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Luta por reconhecimento de um povo

O Estado de Minas-Belo Horizonte-MG
Autor: Lourival Werneck
08 de Set de 2001

Enquanto o Brasil comemora a independência, povos indígenas, esquecidos e abandonados, buscam o reconhecimento étnico oficial do governo. Vítimas de uma política indigenista que os tratava como problema, muitos acabaram perdendo contato com a sua própria história e agora lutam para resgatá-la, como mostram os antropólogos do Centro de Documentaçao Eloy Ferreira da Silva (Cedefes), com sede em Contagem. É o caso dos índios Aranãs, que vivem, em sua maioria, espalhados por fazendas na região do Vale do Jequitinhonha e sobrevivem da agricultura, da caça e da cria de pequenos animais de pequeno porte. Ou melhor, sobreviviam, porque a água está secando e os fazendeiros não lhes permitem mais plantar à meia, como antes, por medo de terem que enfrentar ações de usucapião.
Conscientes de sua identidade, os índios Aranãs estiveram na sede da Fundação Nacional do Índio (Funai), em Governador Valadares, mostrando fotos e registros. Os índios reivindicam o direito à terra, assistência médica e outros benefícios, mas o Governo Federal vai levando o problema em banho-maria.
A antropóloga Vanessa Caldeira, do Cedefes, reúne dados para ajudar os Aranãs a conseguir o reconhecimento. Para ela, é importante que os índios comecem a ocupar espaços que vão além das aldeias. "Ocupando esses espaços, eles lutam para dizer o que querem e o que pensam e mostram a cara para tomar o rumo de sua história. Através de representações sociais que fogem ao estereótipo do índio, presente no imaginário popular, tentam garantir aquilo que historicamente lhes foi (e ainda é) negado: o direito a ser diferente. Resta-nos escutar a voz desses legítimos sujeitos históricos brasileiros para despir-nos de nossos (pre)conceitos e, então, compreendermos quem são os índios do Brasil neste final de século", afirma.
Além de estarem em localidades rurais conhecidas como "Alagadiço" e "Campo", há indivíduos pertencentes ao grupo dos Aranãs nas cidades de Araçuaí, Belo Horizonte, São Paulo, Juatuba, Virgem da Lapa, Ponto dos Volantes e Pará de Minas, entre outras.
Adaptação forçada
Principalmente no Vale do Jequitinhonha, a colonização causou enormes prejuízos para os povos indígenas. A média e baixa região foram colonizadas a partir de uma política cruel, adotada no início do século XIX. Diversos quartéis militares foram instalados para reunir os índios da região, ainda protegida pela mata atlântica. Isso possibilitou a ocupação por grandes fazendas, formadas através da utilização de mão-de-obra indígena.
Com a chegada de novas levas de colonos e com os índios aldeados, os quartéis se
transformaram em pequenos núcleos populacionais, originando, mais tarde, as principais cidades. Ocupada, a região se integrou, comercial e culturalmente, com o Alto Jequitinhonha e o litoral da Bahia, através de um intenso tráfego de canoas, onde a mão-de-obra indígena também foi empregada. Na segunda metade do século XIX, a colonização se dirige para o Vale do Mucuri, onde Philadélfia, atual cidade de Teófilo Otoni, se transformava em um pólo regional.Forçados a abandonar a vida em comunidade, muitos tiveram que se adaptar, adotando elementos culturais da sociedade dominante. Neste novo contexto, surgiu uma nova política indigenista, com a instalação da administração capuchinha dos aldeamentos do Governo
Imperial, entre eles, o de Nossa Senhora dos Anjos de Itambacuri, que chegou a reunir uma população em torno de dois mil índios.
Os Aranãs, originários dos rios Urupuca, Capelinha, Poté e Malacacheta, após uma grande epidemia, que dizimou parte de sua população, tiveram alguns de seus descendentes transferidos para Itambacuri, onde passaram a receber uma educação e orientação capuchinha. Fazendeiros tinham os aldeamentos como locais de fácil aquisição de mão-de-obra. Esse foi o caso de Manuel Aranã, principal referência na memória do atual grupo que luta pelo reconhecimento étnico oficial. Separados de seus parentes e impedidos de viver em comunidade, com o tempo, eles passaram a ser conhecidos apenas como índios, sem que
sua etnia fizesse importância. Os descendentes dos Aranã passaram então a utilizar a palavra índio como sobrenome em busca de afirmação de sua identidade étnica, ainda que genérica.

A história começou a mudar quando um fazendeiro resolveu levar um deles, Manoel Índio, para trabalhar numa fazenda em Araçuaí. Outros seguiram o mesmo caminho. No Vale do Jequitinhonha, próximo a Araçuaí e Coronel Murta, os Aranã tornaram-se agregados nas fazendas. Na década de 90, eles começaram a ter contato com os índios Pankararu, que se instalaram na região de Araçuaí em 1994. A chegada dos Pankararu acabou provocando uma curiosa reação nos membros da família índio. A partir deste contato eles passaram a fazer uma reflexão a partir da própria condição social

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