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Levantamento mostra 266 povos indígenas no Brasil

Valor Econômico, Brasil, p. A8
Autor: CHIARETTI, Daniela
22 de Mar de 2023

Levantamento mostra 266 povos indígenas no Brasil
Livro do ISA mostra que o movimento indígena nunca foi tão forte e coeso como agora e mulheres têm mais protagonismo

Por Daniela Chiaretti - De São Paulo
22/03/2023

O Brasil tem mais de 266 povos indígenas, que falam mais de 160 línguas e vivem em 731 terras em diferentes estágios de reconhecimento. Do total, são 490 terras com demarcação concluída e 241 em processo de demarcação. É mais de 1,5 milhão de pessoas que vivem em todas as regiões do país, sem contar os 114 povos isolados, ou mais. O movimento indígena nunca foi tão forte nem tão coeso, depois de viver dias de conflito intenso no governo Jair Bolsonaro. Neste cenário, as mulheres são as protagonistas das lutas recentes.
Esse diagnóstico está em "Povos Indígenas no Brasil 2017-2022", publicado pelo Instituto Socioambiental (ISA) e lançado ontem. A publicação, que existe desde 1980 e está na 13ª edição, é a grande referência sobre quem são os povos indígenas no Brasil.
"A obra é um grande quebra-cabeças que procura contribuir para o entendimento da enorme sociodiversidade indígena e é produto da contribuição de uma ampla rede de colaboradores indígenas, indigenistas, fotógrafos, linguistas, profissionais da saúde e educação", diz o antropólogo Tiago Moreira, do Programa Povos Indígenas no Brasil do ISA, um dos editores do livro. São 230 autores, sendo mais de 74 autores indígenas.
"Há um processo de emergência indígena em curso desde os anos 70 e que se acentuou com os direitos reconhecidos pela Constituição. É a busca pelas raízes e ancestralidade", diz Moreira.
A primeira edição, há 42 anos, pelo Centro Ecumênico de Documentação e Informação, (entidade que deu origem ao ISA) falava em 150 povos. O número cresceu a cada edição organizada por Fany Ricardo e pelo antropólogo Beto Ricardo. "Ao se reconhecerem como indígenas, muitos passam por situações de risco", diz Moreira.
A pandemia passa por todos os capítulos da publicação. Um dos autores, Márcio Santilli, um dos fundadores do ISA, descreve o retrocesso nos direitos indígenas dos últimos quatro anos. Outro destaque é o que discute o mito de que "há muita terra para pouco índio". Em Mato Grosso do Sul, por exemplo, a densidade habitacional nas áreas indígenas é de 27 habitante por km2, quatro vezes maior que a do Estado. Se as terras indígenas ocupam cerca de 13% do território nacional, o estoque de pastagens degradadas é de 11%.
Outro texto discorre sobre o pacote de projetos anti-indígenas no Congresso. A parte que homenageia as lideranças que morreram nunca foi tão extenso.
Vanda Ortega, técnica de enfermagem, foi a primeira pessoa a receber a vacina contra covid-19 no Amazonas. Ela é indígena do povo Witoto e nasceu no Alto Solimões, no município de Amaturá, na aldeia Colônia. Recebeu a vacina não por ser indígena, mas sim por ser profissional da saúde. Lutou muito, em Manaus, para conseguir que outros fossem vacinados. Vive no Parque das Tribos, no entorno de Manaus, onde estão mais de 700 famílias de 35 etnias.
Os povos indígenas sofreram com a falta de vacinas e proteção na pandemia, e as populações em contexto de cidade, não aldeadas, foram as mais impactadas. Não eram atendidos pelo SUS, por serem indígenas, nem pela Secretaria Especial da Saúde Indígena (Sesai), por serem da cidade e não viverem em aldeias. "Isso teve grande repercussão, nacional e internacional, e reivindicamos vacinas para os indígenas das cidades, não garantidas na pandemia", diz ela.
Para combater a injustiça, a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) protocolou a ADFP 709 (Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental, um tipo de ação para reparar danos a algo previsto pela Constituição) - episódio resgatado no livro. Os ministros do Supremo Tribunal Federal determinaram que o governo federal adotasse medidas de proteção aos povos indígenas durante a pandemia. "Só vacinamos quando chegávamos à faixa etária. A decisão não foi cumprida", diz ela, convidada a debater no lançamento ontem, em São Paulo.
"Os povos indígenas são resistentes. Agora há um protagonismo das mulheres que estão a frente das grandes lutas", diz. "A história que estamos escrevendo hoje não está na maioria dos livros. Esse documento tem um simbolismo importante porque traz as nossas vozes. Não são os outros falando por nós", diz Vanda Witoto.

Valor Econômico, 22/03/2023, Brasil, p. A8

https://valor.globo.com/brasil/noticia/2023/03/22/levantamento-mostra-2…

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