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Mapa do caminho busca compromissos para pobres

FSP, Ciência, p. A24
01 de Dez de 2007

"Mapa do caminho" busca compromissos para pobres
Brasil reivindica autoria de proposta de conciliação, mas insiste em não aceitar metas

Da redação

Quando se reunirem a partir de segunda-feira em Bali, diplomatas de 190 países mais a União Européia estarão debatendo uma proposta brasileira: o chamado "mapa do caminho de Bali", que propõe que as conversas hoje informais sobre compromissos de redução de emissões de gases de efeito estufa para os países em desenvolvimento -sem os quais dificilmente as nações industrializadas aceitarão metas mais ambiciosas para Kyoto após 2012- sejam transformadas em uma negociação formal com data para acabar: 2009. Depois disso, ricos e pobres concluiriam um acordo a ser implantado para o período 2013 a 2018.

Da redação

O mapa é visto por uns como um artifício diplomático para empurrar as discussões com a barriga: afinal, os países em desenvolvimento, a começar do Brasil, recusam-se a aceitar qualquer coisa que não sejam compromissos voluntários. Ancoram-se para isso no princípio das responsabilidades comuns mas diferenciadas (cabe a quem historicamente causou o problema, ou seja, o mundo desenvolvido, resolvê-lo).
Para a chancelaria brasileira, no entanto, o mapa é um instrumento "razoavelmente revolucionário", porque permitirá unir ações em dois "trilhos", o da Convenção do Clima e o do Protocolo de Kyoto.
Parece confuso? E é mesmo. Grosso modo, hoje as discussões sobre o que fazer após 2012 estão divididas em dois grandes blocos ou trilhos: o chamado Grupo de Trabalho, composto pelos países que já têm metas a cumprir por Kyoto (e que precisam ampliá-las), e o do Diálogo, que discute como os países em desenvolvimento poderiam ampliar sua contribuição. Como a Convenção do Clima estabelece que todos os países precisam contribuir com a solução do problema do aquecimento global, o Itamaraty raciocina que não é preciso inventar um novo protocolo para incluir os países pobres: basta juntar os dois trilhos, o do Grupo de Trabalho e o do Diálogo, num caminho só após 2009.
O Brasil deve apostar em duas linhas de negociação: de um lado, mostrar que algumas nações emergentes estão prontas para adotar políticas públicas internas mensuráveis e quantificáveis que levem à redução de emissões. De outro, cobrar dos países ricos que financiem essas políticas.
O "case" que o país exibirá é a redução do desmatamento na Amazônia por três anos consecutivos. Na semana que vem, a ministra Marina Silva (Meio Ambiente) deverá anunciar a menor taxa de desmatamento já medida, para o biênio 2006/ 2007. Como o desmatamento é responsável por cerca de dois terços das emissões brasileiras, o país vem propondo que seus esforços voluntários para reduzir o desmatamento contem como esforços para mitigar o efeito estufa -e que, portanto, sejam recompensados pelos países industrializados com um fundo que traga dinheiro para políticas de desenvolvimento sustentável, que reduzam ainda mais as emissões.
Segundo uma fonte do Itamaraty, o mesmo raciocínio poderia se aplicar a outros países em desenvolvimento em outros setores da economia para o período 2013-2018. Depois dessa fase de transição, seria possível até mesmo falar em metas obrigatórias.
Ambientalistas que acompanham as negociações dizem que isso é pouco. Para Marcelo Furtado, diretor de campanhas do Greenpeace, o país deveria adotar uma meta de redução do desmatamento em vez de simplesmente uma política de tentar reduzi-lo e receber compensação caso consiga.
"Nós já tivemos no Brasil metas para inflação sem saber como a economia se comportaria", compara. "Por que não podemos ter uma meta para o desmatamento?"
Rubens Born, do Vitae Civilis, diz que o Brasil precisa "sair da defensiva" e assumir uma proposta ousada. Born também criticou o governo por usar dois pesos e duas medidas na negociação. "Na hora de passar o chapéu lá fora o Brasil é um país pobre, mas na hora de decidir sobre a ocupação da Amazônia, é uma nação soberana."
Outros dois pontos de atrito são a resistência brasileira em aceitar um limite de 2C como o máximo que a Terra poderá esquentar, algo que a União Européia vem tentando estabelecer, e a recusa do Itamaraty em aceitar a proposta feita pelo Pnud (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento) de que as emissões dos países do Terceiro Mundo atinjam seu pico em 2020 e sejam cortadas em 20% daí para a frente.
Questionado sobre a proposta do Pnud, um diplomata brasileiro disse que o país não a defenderia, mas também "não objetaria". "O Brasil não objetar a isso é uma vitória?" -questiona Born. "Não parece muito."

Perspectivas
Segundo Born, as ONGs esperam que Bali possa produzir um mandato de negociação, com o escopo dos objetivos que serão negociados e um patamar de redução igual ao proposto pela União Européia: 30% em relação aos níveis de 1990 até 2020. "Realisticamente, eu não acho que o processo vá estar concluído em 2008 por causa da conjuntura dos EUA", afirma. Ele diz, no entanto, que há um precedente político para que as negociações sejam concluídas a tempo: o próprio acordo de Kyoto. "Kyoto foi negociado em três anos. Se houver pressão política, a coisa acontece." (CA)

FSP, 01/12/2007, Ciência, p. A24

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