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Juiz decide suspender Belo Monte

O Liberal-Belém-PA
29 de Mar de 2006

Todos os procedimentos e audiências que antecedem a concessão de licença ambiental para a construção da usina no rio Xingu estão parados, em atendimento a liminar solicitada pelo Ministério Público Federal

Estão suspensos todos os procedimentos do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e das Centrais Elétricas do Norte do Brasil (Eletronorte) para a concessão de licenciamento de construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte, na região do Xingu. A decisão foi tomada ontem pelo juiz federal Antonio Carlos Almeida Campelo, que responde pela Subseção da Justiça Federal em Altamira, que concedeu no final da tarde medida liminar à ação civil pública ambiental ajuizada pelo Ministério Público Federal. A desobediência à decisão implicará em multa no valor de R$ 1 milhão, além da 'responsabilidade solidária dos administradores responsáveis pelo descumprimento, sem prejuízo da responsabilidade criminal'.

A decisão judicial impede inclusive a convocação de audiências públicas que já haviam sido marcadas para amanhã e depois. Nas audiências, que ocorreriam nos municípios de Altamira e Vitória do Xingu, seriam consultadas as comunidades de alguma forma afetadas pela construção da hidrelétrica, conforme determina o Decreto Legislativo no 788/2005. Além disso, a Eletronorte já solicitou ao Ibama a concessão de licença ambiental para a construção de Belo Monte, cujo processo encontra-se na fase de elaboração do Termo de Referência do Estudo de Impacto Ambiental.

Para interromper o processo de licenciamento da construção da usina, no Rio Xingu, município de Altamira, os procuradores Felício Pontes e Marco Antônio Almeida alegam que a construção da hidrelétrica atingirá várias comunidades indígenas, dentre as quais as tribos Arara, Juruna, Parakanã, Xikrin, Xipaia-kuruaia, Kayapó e Araweté, que poderão sofrer danos ambientais, se houver a implantação da usina.

Ressalta ainda o MPF que o processo legislativo que culminou com a promulgação do Decreto Legislativo no 788/2005 tem vícios de ordem material, uma vez que desrespeitou inclusive a obrigatoriedade de prévia consulta às comunidades afetadas, inclusive às indígenas.

Vício - Ainda segundo o Ministério Público, o processo legislativo também foi prejudicado por vício formal, uma vez que modificou projeto de decreto legislativo no Senado Federal sem o devido retorno para apreciação e votação pela Câmara dos Deputados. Além disso, inexiste lei complementar que dispõe sobre a forma de exploração dos recursos hídricos em área indígena, nos termos de dispositivos previstos na Constituição Federal.

Campelo considerou que o fundamento da demanda reside na necessidade de prévia consulta às comunidades indígenas, antes da edição de decreto legislativo que autorizou a exploração de recursos hídricos em áreas indígenas. A Constituição Federal de 1988, lembrou o juiz, determina que o aproveitamento de recursos hídricos, incluídos os potenciais energéticos, a pesquisa e a lavra em terras indígenas somente podem ser efetivados com autorização do Congresso Nacional, ouvidas as comunidades interessadas. 'Assim, parece-me razoável a interpretação de que a oitiva das comunidades indígenas interessadas deve ser anterior à autorização do Poder Legislativo', entende o magistrado.

Para Campelo, a intenção do constituinte foi a de que, quando houvesse possibilidade de exercício de atividades potencialmente prejudiciais ao meio ambiente em áreas ocupadas por índios, somente poderia ser autorizado, pelo Congresso Nacional, após prévia consulta às comunidades indígenas. 'A simples menção, no decreto legislativo, de que os estudos para implantação da Hidrelétrica de Belo Monte abrangerão estudo de natureza antropológica, atinentes às comunidades indígenas localizadas na área sob influência do empreendimento, não satisfaz à exigência constitucional prevista no art. 231, § 6.o, da CF. Para que servirá o estudo de natureza antropológica das comunidades indígenas se a instalação de empreendimento de alto custo ambiental, notadamente às comunidades indígenas, já foi autorizado às pressas - conforme expressa manifestação dos senadores Luiz Otávio e Heloísa Helena em notas taquigráficas - pelo Congresso Nacional? O senador Luiz Otávio, inclusive, registra que malsinado projeto, aprovado em tão-somente quatro dias, mereceria inserção no Guinness Book, o livros dos recordes', observa Campelo.

Impacto - O juiz observou ainda que, sobre a necessidade de retorno do projeto de decreto legislativo para a Câmara dos Deputados para aprovação, após alteração do projeto pelo Senado Federal, a Constituição Federal prevê esse procedimento, que não foi respeitado na elaboração do Decreto Legislativo no 788/2005.

Pelas dimensões da obra de construção de Belo Monte - submersão de aproximadamente 200 quilômetros quadrados -, Campelo considerou, 'em juízo preliminar, que o impacto ambiental será significativo, haja vista que a interrupção do curso do rio Xingu afetará a viabilidade de locomoção no mesmo, diminuirá a oferta de peixes - principal fonte alimentar das comunidades indígenas - facilitará a proliferação de doenças que, quiçá, podem culminar em processo de dizimação de comunidades indígenas, mudará o regime de vazões, a qualidade de água, a composição da fauna aquática, reduzirá a fertilidade natural das várzeas e aumentará a erosão das margens, não se justificando qualquer retardo para prestação jurisdicional neste momento. Ademais, no caso em exame não estão em salvaguarda apenas o meio ambiente e direitos de comunidades indígenas, mas também questões que refletem na sociedade, na economia e na cultura das populações envolvidas e principalmente das gerações futuras, que merecerem receber um meio ambiente ecologicamente equilibrado de seus antepassados.'

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