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Mandante da morte de Dorothy Stang já está livre do regime fechado

O Globo, País, p. 9
21 de Set de 2013

Mandante da morte de Dorothy Stang já está livre do regime fechado
Condenado a 30 anos, Bida só passou cinco anos sem liberdade

CLEIDE CARVALHO
cleide.carvalho@sp.oglobo.com.br

SÃO PAULO - Julgado pela quarta vez e condenado a 30 anos de prisão pela 2ª Vara do Tribunal de Júri de Belém por ter sido o mandante do assassinato da missionária Dorothy Stang, ocorrida em fevereiro de 2005 em Anapu, no Pará, o fazendeiro Vitalmiro Bastos de Moura, o Bida, já não tem mais pena a cumprir. Preso desde abril de 2005, ele já usufrui o benefício do regime semiaberto - só dorme na prisão - por ter cumprido um sexto da pena.
Na prática, ele ficou cinco anos preso. Além disso, os advogados poderão recorrer mais uma vez da sentença e pedir a realização de um quinto julgamento. Nos quatro julgamentos a que foi submetido até agora, o fazendeiro foi condenado três vezes e absolvido uma única vez.
Das sete cédulas em que os jurados apresentam seus votos, apenas quatro foram abertas. Como as quatro condenavam o réu, o que determinava maioria, as outras três não foram abertas. De acordo com o promotor Edson Cardoso de Souza, a lei permite que os outros três votos permaneçam em segredo para proteger os jurados e impedir que o réu saiba quantos votaram contra ele. Dos seis envolvidos na morte de Dorothy, cinco já foram condenados, e nenhum deles cumpre mais pena em regime fechado.
- Na semana passada, encontrei com o pistoleiro fazendo compras à noite, num supermercado em Belém. Parece ironia. Na prática, eu ainda estou preso ao caso, e o assassino está solto - diz Souza, acrescentando que as penas parecem longas, mas são brandas.
O quarto julgamento de Bida demonstra a facilidade de protelar decisões com uma infinidade de recursos, a ponto de o réu já ter cumprido a pena que lhe foi atribuída. Na hipótese de ser absolvido no futuro, ainda poderá pedir indenização ao Estado.
Bida foi julgado pela primeira vez em 2007, e a pena foi de 30 anos de prisão. A lei da época garantia um segundo julgamento a qualquer condenado a mais de 20 anos. O segundo júri foi em maio de 2008. Durante a sessão, foi apresentado um DVD no qual o capataz inocentava o fazendeiro. Por cinco votos a dois, ele foi absolvido. O promotor recorreu, e o júri foi anulado. O terceiro julgamento ocorreu em abril de 2010. Os advogados do fazendeiro não apareceram e foram substituídos por um defensor público, que reclamou ter tido apenas dez dias para analisar o caso. Os advogados do réu apresentaram habeas corpus ao Tribunal de Justiça do Pará alegando cerceamento de defesa, já que o defensor não teve condições de defender o réu à altura. O TJ não concedeu o habeas corpus. O Superior Tribunal de Justiça também negou. No Supremo Tribunal Federal (STF), por três votos a dois, o habeas corpus passou, o que levou a este quarto julgamento. Mas a lei diz que o réu tem direito a apresentar dois recursos contra a sentença, e o habeas corpus não está entre eles. Dessa forma, os advogados podem recorrer de novo.
"SENSAÇÃO DE QUE A LEI NÃO PUNE"
O pistoleiro que matou Dorothy com seis tiros é Rayfran das Neves Sales. Ele confessou o crime e foi condenado a 27 anos de prisão. Já obteve progressão da pena e cumpre prisão domiciliar. O segundo pistoleiro, Clodoaldo Batista, foi condenado a 17 anos. Também cumpria pena em regime semiaberto, mas fugiu em 2011.
Amair Feijoli Cunha, capataz de Bida, foi beneficiado pela delação premiada ao apontar o patrão como mandante. Condenado a 27 anos de prisão em 2006, teve a pena reduzida para 18 anos. O regime é prisão domiciliar e ele mora em Tailândia (PA). O sexto é o fazendeiro Regivaldo Pereira Galvão, também apontado como mandante e condenado a 30 anos. Em agosto de 2012, o Supremo Tribunal Federal concedeu liberdade provisória até o julgamento de recurso contra a sentença.
- Fica uma sensação de que a lei não pune. Embora a condenação por 30 anos passe imagem de que se fez justiça, ele só precisou ficar cinco anos preso - afirma José Batista, advogado da Comissão Pastoral da terra (CPT).
Marjorie Marona, pesquisadora do Observatório da Justiça Brasileira (OJB), afirmou que a legislação penal e a processual precisam mudar para que a Justiça seja efetiva e se aproxime dos anseios da sociedade.

O Globo, 21/09/2013, País, p. 9

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