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Ligações perigosas

CB, Brasil, p. 15
18 de Fev de 2005

Ligações perigosas

Prisão de quadrilha de pistoleiros e grileiros do Tocantins leva Polícia Federal a suspeitar que as ações do grupo podem ter relação com o assassinato da freira norte-americana Dorothy Stang, morta no Pará

Uma quadrilha de pistoleiros e grileiros desarticulada, ontem, pela Polícia Federal, em seis cidades do Tocantins, pode ter ligação com a morte da freira americana, naturalizada brasileira, Dorothy Stang, de 74 anos, assassinada no último sábado, no assentamento Esperança, em Anapu, a 600 quilômetros de Belém. O grupo, acusado de fraudar documentos de terras em áreas sem título de domínio e ainda ameaçar de morte fazendeiros da região, foi preso ontem na Operação Terra Nostra.

Ao todo, a Polícia Federal deteve 15 pessoas nas cidades de Palmas, Colinas do Tocantins, Bandeirantes, Presidente Kennedy, Guaraí e Tupiratins. Além de grileiros e pistoleiros, foram presos quatro policiais civis, um advogado, um oficial de justiça, o chefe da quadrilha - Luís Carlos Fagundes, chefe de segurança do candidato derrotado à prefeitura de Bandeirantes - e a tabeliã do Cartório de Registro de Imóveis de Tupiratins, Lucinete de Souza da Silva Araújo.

Segundo a Polícia Federal, a quadrilha falsificava documentos de posse da terra, títulos de propriedade e contratos de cessão de direitos e venda. Com os papéis em mãos, vendia os imóveis para fazendeiros do Paraná e Rio Grande do Sul. Esses chegavam a pagar até R$ 400 mil, dependendo do tamanho da propriedade. Depois que as vítimas efetuavam os pagamentos e ocupavam o imóvel - geralmente com caseiros -, os pistoleiros os expulsavam da área.

As negociações com os fazendeiros da região Sul eram realizadas por três corretores e pelo advogado do grupo, Ronaldo de Sousa Assis, um conhecido agiota do município de Colina do Tocantins. Todo dinheiro das negociações com as vítimas passava pela conta corrente do advogado. Os documentos falsos passavam por um processo de "legalização" no cartório de Tupiratins e, assim, as irregularidades eram ocultadas. As terras na região atraem o interesse, por serem excelentes para o plantio de soja, o que proporciona uma grande valorização.

As mesmas propriedades eram vendidas pelo grupo mais de uma vez. Segundo a coordenadora da operação, a delegada da PF Andréia Cristina Canal, cerca de 15 fazendeiros do Paraná e Rio Grande do Sul foram lesados pela quadrilha. "Temos a confirmação de fraudes de documentos em pelo menos cinco propriedades em Tocantins", disse a policial. O grupo pode ter aplicado um golpe de mais de R$ 6 milhões.

As investigações da PF tiveram início há um ano, depois do recebimento de denúncias anônimas. As vítimas também chegaram a delatar os casos à Polícia Civil de Brasilândia do Tocantins. Mas nada era investigado. Os agentes e peritos da delegacia também faziam parte do esquema de fraudes. "Eles recebiam propinas para não apurar nada", comentou a delegada.

Durante a investigação, as escutas telefônicas registraram as negociações realizadas pelo grupo comandado por Luiz Fagundes, detido num hotel, em Palmas. No entanto, segundo a delegada Andréia Cristina, o grupo parou de agir há quatro meses. "Não realizamos a operação antes porque muitos dos alvos estavam fora do Estado", explicou. Os investigadores informaram que, até agora, nenhuma morte foi relacionada aos pistoleiros da quadrilha. Uma testemunha revelou que chegou a ser espancada para deixar a propriedade.

Missionária
A Operação Terra Nostra aconteceu cinco dias após a morte da missionária americana no Pará. A PF investiga agora a ligação da quadrilha de grileiros e pistoleiros com os envolvidos na execução da irmã Dorothy Stang. "Pela proximidade e pelos problemas da região, não descartamos a possibilidade relação dos envolvidos no assassinato da freira com a quadrilha presa", observou a policial.

Cento e quarenta policiais federais participaram da ação. Nas buscas realizadas, os investigadores apreenderam documentos, computadores, armas - cinco revólveres calibre 38, espingarda, uma pistola .40 e uma carabina - e oito veículos.

O material apreendido na operação será analisado e periciado. Os presos serão indiciados por formação de quadrilha, estelionato, falsificação de documentos públicos, esbulho possessório, ameaça, extorsão, falsificação ideológica e corrupção.

"Pela proximidade e pelos problemas da região, não descartamos a possibilidade relação dos envolvidos no assassinato da freira com a quadrilha presa"
Andréia Cristina. Delegada

CB, 18/02/2005, Brasil, p.15

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