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Lula inclui Chico Mendes no 'Livro dos Herois da Patria'

FSP, Brasil, p.A4
25 de Set de 2004

Presidente assina lei proposta pela senadora Marina Silva (PT-AC)
Lula inclui Chico Mendes no "Livro dos Heróis da Pátria"
Iuri Dantas
Da sucursal de Brasília
O seringueiro, ecologista e fundador do PT no Acre Francisco Alves Mendes Filho, o Chico Mendes, morto em 1988, terá seu nome inscrito no "Livro dos Heróis da Pátria", no Panteão da Pátria e da Liberdade, na praça dos Três Poderes, em Brasília. Sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a lei que tornou Mendes o oitavo na lista de heróis da pátria foi publicada anteontem no "Diário Oficial" da União.
O livro foi criado em 1989, para homenagear pessoas que dedicaram suas vidas ao país. A iniciativa de inscrever o nome de Mendes foi tomada em 1999 pela então senadora Marina Silva (PT-AC), hoje ministra do Meio Ambiente. A petista conviveu com Chico Mendes no Acre, onde trabalharam juntos no PT e em sindicatos de seringueiros.
Na justificativa de seu projeto, a então senadora explica que o Brasil precisa permanentemente realimentar sua memória. "A memória do líder seringueiro não pode ser apagada. No exterior, principalmente na Europa, vários logradouros públicos e instituições foram criadas em memória de Chico Mendes. Contudo, no Brasil, a precária memória histórica precisa ser permanentemente realimentada", argumenta.
A presença de Mendes no panteão significa, segundo Marina, o preenchimento de uma lacuna, na história, sobre "o trabalho e a resistência dos povos da floresta" representados por ele.
Chico Mendes promoveu durante as décadas de 1970 e 1980 intensas campanhas pela organização sindical dos seringueiros e proteção ao meio ambiente. Ficou mundialmente conhecido quando foi ao Senado norte-americano e ao BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento), em 1987, questionar investimentos estrangeiros em projetos que desmatavam a floresta amazônica.
Diante da repercussão, várias linhas de investimento externo foram suspensas. Mendes passou a receber prêmios internacionais, mas as ameaças de morte se intensificaram. Em 22 de dezembro de 1988, Chico Mendes foi assassinado em sua casa, em Xapuri (AC), quando tinha 44 anos.
Homenagem sem critério
A inscrição no "Livro dos Heróis da Pátria" não é concedida a partir de nenhum critério definido. Em 1989, o então presidente da República, José Sarney, atual presidente do Senado Federal, enviou uma mensagem ao Congresso definindo o perfil dos futuros laureados. O projeto foi arquivado pela CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) da Câmara e até hoje as regras não foram devidamente estabelecidas.
A falta de critério abre margem para um leque amplo de possibilidades. Projetos em tramitação no Congresso pedem a mesma homenagem a Pero Vaz de Caminha, autor de carta relatando a descoberta do Brasil em 1500, e aos 21 técnicos mortos no acidente do VLS-1 (Veículo Lançador de Satélites) em agosto do ano passado no Maranhão.
Os oito atuais heróis da pátria foram todos homenageados por meio de projetos de lei aprovados pelo Congresso, sancionados pelo presidente da República e publicados no "Diário Oficial".

Sindicalista defendia reservas extrativistas para preservar floresta
Ecologista alcançou projeção internacional na década de 80
Da redação
O líder seringueiro Chico Mendes (Francisco Alves Mendes Filho), assassinado em dezembro de 1988, é o ecologista brasileiro mais conhecido no exterior. Sua vida foi objeto de diversos documentários, peças de teatro e livros (de Zuenir Ventura, Marcio de Souza, Edilson Martins, Javier Moro, Andrew Revkin) e do filme "Amazônia em Chamas" ("The Burning Season", de 1994).
Chico Mendes nasceu em Xapuri (AC) em 15 de dezembro de 1944. Trabalhou como seringueiro desde criança. Em 1975, ingressou no recém-fundado Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Brasiléia (AC).
Em 1976, começou a divulgar uma tática para impedir o crescente desmatamento da floresta amazônica promovida pelos fazendeiros, o "empate", que consistia na organização um cordão humano encabeçado por mulheres e crianças, que impedia que os peões dos fazendeiros avançassem para cortar a mata.
Passou a defender a desapropriação de fazendas para permitir a criação de reservas extrativistas, o que permitiria uma utilização racional dos produtos da floresta (castanha, copaíba, babaçu, açaí, cacau, guaraná e mel) e ao mesmo tempo permitiria sua preservação. Chico Mendes considerava que as reservas extrativistas constituíam a única forma de impedir a destruição da floresta amazônica.
Em 1977, criou o Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Xapuri (AC) e, no ano seguinte, foi eleito vereador na cidade pelo MDB. Em 1979 começou a receber ameaças de morte. Acusado de subversão, foi detido e torturado por policiais do Estado.
No mesmo ano, participou de um comício em Brasiléia ao lado do atual presidente, Luiz Inácio Lula da Silva, em protesto pelo assassinato do presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais local, Wilson Pinheiro. Dias depois do comício, um suspeito de ter assassinado o sindicalista foi morto. Chico Mendes e Lula foram enquadrados na Lei de Segurança Nacional, mas acabaram sendo absolvidos.
Em 1980, Chico Mendes participou da fundação do PT. Em 1985, organiza o 1o Encontro Nacional de Seringueiros, que serve de ponto de partida para a organização da União dos Povos da Floresta, entidade criada para defender a Amazônia.
Alcançou projeção internacional. Em 1987, recebeu representantes da ONU (Organização das Nações Unidas) em Xapuri e mostrou os estragos causados na floresta por projetos financiados por organismos internacionais. Meses depois foi ao Senado dos Estados Unidos e ao BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento) para reafirmar suas denúncias. Nesse mesmo ano, recebeu o Prêmio "Global 500" da ONU, por sua luta pela preservação do ambiente, e a "Medalha do Meio Ambiente" da organização "Better World Society".
Em 1988, o Bird (Banco Mundial) suspendeu um empréstimo para a pavimentação da BR-363 porque o projeto não previa a proteção às terras dos índios.
Foi assassinado a tiros em Xapuri em 22 de dezembro, aos 44 anos. A repercussão internacional da morte foi intensa. Jornais americanos e europeus criticaram o governo José Sarney (1985-1989) por não ter oferecido segurança ao líder. Em 24 de janeiro do ano seguinte, Sarney criou o Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e de Recursos Naturais Renováveis).
Em 1990, recebeu postumamente o Prêmio Internacional Nações Unidas/Sasakawa do Meio Ambiente. No Acre, foi criada a reserva extrativista Chico Mendes. O fazendeiro Darci Alves, que confessou o assassinato, e seu pai, Darly Alves, acusado de ser o mandante, foram condenados em 1991. Em 1993, eles fugiram da prisão, mas foram recapturados em 1996.

FSP, 25/09/2004, p. A4

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