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Madeira amazônica é 75% legal, mas ainda predatória

Estadão do Norte-Porto Velho-RO
11 de Jun de 2002

Os sistemas de exploração de madeira, na Amazônia, estão mudando à força de uma fiscalização mais ostensiva e leis mais rigorosas. O madeireiro típico, que tinha a serraria e uma série de áreas de exploração próprias, que o abasteciam, controlando, por vezes, até a vida das comunidades das redondezas, deu lugar a um dono de serraria urbano, que não quer se envolver com a burocracia dos planos de manejo, nem pode mais manter os esquemas de barracão, que antes atrelavam os ribeirinhos ao seu negócio. Ele prefere comprar a madeira de terceiros - os chamados toreiros - que reúnem as toras provenientes das pequena áreas autorizadas de desmatamento, sobretudo em assentamentos agrários, e já chegam na entrega da matéria prima com a papelada pronta.
"Esta mudança, ocorrida nos anos 90, indica que a fiscalização mais ostensiva e a legislação surtiram algum efeito sobre o mercado, mas não foram os efeitos desejados, de respeito à lei e mudança para sistemas de exploração de madeira racionais, com planos de manejo sustentáveis", analisa Roberto Smeraldi, coordenador de um estudo da entidade ambientalista Amigos da Terra, realizado com apoio do Insternational Institute for Environment and Development (IIED), a ser divulgado oficialmente na próxima semana. De acordo com seus cálculos, hoje, 75% dos 30 milhões de metros cúbicos de madeira extraída na Amazônia são legalizados por autorizações de desmatamento, 5% saem de áreas com planos de manejo regulares e 20% são ilegais. Nestes 20% fora da legalidade, três quartos correspondem a madeira roubada de unidades de conservação e áreas indígenas (principalmente) e um quarto vem de planos de manejo irregulares.
"Estes números invertem totalmente as estatísticas que tínhamos no início dos anos 90, quando calculávamos que 80% da madeira amazônica era obtida de forma ilegal", acrescenta Smeraldi. "Só que a atual legalidade ainda é predatória". A madeira extraída de assentamentos sai dos 3 hectares, que cada assentado tem direito de desmatar por ano, e corresponde a uma média de 60 m3 de madeira por lote. "É pouco, individualmente, porém a média de assentamentos, desde 1995, é de cerca de 50 mil famílias por ano, descapitalizadas e sem condição de sobreviver até a regularização do lote ou liberação do primeiro Pronaf (financiamento da agricultura familiar), ou seja, a venda de madeira é o Pronaf inicial deles e estes 60 m3 anuais precisam ser multiplicados por milhares".
Incentivo à corrupção
Com esta madeira na mão, os toreiros compram a regularização do transporte e entregam a matéria prima nas serrarias já com todas as guias. O estudo da Amigos da Terra incluiu um levantamento junto a estes intermediários - sobretudo nos pólos madeireiros do Sul do Pará e norte de Mato Grosso - para saber quanto custa "comprar" a regularização, contornando, através da propina, as inúmeras dificuldades criadas pelo rigor das novas leis e portarias. A conclusão dos ambientalistas é que o preço da madeira pago aos agricultores e ribeirinhos, que derrubam as toras - R$1 a 5,00 por m3 - , continua praticamente igual há dez anos. Mas o custo da corrupção é de 5 a 10 vezes maior: dos R$1 a 3,00 por m3, do início dos anos 90, passou para R$ 10 a 15,00. "O resultado é que a compra da matéria prima é o menor custo do madeireiro, hoje, gerando uma grave distorção no mercado e reduzindo ainda mais a preocupação com a maneira como esta madeira é extraída", comenta o coordenador do trabalho.
Para corrigir esta grave distorção, Smeraldi defende, a curto prazo, algumas medidas fiscais, com o objetivo de aumentar o interesse na exploração madeireira com planos de manejo sustentável, com planejamento de uso do solo de longo alcance. Entre as alterações tributárias sugeridas estão, por exemplo, a revisão das regras do Imposto Territorial Rural (ITR), premiando os proprietários que fazem manejo; a vinculação do percentual de Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) da madeira beneficiada, conforme a origem da matéria prima, tornando a madeira de desmatamento mais cara e a oriunda de manejo sustentável, mais barata.

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