VOLTAR

Juíza é ameaçada de morte em Embu

OESP, Metrópole, p. C3
21 de Mai de 2012

Juíza é ameaçada de morte em Embu
Para Barbara Carola Cardoso de Almeida, motivo pode ser a sentença que deu para desocupar Área de Proteção Ambiental invadida

WILLIAM CARDOSO

A juíza Barbara Carola Cardoso de Almeida, titular da 2.ª Vara de Embu das Artes, na Grande São Paulo, afirma ter recebido ameaça de morte por ter determinado a desocupação imediata de uma Área de Proteção Ambiental ocupada atualmente por 8 mil integrantes do Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto (MTST). A sentença, do dia 2, ainda impõe multa diária de R$ 50 mil ao grupo, em caso de descumprimento.
Apesar da decisão, 3.162 barracos seguem na área, formada por 433,8 mil m² de vegetação nativa. Famílias do Pinheirinho, de São José dos Campos, e da Favela do Moinho e de outros bairros da capital vivem por lá.
O terreno pertence à Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano (CDHU), que planeja erguer no local casas para 1,2 mil famílias. Mas há um empecilho. Em 2006, a Justiça determinou que nada poderia ser construído ao lado da mata, aceitando ação de ambientalistas. Seis anos depois, a juíza diz basear-se na legislação ambiental para pedir a desocupação. Na decisão, classifica a invasão como um "crime ambiental" que prejudica a Mata de Santa Tereza, com resquícios de Mata Atlântica. E cita o MTST como movimento "espúrio e ilegal", que desenvolve "atividade de guerrilha". A magistrada ainda relaciona a invasão a interesses políticos, ao dizer que "tais movimentos ocorrem com frequência endêmica" nos anos de eleição.
Polêmica. A posição causou polêmica. Na internet, integrantes de movimentos sociais dizem que a juíza tenta intimidar o grupo ao criminalizar a invasão e sugerem que a magistrada age de forma "parcial". A prefeitura, que diz ser favorável à luta digna por moradia, também se mostra contrária à postura da Justiça e à criminalização dos movimentos sociais. Para a juíza, a repercussão a respeito da sentença motivou as ameaças. Segundo ela, uma promotora, uma advogada e um ambientalista também são alvo.
Juízes saíram em sua defesa. "Lamentamos profundamente que, no exercício de atividade legítima, a colega tenha sido coagida por simplesmente cumprir o dever", diz manifesto assinado por Gustavo Fernandes, Maria Priscilla Oliveira e Daniela Leal. "Se a sentença não agradou a todos, é porque não é tarefa do magistrado se preocupar em agradar, mas em buscar o justo."
Em nota, a prefeitura de Embu afirma repudiar qualquer ameaça a servidores públicos. Já o MTST não quis se pronunciar. / COLABOROU ADRIANA FERRAZ

'É claro que fiquei preocupada. Mas isso não vai influenciar o meu trabalho'
Magistrada, que já foi ameaçada outras vezes, diz que cidadão depende de uma Justiça forte, 'senão vira Velho Oeste'

Entrevista: Barbara Carola Cardoso de Almeida

Há 18 anos no cargo, a juíza Barbara Carola Cardoso de Almeida enfrenta sua terceira ameaça de morte. Confessa ter ficado preocupada, mas garante que não mudará sua postura. Para ela, o cidadão precisa de uma Justiça forte, que não ceda a interesses diante de ameaças.
Como foi a ameaça? Foi ameaça de morte mesmo, a ponto de eu precisar de escolta policial. Tivemos de levar a sério, infelizmente.
De onde pode ter partido? Fica difícil acusar alguém. Tudo indica que tenha a ver com a sentença (que determinou saída imediata de área ambiental em Embu das Artes). Um inquérito está sendo aberto. Fiz boletim de ocorrência, até porque não só eu fui ameaçada. A advogada autora da ação e o líder dos ambientalistas também foram.
Como foi? Via Copom (Centro de Operações da Polícia Militar). A PM recebeu a denúncia, por meio de telefonema anônimo. Informavam que havia essa ameaça de morte contra mim. Houve recomendação da corporação para que eu tivesse uma segurança um pouco mais reforçada. Moro na cidade. O juiz fica um pouco exposto.

Já tinha sido ameaçada antes?

Já, umas duas vezes. Mas foram coisas espaçadas. Estou aqui há 18 anos. A gente lida muitas vezes com processos do crime organizado. Há muitos anos, a ameaça foi por um processo criminal. Eram assaltantes de banco. Foi velada, comentários de que 'matariam a juíza'. Mas não cheguei a precisar de escolta.

Como é a escolta?

No começo, eram viaturas normais da polícia. Mas até já dispensei, porque estão apurando o caso. Seja lá quem fez a ameaça já deve saber que a gente sabe. Olha o transtorno que isso causa: ter de deslocar um efetivo da Polícia Militar para fazer sua segurança. É complicado, cerceia sua vida.

A ameaça desta vez chegou a intimidar?

Não chegou a intimidar, mas é claro que fiquei preocupada. A gente não sabe se realmente vão fazer alguma coisa ou não. Mas isso não vai influenciar o meu trabalho. Não vou deixar de decidir 'x' ou 'y' por isso. Foi esse o intuito do manifesto (em apoio à juíza), dizer que o juiz tem de ter independência para julgar, não deve favor a ninguém, não precisa ceder a interesse de ninguém. Caso contrário, acaba o estado democrático de direito. O cidadão depende de uma Justiça forte, senão vira Velho Oeste.

OESP, 21/05/2012, Metrópole, p. C3

http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,juiza-e-ameacada-de-morte-e…
http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,e-claro-que-fiquei-preocupa…

As notícias aqui publicadas são pesquisadas diariamente em diferentes fontes e transcritas tal qual apresentadas em seu canal de origem. O Instituto Socioambiental não se responsabiliza pelas opiniões ou erros publicados nestes textos. Caso você encontre alguma inconsistência nas notícias, por favor, entre em contato diretamente com a fonte.