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Longe de casa, índios kariri-xocó e fulni-ô preservam tradições

A Tarde Online
Autor: Saymon Nascimento
19 de Abr de 2008

Depois de dois quilômetros de estrada de terra, a portaria. Na entrada da reserva indígena Thá-fene, em Lauro de Freitas, Cícero Pontes da Cruz, 34 anos, recebe cordialmente os visitantes. Cícero, não. Todo mundo conhece o músico e líder da reserva por Wakay.

Na área de 28 mil metros quadrados, vivem quatro famílias de índios Kariri-xocó, de Alagoas, e Fulni-ô, de Pernambuco. "Há ainda outros índios que ficam por aqui temporariamente, mais ou menos outras sete famílias. Depois de fazer contato com a cultura não-índia, eles voltam para as tribos, para que outros possam vir", conta Cícero.

Logo na entrada da reserva, há um cercado, com aproximadamente 8 metros de diâmetro. Nos limites deste cercado, umas cinco ocas pequenas, com as portas voltadas para o centro do círculo. O local serve de ilustração dos rituais, cantos e danças, tanto para os visitantes, quanto para as crianças que moram na reserva. "Elas escutam todas as histórias da tribo, mas nesse espaço, elas vêem os pensamentos realizados, aprendem na prática".

Os índios vivem numa grande casa de alvenaria, em forma de T, como as malocas. No chão da sala principal, esteiras de palha, e uma pele de bode. "O máximo de tecnologia que temos é tv e dvd", diz Wakay. Nas paredes, há várias peças de arte, caça e vestuário, produzidas tanto para a decoração do local, como para venda. São flautas de diversos modelos, arcos, cocares, potes, e até uma armadilha para peixes, o kuvu.

Feito com hastes de bambu presas em forma de abajur, o kuvu serve para pescar em águas de baixa profundidade. O índio prende o kuvu no chão, e pega o peixe pela abertura menor. "Tem que mexer bem a água depois de jogar o kuvu, para o peixer ficar 'bêbado' e não escapar pela abertura de cima", explica Lymbo Perigipe, 31, kariri-xocó e cunhado de Wakay.

O terreno atrás da casa é íngreme, e os índios plantam pouca coisa: mandioca para fazer farinha, algumas raízes. Fartura há muita de jaca. Perto do fim da tarde, algumas crianças vão pegar lenha. "A gente tem fogão, mas usa o fogo para assar batata e jabá", diz Lymbo.

No caminho para a parte de baixo da reserva, há outro círculo, de terra batida, onde bancos são improvisados em troncos. É lá que os índios realizam os rituais religiosos.

Lymbo diz que o círculo serve para que os índios se sintam na tribo. "A gente espera a noite, apaga as luzes de casa para ficar bem escuro e vem para cá". No local, celebram a natureza. "A gente se apresenta para os visitantes, mas não deixa de cumprir nossas obrigações. Continuamos preservando e respeitando a natureza. A gente tem o conhecimento sobre ela, mas não achamos que ela é nossa. Nós é que pertencemos à natureza".

Batizado como Andreliano Perigipe dos Santos, Lymbo concluiu o nível superior. Formou-se no final do ano em Pedagogia pela Universidade do norte do Paraná (Unopac), que mantêm um programa de educação à distância. O curso foi pago pelo empresário Antônio Brandini, diretor de uma fábrica de brinquedos próxima à reserva.

Com o diploma em mãos, ele não planeja ficar na cidade. "Se for para ficar numa sala de aula, quero que seja lá. Vou poder ajudar os outros e eu sei que é só na tribo que eu vou ter paz. Não sei quando volto, porque é o tempo que se encarrega de dizer essas coisas, mas sei que aqui não vou ser feliz. Quero felicidade, segurança e liberdade".

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