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A mata atlântica é aqui

FSP, Tendências/Debates, p. A3
Autor: KLABIN, Roberto
20 de Mai de 2005

A mata atlântica é aqui

Roberto Klabin

Não, a mata atlântica não é na Amazônia. Também não se restringe somente à serra do Mar. Ela está exatamente aqui, onde resta cerca de 7% da sua área original e onde 70% da população vive, trabalha, preserva, desmata e se beneficia de seus serviços e recursos naturais.
Ao comemorar os 18 anos da Fundação SOS Mata Atlântica, promovemos uma intensa reflexão sobre o passado e redefinimos as prioridades para os próximos 18 anos. Uma delas está intimamente ligada à sensibilização e ao engajamento da sociedade a essa importante causa. Resultados de uma pesquisa qualitativa que abordou a percepção do meio ambiente e da entidade por vários públicos revelaram que muita gente ainda não se vê como integrante da mata atlântica. Temos, então, a urgência de reafirmar sua localização e sua importância e envolver mais pessoas para conter as agressões que sofre esse bioma, um dos mais ricos em biodiversidade e mais ameaçados de extinção do planeta.
Quando Pero Vaz de Caminha lançou o olhar inaugural sobre o território brasileiro e se deslumbrou com a floresta onipresente, a mata atlântica cobria 15% do país. Muito do que havia desapareceu com o quase extermínio do pau-brasil, os diversos ciclos econômicos e um veloz processo de industrialização e urbanização. São, ao todo, 3.400 cidades de 17 Estados brasileiros -entre as quais São Paulo, Rio de Janeiro, Florianópolis, Salvador e Recife- instaladas na mata atlântica.
Desde 1989, a SOS Mata Atlântica e o Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) desenvolvem o mapeamento e o monitoramento dos remanescentes florestais, o "Atlas da Mata Atlântica", com patrocínio do banco Bradesco e apoio da Colgate-Palmolive. Foram anos contabilizando perdas, indicando o acentuado ritmo de desmatamento dos Estados, pressionando o poder público, e desde o ano passado é apresentado à sociedade o ranking com os municípios que mais possuem vegetação nativa. Esse trabalho vem contribuindo com o conhecimento e, tendo em vista que ninguém valoriza o que não conhece, oferecemos os mapas dos municípios da mata atlântica na internet, por meio do portal www.sosma.org.br. É nossa forma de colaborar para a atuação dos agentes de controle e fiscalização bem como dos gestores municipais. Saímos da escala nacional para a atuação local.
Ainda hoje, muitos são os benefícios que milhares de habitantes obtém da mata atlântica. Um deles, a água, afeta diretamente cada cidadão. Integrantes dos 300 grupos do Núcleo União Pró-Tietê, um dos projetos da SOS Mata Atlântica, que realiza o monitoramento da qualidade da água do rio Tietê com metodologia própria, já perceberam que a conservação da floresta está intimamente ligada aos recursos hídricos. Sabem também e divulgam que o uso sustentável é primordial e tudo depende de cada um, pois reflete diretamente no seu dia-a-dia e na sua qualidade de vida.
Há várias formas de os cidadãos colaborem para a proteção da natureza. Considerando que grande parte dos remanescentes florestais da mata atlântica está nas mãos de particulares, incentivamos que os proprietários de terras participem dessa rede por meio da criação de uma Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN). Nessa linha, a Aliança para a Conservação da Mata Atlântica, parceria entre a SOS Mata Atlântica e a Conservação Internacional, coordena um programa de incentivo às RPPNs da mata atlântica, que visa apoiar as RPPNs existentes e a criação de novas reservas, com recursos do CEPF (Fundo de Parceria para Ecossistemas Críticos) e do Bradesco Cartões. O Brasil já tem mais de 670 RPPNs reconhecidas, sendo que 450 delas (67%) estão na mata atlântica.
Outra forma de participar é por meio do Clickarvore e do Florestas do Futuro, voltados ao plantio de mudas nativas para a recuperação de áreas desmatadas e a proteção de mananciais. O primeiro já possui mais de 4 milhões de mudas, doadas via internet (www.clickarvore.com.br) com o apoio de empresas conscientes, a exemplo do Bradesco Capitalização, garantindo mais 8 milhões de mudas. E o Florestas do Futuro é mais uma via de entrada dos parceiros do mundo empresarial.
No caminho rumo à maioridade, articulamos e angariamos o envolvimento de diversas instituições, entidades, empresas e universidades. Formamos alianças estratégicas individualmente, fomos catalisadores, participamos ou apoiamos a criação de redes tais como a Rede de ONGs da Mata Atlântica, a União pela Fauna da Mata Atlântica, com a Rede Nacional de Combate ao Tráfico de Animais Silvestres (Renctas), e o Pacto Murici, com mais sete importantes organizações em favor da mata atlântica do Nordeste.
Tudo isso acompanhado da participação e da perseverança essenciais de 100 mil filiados e centenas de voluntários e colaboradores.
O plano da fundação, que nasceu em 1986 da iniciativa de um grupo de cidadãos preocupados com a mata atlântica, está hoje consolidado, mas muito longe de terminar. A primeira campanha da entidade, "Estão tirando o verde da nossa Terra", amplamente veiculada pela mídia, contribuiu para que o termo "mata atlântica" passasse a ser incorporado ao vocabulário coloquial. Mas precisamos, agora, divulgar, ampliar a sensibilização e a percepção do problema entre os povos leigos da floresta, ou seja, nossos vizinhos.
Nossa meta é que cada indivíduo se reconheça como parte do povo da floresta e se comprometa com propostas como o projeto de Lei da Mata Atlântica -que regula o uso e a ocupação do solo, há 12 anos tramitando no Congresso Nacional- para a garantia de um futuro saudável.

Roberto Klabin, 49, advogado e empresário, é presidente da Fundação SOS Mata Atlântica. @ - smata@alternex.com.br

FSP, 20/05/2005, Tendências/Debates, p. A3

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