VOLTAR

Marina cobra partilha de benefícios

OESP, Vida, p. A22
28 de Mar de 2006

Marina cobra partilha de benefícios
Na reunião de cúpula que encerra a COP 8, ministra exige distribuição de lucros da exploração da biodiversidade

A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, cobrou ontem a criação de um regime internacional de acesso e repartição de benefícios pela exploração dos recursos genéticos da biodiversidade. Ao lado do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (visivelmente preocupado, horas antes da demissão do ministro Antonio Palocci), ela abriu o segmento de alta cúpula da 8ª Conferência das Partes (COP 8) da Convenção das Nações Unidas sobre Diversidade Biológica, em Curitiba.

O tema do acesso e repartição de benefícios (ABS, em inglês) tem sido o de negociação mais difícil na COP, da qual participam 188 países. Trata-se de um dos três pilares da convenção, ao lado da conservação e do uso sustentável da biodiversidade. A idéia é combater a biopirataria, garantindo que os recursos genéticos da fauna e flora de um país não sejam usados por outros sem as devidas compensações. Como, por exemplo, no caso de drogas e cosméticos desenvolvidos por laboratórios estrangeiros a partir de espécies da biodiversidade brasileira.

"Embora entendamos a cautela com que alguns países e setores tratam esse tema, é fundamental que a comunidade internacional possa avançar na direção desse objetivo - o único em relação ao qual, 12 anos após a entrada em vigor da convenção, os resultados até o momento são inexpressivos", disse Marina. "Para o Brasil, a existência desse regime mostra-se matéria relevante e urgente."

A discussão divide os países em desenvolvimento (detentores da biodiversidade) e as nações mais desenvolvidas (detentoras das indústrias e da tecnologia necessárias para transformar os recursos genéticos da biodiversidade em produtos). Enquanto Marina e Lula discursavam para os representantes ministeriais, diplomatas continuavam a negociar os termos do regime, no oitavo dia da conferência. Ou melhor, dos termos da negociação.

Por enquanto, tudo que existe é o rascunho de um texto elaborado na última reunião preparatória de Granada, na Espanha, no mês passado (articulado principalmente pela diplomacia brasileira). A meta do Brasil em Curitiba, ao lado de outros países megadiverso, é que esse texto seja oficialmente adotado como base para a continuidade das negociações. Países como Austrália e a União Européia, porém, consideram o texto prematuro, e tentam protelar o processo.

"Esperamos chegar a um acordo aqui para um prazo limite de negociação, de preferência, dentro do mandato do Brasil na presidência da COP (até 2008)", disse Bráulio Dias, gerente de Conservação da Biodiversidade do Ministério do Meio Ambiente.

Um dos pontos de discórdia, segundo ele, refere-se ao reconhecimento dos conhecimentos tradicionais. Ou seja: caso algum produto derivado dos recursos genéticos seja beneficiado do conhecimento de populações tradicionais (como indígenas e ribeirinhas), elas também deverão receber parte dos benefícios. O Brasil não abre mão desse ponto.

Surpresa

O presidente Lula ignorou a crise política e falou apenas sobre meio ambiente. Fez um discurso morno, pré-escrito, mas não deixou de improvisar comentários no final. Nesse momento, surpreendeu alguns ambientalistas.

"Ainda estamos aquém, mas ao invés de ficarmos reclamando o que não conquistamos ainda, aproveitem este encontro para que a gente possa comemorar o que nós já conquistamos", disse Lula. "Os nossos fracassos serão reparados por quem vier depois de nós."

"Ele jogou a toalha, mostrou total irresponsabilidade", reagiu Marcelo Furtado, diretor de campanhas do Greenpeace. "Achei uma mensagem muito derrotista, em vez de uma mensagem de empenho."

Lula exaltou as conquistas obtidas nas últimas décadas pelo movimento ambientalista, que no início não passava de "meia dúzia de pessoas espalhadas pelo mundo afora, sendo chamadas e achincalhadas de tudo quanto é nome".

"Se tivéssemos aceito a pressão e não tivéssemos seguido em frente, nós não teríamos transformado aquele movimento inicial - que parecia de um grupo de jovens alucinados - em políticas de Estado, levadas a sério por muita gente no mundo."

OESP, 28/03/2006, Vida, p. A22

As notícias aqui publicadas são pesquisadas diariamente em diferentes fontes e transcritas tal qual apresentadas em seu canal de origem. O Instituto Socioambiental não se responsabiliza pelas opiniões ou erros publicados nestes textos. Caso você encontre alguma inconsistência nas notícias, por favor, entre em contato diretamente com a fonte.