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Justiça suspende transporte de grãos pela hidrovia Tocantins-Araguaia

Site do ISA -Socioambiental.org-São Paulo-SP
Autor: Feranado Mathias Baptista
19 de Mar de 2001

Ministério Público Federal nos estados de Mato Grosso e Goiás, em articulação com o ISA, obtém decisão judicial embargando o transbordo ilegal de carga previsto para o
início dessa semana na cidade de Barra do Garças

O juiz federal Paulo César Alves Sodré determinou, no final da tarde de 6a feira, 16 de março, a suspensão imediata do embarque, desembarque e transporte de grãos pela chamada Estação de Transferência de Carga em Barra do Garças (MT). Impediu assim o início ilegal das atividades de transporte de grãos pela Hidrovia Araguaia-Tocantins, já que ainda não há Estudo de Impacto Ambiental aprovado pelo Ibama. De acordo com o Secretário Municipal de Agricultura e Desenvolvimento de Barra do Garças, Vasco Mil-Homens, em declaração publicada no jornal goiano O Popular, a estação foi construída com o intuito de contornar a legislação ambiental, que prevê o licenciamento de obras como essa.
A decisão resultou da articulação das representações do Ministério Público Federal nos estados de Mato Grosso e Goiás com o Instituto Socioambiental, que enviaram petição à Justiça Federal do Mato Grosso, no âmbito da ação movida pela Comunidade Indígena Xavante contra a Hidrovia.
De acordo com a decisão judicial, a operação prevista para começar esta semana configura uma injustificada e inaceitável afronta às determinações do Poder Judiciário, uma vez que todas as decisões proferidas pelo Juízo de Mato Grosso e pelo Tribunal Regional Federal em Brasília convergem em um importante e fundamental aspecto: enquanto não devidamente licenciada, não pode ser realizada na autodenominada hidrovia Araguaia-Tocantins, qualquer espécie de obras, salvo a de sinalização, conforme já determinado pelo eg. TRF 1ª Região.
A partir desta premissa, não há outro motivo para a criação da estação de transferência a não ser viabilizar a navegação de grande porte, o que fatalmente, conforme já amplamente noticiado, daria início à estruturação das operações da Hidrovia, que sequer foi licenciada.
Por fim, o juiz Paulo César Alves Sodré, de Cuiabá, conclui que houve ao menos três desobediências a determinações judiciais: realização de obras na hidrovia sem autorização do juízo; implementação de navegação de grande porte, que por vias transversas significa a implantação de fato da hidrovia, desrespeitando a decisão do TRF (que permite apenas a navegação que já existia no rio); e omissão do Ibama enquanto órgão de fiscalização, por ter a responsabilidade de fiscalizar a hidrovia embargada.
O não cumprimento das determinações judiciais neste caso específico implica crime de desobediência (detenção de 15 dias a 6 meses, de acordo com o Código Penal), e crime ambiental (detenção de 1 a 3 anos, de acordo com a Lei de Crimes Ambientais).
A Araguaiana Navegação Fluvial, empresa responsável pela viagem frustrada, informou que pretende recorrer da decisão. Admite, no entanto, que não será desta vez que a carga será transportada. De acordo com a vice-presidente da empresa, Isabel Feitosa, em depoimento ao jornal O Popular, de Goiânia, o comboio volta vazio porque os produtores estão com receio de entregar a carga. A Cia. Docas do Pará pretende forçar a cassação da decisão junto ao TRF e o conseqüente embarque da carga.
Vale ressaltar que a Araguaiana Navegação Fluvial vem contando com a assessoria jurídica da Cia. Docas do Pará na elaboração de sua estratégia jurídica para recorrer, o que configura uma situação no mínimo inusitada: uma empresa privada recebendo assessoria jurídica de um órgão governamental para manter uma situação de ilegalidade.
É o resultado da política de fato consumado do Ministério dos Transportes: geração de insegurança nos produtores locais, diante de iniciativas temerárias como essa à revelia das leis e da Constituição. O episódio mostra mais uma vez, que não é na marra que a Hidrovia Araguaia-Tocantins será construída. O Ministério Público Federal, o Poder Judiciário, a sociedade civil organizada e os povos indígenas da região continuam a lutar por um processo que seja ético, transparente e participativo, que discuta o empreendimento do ponto de vista do licenciamento ambiental, com base em estudos realizados na região.
Não é valendo-se de estratagemas jurídicos e retóricos que o Poder Público – representado pela Cia. Docas do Pará, órgão governamental ligado ao Ministério dos Transportes – conseguirá viabilizar tal empreendimento.

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