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Metas contra aquecimento têm viés comercial

O Globo, Economia, p. 30
30 de Ago de 2009

Metas contra aquecimento têm viés comercial
Governo adotará compromisso de reduzir emissões de gases poluentes para evitar barreiras a produtos brasileiros

Eliane Oliveira e Catarina Alencastro

O risco iminente de os países desenvolvidos adotarem barreiras a produtos brasileiros como o etanol - menina dos olhos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e uma das bandeiras levantadas pelo Brasil junto à comunidade internacional - levou o governo a mudar de postura em relação ao aquecimento global. O país decidiu apresentar na cúpula mundial sobre o clima, em Copenhague, na Dinamarca, em dezembro, uma meta de redução das emissões de gases que provocam o efeito estufa até 2020. Com isso, o Brasil acabou se afastando de nações em desenvolvimento de peso, como China e Índia.

Embora ainda não tenha em mãos os números que serão apresentados em Copenhague, o governo trabalha em ações a serem divulgadas e quanto cada uma delas resultará em emissões a menos. Uma hipótese que está sendo considerada é mudar a meta de desmatamento prevista no Plano Clima, de diminuir em 70% o desmatamento até 2017, e propor uma meta de 80% até 2020.

A reviravolta foi motivada não apenas por pressões da comunidade científica e de negociadores internacionais, mas pelo reconhecimento do setor produtivo de que as exportações do país poderão ser prejudicadas. A conclusão é que a melhor saída consiste na busca de um consenso multilateral, uma vez que não dá para comparar a situação do Brasil - cujo esforço maior é reduzir o desmatamento da Amazônia - com a de China e Índia, países que dependem de combustíveis fósseis para produzir energia e se encontram em pleno processo de industrialização.
Ministérios se dividiram sobre nova estratégia
Segundo ministros e diplomatas envolvidos no tema, a estratégia brasileira, porém, não é pelo distanciamento dos países emergentes. O Brasil deve assumir um "protagonismo do bem", deixando de ser demonizado por causa do desmatamento na Amazônia.

Mas a mudança não se deu facilmente. Havia forte oposição interna de órgãos como a Casa Civil, o Itamaraty e o Ministério de Ciência e Tecnologia, que acabaram vencidos no debate.

Os ministérios da Fazenda e do Meio Ambiente ganharam a briga, que teve, entre os argumentos para convencer a ministra Dilma Rousseff, da Casa Civil, o fato de o próprio Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) ter metas.

- Se o etanol brasileiro não for verde, os países desenvolvidos vão colocar barreiras comerciais travestidas de barreiras ambientais - afirmou o ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc.

O diretor-executivo da Confederação Nacional da Indústria (CNI), José Augusto Fernandes, afirma que o setor produtivo brasileiro defende o princípio da responsabilidade comum, mas diferenciada. Ou seja, os países que assinaram o Protocolo de Kioto, em 1997, mais os EUA devem se comprometer com metas mais ambiciosas do que as nações em desenvolvimento: - Ninguém na indústria propõe que abandonemos essa responsabilidade.

Fernandes admite a possibilidade de serem criadas barreiras ambientais para os países que não aderirem a um acordo internacional, com metas a serem cumpridas até 2020. Segundo ele, há risco de que as discussões sobre o clima sejam contaminadas por questões comerciais.

- O fato de o Brasil se comprometer pela primeira vez com um número significa que estamos assumindo uma posição de vanguarda - disse o embaixador extraordinário para Mudança Climática, Sérgio Serra.

O jurista e diplomata brasileiro Rubens Ricupero, ex-secretáriogeral da Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (Unctad), acha que a virada na posição brasileira foi uma evolução: - O governo brasileiro estava muito isolado. Hoje, não é mais possível desvincular o meio ambiente da economia.

Já o ex-ministro das Relações Exteriores Luiz Felipe Lampreia afirma que o Brasil é tido como o quarto maior poluidor do mundo.

Por essa razão, precisa sair da defensiva, assumindo uma posição mais proativa: - Temos que apresentar um plano com credibilidade e intenções muito firmes.
Brasil quer assumir posição proativa em Copenhague
Segundo fontes envolvidas no tema, o fato de o Brasil assumir uma posição proativa em uma convenção internacional de peso dá estatura moral para que o país possa cobrar em outros patamares suas reivindicações multilaterais. Essa visão é reforçada pelo ex-governador do Acre Jorge Viana, que aposta que Brasil e EUA farão a diferença no evento: - O Brasil terá uma posição avançada em Copenhague. Tenho conversado com o presidente Lula, e Brasil e EUA podem ter um papel diferencial.

O Globo, 30/08/2009, Economia, p. 30

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