, contudo, em um acidente das mesmas proporções muitas vezes leva horas para a chegada do socorro. O Exército atua na Amazônia em ações humanitárias, mas os recursos destacados para as operações da última semana superam em muito os disponíveis na região.
O Exército não divulga a extensão de seus recursos na Amazônia, mas segundo o comandante logístico da força e o oficial número dois no Amazonlog, general Antônio Manoel de Barros, os meios empregados superam os disponíveis no momento.
De acordo com ele, o objetivo era desenvolver protocolos de ação em momentos de crise. Os veículos e equipamentos levados a Tabatinga voltarão para suas bases de origem.
"É evidente que foi um exercício. Sabemos que em um acidente da magnitude como o que foi simulado com a balsa, todos aqueles recursos não estariam ali", disse. "Nesse caso, o planejamento foi mais importante que a execução".
Em uma outra situação, foi simulada operação de evacuação e recebimento de vítimas da seca na região da tríplice fronteira. Como muitas cidade da área só são acessadas por barco, a seca impede a navegação nos rios deixando cidades e povoados inteiros inacessíveis. O ano de 2016 registrou uma das piores secas na região.
O Exército montou em uma escola em Tabatinga estrutura para receber, cadastrar, dar atendimento médico e catalogar os evacuados, numa ação coordenada com militares, médicos e Polícia Federal. A ação simulada foi elogiada pelos observadores internacionais, já que além de cadastrar, identifica informações sensíveis no momento da chegada, como pedidos de refúgio, doenças ou tentativas de atravessar a fronteira com drogas.
"Se tivéssemos cadastrado e identificado todos os refugiados que entraram na Alemanha no ano passado, certamente estaríamos melhores preparados para ajudar essa população", disse o tenente coronel do exército alemão, Peter Becker. Ele lembrou que no auge da crise de refugiados para a Europa, a Alemanha chegou a registrar a passagem de 10 mil pessoas em uma hora pela fronteira, todos sem registro.
Apesar disso, tais ações só podem ser colocadas em prática no Brasil por meio de ordem do Executivo, algo que não ocorre, por exemplo, com os refugiados venezuelanos que atravessam a fronteira em Roraima. Segundo a OAB de Manaus, há na capital amazônica cerca de 700 famílias que desembarcaram em Boa Vista (RO) que estão em situação irregular na cidade.
"Seria interessante que essa estrutura de ajuda humanitária pudesse ser usada para crises já em curso no país, mas isso depende de vontade política", disse a presidente da comissão de relações exteriores da OAB em Manaus, Denise Couto, que participou como observadora dos exercícios do Amazonlog.
Segundo o general Barros, após o Amazonlog, o Exército estaria capacitado para atuar de imediato. "Estamos prontos, basta nos chamarem", disse.
Além das simulações, o Exército enviou médicos e remédios para índios isolados na selva. O repórter fotográfico da Folha Danilo Verpa pôde acompanhar uma das ações em uma aldeia indígena na fronteira com o Peru. Quando chegou ao local, ouviu de locais que há dois anos médicos não visitam a região.
O jornalista LUCAS VETORAZZO viajou a convite do Exército

Polêmica presença dos EUA em exercício está superada, diz general

LUCAS VETTORAZZO
ENVIADO ESPECIAL A TABATINGA (AM)

Quando foi anunciada a presença de tropas americanas em exercício militar na Amazônia, políticos de esquerda reagiram, alegando "o risco à soberania nacional".
Após uma semana de exercícios de ajuda humanitária a partir de uma base montada em Tabatinga (AM), a conclusão do Exército brasileiro, que coordenou as atividades junto com Colômbia, Peru e Estados Unidos, é que a polêmica está superada.
O nome da ação- Exercício Logístico Internacional Multiagências- causou dúvida quanto às operações em curso, levando parlamentares a crer que segredos estratégicos operacionais da Amazônia seriam revelados aos estrangeiros.
"Eu sou um soldado que defendo meu país e a Constituição. Nunca nos venderia para os americanos, como nos acusaram. O Amazonlog não tinha qualquer objetivo relacionado à defesa. Para nós, está superado", disse o general Antônio Manoel de Barros, chefe do Estado-Maior Combinado do exercício e o número dois de toda a operação.
O ministro da Defesa, Raul Jungman, esteve na base e rechaçou também as acusações, ao lembrar que além dos americanos, participaram países como Venezuela, Rússia, China e Israel.
Os americanos, porém, tinham assento nos briefings diários do Estado-Maior Combinado, que reunia representantes da Colômbia, Peru, Brasil e EUA e definia as estratégias das operações.
Dos 1.940 militares envolvidos nas ações, 55 eram dos EUA, 145 da Colômbia e 89, do Peru. O Brasil empregou 1.651 homens. Os americanos auxiliaram com um avião de carga e transporte de passageiros, além de terem enviado observadores. Nenhuma tropa foi usada nas operações no campo.
Os exercícios foram baseados em simulações de desastres e resposta humanitária. Das dez ações com tropas e meios de transporte, cinco foram na área de cidade, como a explosão de uma balsa no porto de Tabatinga e o lançamento de cargas aéreas no aeroporto. Os estrangeiros não foram enviados, por exemplo, para duas ações de ajuda médica em indígenas isoladas na selva.
O único momento em que foram apresentadas técnicas de combate foi na visita ao batalhão de selva do Exército, considerado o de maior expertise em ações no terreno amazônico. A visita, de cerca de uma hora, consistiu nas apresentações de como montar acampamentos e na identificação de alimentos típicos encontrados na selva brasileira. O curso brasileiro foi no século passado no país após tropas aprenderem técnicas de combate no Panamá, com a supervisão de tropas americanas.
Representantes americanos não concederam entrevista à Folha. Informalmente, porém, militares contaram à reportagem que os trabalhos ficaram circunscritos às questões humanitárias. A maioria nunca tinha pisado em território amazônico e deixaram o local com apenas impressões visuais de como seria o combate no terreno. Um militar do Texas, que pediu para não ter a patente nem o nome revelado, garantiu que nenhuma estratégia de defesa da Amazônia foi discutida ou ensinada.
Oficiais do Exército brasileiro lembraram que o curso de operações na selva é também ministrado para outras nações ao longo do ano, mas com duração reduzida em relação curso ministrado aos brasileiros.
"Não tivemos qualquer instrução sobre combate na selva ou pontos estratégicos da geografia local. O que posso dizer é que um combate no meio nesse ambiente seria muito duro por não haver pontos de cobertura. Mas digo isso como impressão pessoal", disse o tenente coronel da Nigéria Ebowwe Odede.
O deputado Glauber Braga (PSOL-RJ) acompanhou os trabalhos no Amazonlog por três dias e disse que é cedo para descartar preocupações com relação à presença americana na selva amazônica. Ele pediu que em outras oportunidades de exercícios de ajuda humanitária, que sejam protagonistas os países da América do Sul, circunscritos às alianças da Unasul e Mercosul.
"A presença das Forças Armadas Americanas, do governo americano, é uma preocupação a partir de uma reflexão histórica, que merece atenção, cuidado e preocupação", disse ele.
O jornalista LUCAS VETORAZZO viajou a convite do Exército

FSP, 13/11/2017, Poder, p. A11

http://www1.folha.uol.com.br/poder/2017/11/1934922-exercito-faz-exercic…

http://www1.folha.uol.com.br/poder/2017/11/1934925-polemica-presenca-do…

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