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Leis ambientais acuam quilombolas

O Girassol - www.ogirassol.com.br
Autor: Leilane Marinho
26 de Mai de 2010

Quando se fala em preservação do meio ambiente, muitas pessoas se esquecem que fazemos parte do ecossistema e, portanto, preservar não significa apenas voltar os olhos para a fauna e a flora. Há que prestar atenção também nos seres humanos e suas comunidades tradicionais, como o caso das quilombolas no Tocantins.

Em 2001, foram criados o Parque Estadual do Jalapão (PEJ), a Estação Ecológica Serra Geral e o Parque Nacional das Nascentes do Rio Parnaíba. Eles abrangem a região do Jalapão, divisa com o Piauí e Bahia. Desde então, os povos remanescentes de escravos com índios que vivem nessas áreas isoladas são acuados pelas leis de proteção ambiental que impedem o exercício de atividades de sustento das famílias como roças de toco, uso da madeira, criação de gado curraleiro, extrativismo e artesanato com capim dourado e buriti. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), pouco menos de três mil remanescentes vivem nesta região.A incompatibilidade com a Constituição Federal de 1988, que reconhece os quilombolas e dá a eles direito a terra e à preservação das identidades culturais, fez com que o Movimento Estadual dos Quilombolas procurasse o Ministério Público Federal (MPF) a fim de resolver o impasse das comunidades com os órgãos públicos. A partir de então, foi criando o Fórum Permanente de Acompanhamento da Questão Quilombola no Estado do Tocantins.

O objetivo do fórum é encontrar uma forma de conciliar harmonicamente a conservação ambiental com a sobrevivência e manutenção dos modos de vida desses povos, uma vez que eles não podem aguardar a titulação das terras pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) para exercer as atividades de subsistência.De acordo com Eleuza Gutemberg, representante do Incra, uma parceria com a Universidade Federal do Tocantins disponibilizará os antropólogos que farão o reconhecimento dos territórios quilombolas. Só a partir desse estudo, poderá ser feita a redefinição dos limites do parque. "No Tocantins ainda não existe nenhuma comunidade quilombola com área titulada", conta Eleuza.Nos últimos anos, a Fundação Cultural Palmares (órgão vinculado ao Ministério da Cultura) reconheceu 15 comunidades quilombolas no Tocantins, que são: São José e Chapada de Natividade, em Chapada de Natividade; Córrego Fundo e Malhadinha, em Brejinho de Nazaré; Mumbuca, em Mateiros; Povoado do Prata, em São Felix do Tocantins; Redenção, em Natividade; São Joaquim e Laginha, em Porto Alegre do Tocantins; Barra do Aroeira, em Santa Tereza do Tocantins; Morro de São João, em Santa Rosa do Tocantins; Mimoso e Lago da Pedra, em Arraias; Cocalinho, em Santa Fé do Araguaia e Baviera, em Aragominas.

Área de preservação x comunidades

O conflito começou a ser resolvido no último dia 21 em reunião realizada pelo fórum, no Auditório da Associação dos Extrativistas da Comunidade Mumbuca, no Jalapão. Participaram da reunião, o Procurador da República Álvaro Lotufo Manzano e representantes do Ministério Público do Estado do Tocantins (MPE), Instituto Natureza do Tocantins (Naturatins), Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio); Fundação Palmares, Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra); Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional; Universidade Federal do Tocantins, ONGs e prefeituras de São Félix e Mateiros.

As comunidades tradicionais que estão dentro da área de preservação também estiveram presentes: Mumbuca, Carrapato, Boa Esperança, Capão do Modesto, Borá, Mumbuquinha, Rio Novo, Prata e Barra do Aroeira."Estamos aqui há mais de cem anos e somos os principais preservadores desta área que hoje compõe o parque. Já foi cogitada até a simples retirada da comunidade, mas lutaremos para que isso não aconteça", diz Ana Cláudia, neta de Dona Miúda que lidera o Projeto Amiguinhos da Natureza, em Mumbuca. "Temos que encontrar um modo de conciliar nossa sobrevivência, que vem de longa data, com a legislação ambiental, mas não sairemos da terra onde nascemos e vivemos".Segundo procurador Manzano, o governo do Estado errou ao criar o Parque Estadual do Jalapão sem antes fazer estudo das áreas ocupadas pela comunidade. "O Estado não pode impedir que as comunidades exerçam seu modo de vida, isso é direito delas", explica Manzano.

O procurador ressaltou que o princípio da dignidade humana determina a resolução de situações onde há conflito entre a Constituição e outras leis infraconstitucionais. Para ele, a criação da unidade de proteção foi uma atitude demagógica que visou somente atender a opinião pública.

TAC para sustentabilidade

Durante a auditoria, foi debatida a formulação de um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) para viabilizar a sobrevivência das comunidades com as unidades de conservação. No TAC, constarão questões como o manejo do solo, água, madeira e extrativismo, além da exploração do turismo, capim dourado e seda do buriti para artesanato. Na ocasião, também foi discutido o projeto de redimensionamento do parque, e o Naturatins propôs a criação de uma Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS) para uso das comunidades.

As comunidades também apresentaram propostas de soluções para os conflitos.O diretor de Biodiversidade e Áreas Protegidas, Antonio Santiago, destacou que os órgãos ambientais não têm a função de impedir as atividades de subsistência. Eles devem garantir que elas ocorram de acordo com a legislação ambiental vigente e que sejam orientadas pela equipe técnica do órgão respeitando os limites de conservação do PEJ. "Algumas pessoas estão sendo multadas não por estarem dentro do parque, mas sim por cometerem crimes ambientais como, por exemplo, desmatar a mata ciliar", explica Santiago.

Dentro das propostas da comunidade, um dos pontos rebatidos pelo Naturatins foi a caça de animais silvestres não permitida pelo órgão. Porém, o MPF enfatizou que a caça poderia ser desenvolvida em casos de insegurança alimentar e extrema necessidade.Quanto à exploração dos pontos turísticos, a Associação Jalapoeira de Condutores Ambientais (Ajaca) está em trâmite com o Naturatins para estruturar um modo de ocupação e exploração das dunas, para depois ser estendido para outros atrativos.

Uma próxima reunião marcada para o dia 14 de junho, às 14 horas, na sede da MPF - Ministério Publico Federal, em Palmas, discutirá a minuta do TAC, a partir das avaliações e análises feitas pelas comunidades e pelos órgãos participantes. (com informações da Ascom/MPF)

Saiba Mais

O Parque Estadual do Jalapão foi criado em 12 de janeiro de 2001. Ele abrange uma área de quase 150 mil hectares, sendo o maior parque estadual do Estado do Tocantins. Sua posição possui continuidade com a Área de Proteção Ambiental (APA) do Jalapão, Estação Ecológica da Serra Geral e Parque Nacional das Nascentes do Rio Parnaíba. O Naturatins é o órgão responsável por sua manutenção. A Estação Ecológica Serra Geral do Tocantins foi criada por decreto presidencial em 27 de setembro de 2001. Abrange os municípios de Almas, Ponte Alta do Tocantins, Rio da Conceição e Mateiros, no Estado do Tocantins, e Formosa do Rio Preto, no Estado da Bahia. É uma das maiores do Brasil e sua área totaliza 716.306 hectares. É administrada pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio).

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