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Leis de uso do solo precisam ser revistas, diz urbanista

OESP, Metrópole, p. C5
03 de Jan de 2010

Leis de uso do solo precisam ser revistas, diz urbanista
Para Regina Meyer, mudanças no clima deixam atuais políticas defasadas

Herton Escobar

As regras atuais sobre ocupação do solo e definição de áreas de risco precisam ser revistas diante das novas condições climáticas e da ocorrência de tragédias como a de Angra dos Reis, segundo a arquiteta Regina Meyer, professora titular da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) da Universidade de São Paulo (USP). "Não adianta mais só cobrar o cumprimento das regras existentes. Elas não dão mais conta do recado", diz. "Precisamos de uma legislação mais severa e mais responsável."

Conceitos de declividade para a definição de áreas de risco, por exemplo, talvez tenham de ser atualizados para compensar o aumento de pluviosidade (volume de chuvas) causado pelo aquecimento global em determinadas áreas. "As mudanças climáticas já são absolutamente claras", salienta Regina. "As regras de antigamente já estão superadas."

A arquiteta critica a postura do poder público, que muitas vezes opta por legalizar ocupações irregulares em vez de remover as famílias. "A legalização não muda o fato de um lugar ser impróprio para morar. O risco não deixa de existir; pelo contrário, em geral ele só aumenta com a ocupação", explica.

A partir do momento em que uma área é identificada como de risco, o poder público tem obrigação de zelar pela segurança das pessoas e tirá-las de lá - ainda que se trate de uma invasão ou outro tipo de ocupação irregular, feita à revelia do Estado. Caso contrário, quando ocorre uma tragédia, a responsabilidade deve ser dividida com o governo. "Quando há uma epidemia, a culpa não é da pessoa que pegou a doença, é do poder público que não deu a vacina", compara Regina.

Famílias que moram em áreas de risco, segundo ela, deveriam ser contabilizadas como "déficit habitacional", para as quais o poder público precisaria construir casas populares. "A legalização é muito pouco exigente, o que acaba diminuindo o déficit real", diz.

PARTICULARIDADES

A tragédia de Ilha Grande apresenta um cenário inusitado, porque as construções eram regulares e não estavam em áreas geralmente consideradas como de risco. Não estavam em áreas de declive, e o morro acima das casas tinha mata preservada. Uma situação diferente das áreas de favela, por exemplo, em que as construções são feitas na própria encosta.

O problema, segundo análises preliminares dos geólogos, é que a camada de solo naquela região era muito fina e ficava sobre uma base de pedra. Quando a terra encharcou, por causa da chuva forte, as raízes não foram suficientes para segurá-la. Foi tudo morro abaixo, como se fosse um escorregador.

Agora, segundo Regina, será preciso fazer uma análise de risco em toda a ilha, para saber se há outras áreas como essa - que, em última instância, precisarão ser desocupadas. "No momento em que uma ocupação traz perigo, ela deve ser descontinuada", diz a arquiteta.

Já na parte continental do município, em que a cidade fica espremida entre a praia e as montanhas, a solução para evitar a ocupação dos morros seria adensar as regiões já ocupadas, que são mais adequadas para moradia urbana.

Para isso, porém, seria necessário lidar com construções históricas e com propriedades particulares. "Precisamos ter mais gente morando onde é adequado morar", conclui Regina.

Frases

Regina Meyer
Professora titular da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP

"Não adianta mais só cobrar o cumprimento das regras existentes. Elas não dão mais conta do recado. Precisamos
de uma legislação mais severa e mais responsável"

"A legalização não muda o fato de um lugar ser impróprio para morar. O risco não deixa de existir. Pelo contrário, em geral ele só aumenta com a ocupação"

"Famílias que moram em áreas de risco deveriam ser contabilizadas como "déficit habitacional""

"Precisamos ter mais gente morando onde é adequado morar"

OESP, 03/01/2010, Metrópole, -p. C5

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