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Lideranças indígenas organizam mobilização

Folha de Boa Vista - http://www.folhabv.com.br/
Autor: Aline dos Santos
15 de Mai de 2012

Lideranças indígenas da Região das Serras, na Terra Indígena Raposa Serra do Sol, chegaram ontem a Boa Vista com a finalidade de realizar uma grande mobilização contra impunidade, que começa hoje, e para cobrar julgamento de acusados de cometerem crimes contra lideranças indígenas ao longo dos anos em que houve a luta pela demarcação das terras.

O objetivo do evento, que conta com apoio do Conselho Indígena de Roraima (CIR), é mobilizar durante toda a semana a sociedade para pressionar à Justiça a acelerar julgamento dos acusados. As lideranças também vieram acompanhar o julgamento do caso Aldo da Silva Mota na Justiça Federal de Roraima, assassinado em janeiro de 2003, cujo corpo foi encontrado numa cova rasa na área da fazenda Retiro no Município de Uiramutã.

Conforme o coordenador-geral do CIR, Mário Nicácio Wapichana, serão realizados manifestos e atos públicos com a finalidade de levar ao conhecimento da população a lentidão da Justiça. Também serão encaminhadas às autoridades cartas dos familiares das vítimas e lideranças sobre as violências e assassinatos.

Conforme manifesto divulgado ontem, desde 1972, quando iniciou a luta para reconquista de suas terras, os índios passaram a sofrer ameaças e lideranças acabaram assassinadas. "Na década de 80, muitas terras foram reconhecidas e demarcadas, porém também nessa década as ações repressoras contra os povos indígenas foram violentas e contava com apoio dos órgãos públicos, inclusive da Funai [Fundação Nacional do Índio], que foi criada para a defesa dos índios", diz um trecho do documento.

Eles citam a luta dos povos indígenas Yanomami, que contaram com o apoio de outros povos indígenas e instituições que não aceitaram a demarcação da Terra Indígena Yanomami em ilhas. "Essa luta custou muitas vidas dos povos indígenas Yanomami, muitas não contabilizadas oficialmente, mas ficou na memória do seu povo, uma vez que na terra havia invasão de muitos garimpeiros, que até os dias atuais persiste. O caso que chocou o Brasil e o mundo foi a 'chacina do Haximu', em que membros de uma comunidade inteira foram executados", frisa o manifesto.

Outra situação que a mobilização vai abordar diz respeito aos conflitos envolvendo os povos indígenas da Terra Indígena Raposa Serra do Sol, conhecidos pelo Brasil e mundo afora através da repercussão dos conflitos que surgiram. "Durante essa trajetória, muitas lideranças indígenas foram assassinadas e partiram sem ver a terra demarcada e homologada. Muitas lideranças perderam seus familiares e inúmeras famílias sofrem as consequências da marca de violência de seus familiares que carregam consigo até os dias atuais. Eles viram corpos de suas lideranças sobre uma lona preta, com marcas de balas. Até os dias atuais os assassinos estão impunes. A Justiça não julgou e, se julgou, argumentou motivos inacreditáveis contra as provas para absolver ou para declinar competências, e assim nunca chegar a nenhuma condenação dos assassinos", diz o documento.

NÚMEROS - Conforme documento divulgado ontem pelo CIR, durante a luta pela terra, 21 lideranças indígenas foram assassinadas, em muitos dos casos foi declinada a competência da Justiça Federal para a Justiça Comum Estadual processarem e julgarem os casos, o que nunca aconteceu.

Também são relatados vários casos por tentativa de homicídio e ameaças. "Crimes cometidos contra os povos indígenas da TI Raposa Serra do Sol, 21 homicídios, 54 ameaças de morte, 51 tentativas de homicídios, 80 casas destruídas, 71 prisões ilegais, 05 roças queimadas e 05 cárceres privados".

Caso Aldo Mota será julgado no dia 17

A mobilização das lideranças indígenas também tem como alvo acompanhar, no próximo dia 17, o julgamento dos acusados do assassinato do líder indígena Aldo da Silva Mota, após nove anos do caso, ocorrido no Uiramutã, Terra Indígena Raposa Serra do Sol.

Conforme o coordenador do CIR, Mário Nicácio, os familiares de Aldo e as lideranças estão preocupados com a possibilidade de haver novo adiamento desse julgamento, "bem como manobras inesperadas para a absolvição dos réus". "A fim de evitar mais um adiamento do julgamento, estamos nos manifestando pelo fim da impunidade em Roraima, das violências e mortes contra os povos indígenas", disse Nicácio.

O caso se arrasta por quase uma década. No dia 02 de janeiro de 2003, Aldo da Silva Mota desapareceu e somente no dia 09 daquele mês o corpo foi encontrado em uma cova rasa, na área da fazenda Retiro de propriedade do não índio Francisco de Oliveira, que era vereador de Uiramutã.

"As lideranças indígenas informaram as autoridades para as providências do traslado, mas estranhamente o corpo do indígena foi chegar ao Instituto de Medicina Legal somente no dia 10, às 14 horas. Segundo o médico legista responsável, ele recebeu o corpo em estado de decomposição que dificultou a análises. Em torno das 19 horas, o laudo estava pronto com causa mortis "causa natural e indeterminada", relata o documento do CIR.

"O CIR e os familiares solicitaram imediatamente o segundo laudo. O corpo do indígena foi trasladado para Brasília, onde foi feito o segundo laudo, quando foi atestado que o indígena foi executado quando os braços estavam para cima. O CIR também solicitou apuração em relação ao laudo dos médicos legistas de Roraima. Os empregados da fazenda do vereador e o próprio vereador respondem processo na Justiça Federal, cujo processo do júri é o 2003.42.00.001839-9", complementa o documento divulgado pelo CIR.

Conforme Nicácio, as lideranças temem em não haver julgamento com novo adiamento ou declinação da competência para a Justiça Comum Estadual ou ainda a absolvição dos réus. "Queremos que os culpados pelo assassinato de Aldo da Silva Mota sejam julgados e condenados", disse o coordenador do CIR. "Também levaremos todos os casos ao conhecido da Justiça brasileira, como o Conselho Nacional de Justiça, Supremo Tribunal Federal e instâncias federais", frisou.
As lideranças vão visitar os órgãos públicos para protocolar documentos no Ministério Público Federal (MPF), Ministério Público de Roraima (MPRR) Polícia Federal, Justiça Federal, Tribunal de Justiça, Assembleia Legislativa e também entregarão relatórios aos veículos de comunicação.

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