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Jardins lideram ranking de consumo de água entre bairros de São Paulo

OESP, Metrópole, p. C1, C3
03 de Jul de 2011

Jardins lideram ranking de consumo de água entre bairros de São Paulo

Renato Machado e Vitor Hugo Brandalise

Bairros com amplos jardins, áreas gramadas e repletas de árvores. Mansões de vários cômodos, com quadras de esporte e piscina. O sonho de muitos tem um preço alto e não apenas financeiro - atinge também o meio ambiente. Para satisfazer a esses desejos de consumo, os bairros nobres acabam sendo também os maiores consumidores de água na cidade de São Paulo. E, entre eles, a região do Jardins, na zona sul, é disparada a campeã.
A pedido do Estado, a Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp) elaborou um mapa das regiões que mais consomem água na capital - por média de domicílio. Os moradores dos Jardins gastam em média 21,7 mil litros por mês - 48,6% a mais que a média da cidade.
Isso não significa que os moradores do bairro desperdicem água, larguem torneiras abertas ou liguem o chuveiro cinco minutos antes de entrar no banho. São as próprias características do bairro que explicam o alto consumo. "É assim no mundo todo. Quanto maior o poder econômico, maior o consumo de água. Uma região da cidade onde casas têm quintal grande, com gramados, jardins e calçadas que precisam ser lavadas, além das piscinas, certamente vai gastar muito mais", explica Paulo Massato Yoshimoto, diretor da Região Metropolitana da Sabesp.
Moradores atribuem o consumo à quantidade de vegetação, mas reconhecem que há desperdício. "É um bairro verde, que exige água para a preservação na época de estiagem", diz o diretor executivo da Ame Jardins, João Maradei. "Mas desperdício preocupa e discutimos nas assembleias a rotina de gente lavando calçadas com máquinas a jato."
Outros bairros com características semelhantes também aparecem como líderes em consumo. Santo Amaro, na zona sul, e Butantã, na oeste, ocupam segundo e terceiro lugares na lista, com gastos respectivamente de 17,9 mil e 17,4 mil litros por domicílio. "Pessoas com alto padrão econômico consomem mais ao encher uma piscina, por exemplo. É água que não é desperdiçada e sim que será armazenada", diz a coordenadora da Rede das Águas da ONG SOS Mata Atlântica, Maria Luísa Borges Ribeiro. "E muitas vezes são os mais ricos que adotam formas de combater desperdício, até porque torneira sustentável é cara, não é acessível para todos."
Bom exemplo. Por outro lado, a região que menos gasta água é o Campo Limpo, com consumo médio de 13,6 mil litros mensais por domicílio. "Nos bairros da periferia, o consumo é menor porque as pessoas ficam menos tempo em casa. Trabalham longe, saem de manhã e voltam à noite", diz Massato. Itaim Paulista, na zona leste, também apresenta baixa média de consumo, com 12 mil litros por domicílio.

Área de Pinheiros é campeã de ''gatos'' e desperdício
39,4% da água da região se perde antes de chegar às casas. Fraudes em hidrômetros e vazamentos em tubulações são outros obstáculos

Renato Machado e Vitor Hugo Brandalise

Na região da Subprefeitura de Pinheiros, zona oeste da capital, 39,4% da água se perde antes de chegar às casas dos moradores. Seja por perdas físicas (27,6%), como vazamentos em canos, seja por perdas aparentes (11,8%) - as não faturadas pela Sabesp, como "gatos" (ligações clandestinas) e fraudes de hidrômetros. Tubulações das décadas de 1940 e 1950 e solo ácido, que ajuda a corroer os canos, também fazem com que a região seja a campeã de desperdício na cidade.
E, do ano passado pra cá, as coisas só pioraram: entre março de 2009 e março de 2010, o índice de perdas em Pinheiros foi de 31,1%. No mesmo período do ano seguinte, passou para 39,4%. Segundo a Sabesp, o crescimento foi causado por um problema "pontual" da empreiteira que fazia os reparos na rede. "Estavam atrasando o serviço, o que causou o aumento do problema", justifica o diretor da Região Metropolitana da Sabesp, Paulo Massato. "Também atrapalha o fato de que grandes reparos só podem ser feitos em conjunto com a Prefeitura, quando são feitas obras maiores nas vias."
Outra razão, segundo ele, foi o desligamento de 4 mil ramais causado por demolições para construção de prédios no bairro. E a expectativa é de que os vazamentos nesses locais só terminem após a finalização das construções e consequente regularização do serviço de água.
A maior parte das obras, segundo a Sabesp, é feita após reclamações dos moradores. Ainda assim, a água perdida na cidade muitas vezes vai diretamente para o subsolo - 65% do total, segundo a empresa.
Além de Pinheiros, fecharam com aumento de desperdício mais 16 das 31 subprefeituras. Chama a atenção, por exemplo, o caso da de Capela do Socorro, na zona sul da capital. Os índices de perdas físicas e aparentes dobraram em um ano, atingindo respectivamente 16,5% e 7,1%. Os principais problemas ali são os gatos, por causa das favelas e ocupações irregulares da área. A estrutura da região, com muitos morros e vales, facilita a ocorrência de problemas no sistema de encanamentos.
"É um sinal de alerta, porque a tendência dos outros anos vinha sendo de queda e agora a situação se reverte em alguns pontos. Também chama a atenção que os aumentos aconteçam nas regiões onde o índice já é alto", diz a consultora Marussia Whately.
A Casa Verde, na zona norte, é outra região que apresentou piora - o índice de perdas de água com vazamentos e outros problemas na tubulação passou de 32,6% para 37,6%. "Lá a tubulação é mais antiga ainda, uma verdadeira peneira. Está prevista nessa área intensa troca de ramais", promete Massato.
Os melhores. Dados da Região Metropolitana de São Paulo mostram, no entanto, uma tendência geral positiva, com desperdício caindo ano a ano. Os melhores exemplos vêm do Jabaquara, na zona sul, com perda de apenas 4,1%, e da Mooca, na leste, com 5,9%. Nas duas regiões, a instalação de válvulas reguladoras de pressão e o solo plano facilitaram a conservação dos tubos, segundo a Sabesp.
Ao longo deste ano, estão previstos R$ 412 milhões em investimentos para melhorar o abastecimento de água na Região Metropolitana. Até 2019, a Sabesp prevê investir R$ 4,3 bilhões em reparos na rede e melhorias no abastecimento. A empresa pretende ainda atingir índice de perdas abaixo de 13%.
Apesar da importância de conscientizar as pessoas em relação ao consumo consciente, a perda de água nas redes ainda é o grande problema a ser combatido. "Trabalhos de educação são importantes, porque ainda se desperdiça muita água de maneira desnecessária, na hora, por exemplo, de lavar louça e roupa. Mas é preciso pôr o dedo na ferida principal, que é a perda, que precisa de grandes investimentos para ser combatida", resume Maria Luísa Borges Ribeiro, da SOS Mata Atlântica.

Capitais brasileiras chegam a perder 76% da água

Renato Machado e Vitor Hugo Brandalise

O Brasil enfrenta graves problemas de distribuição de água nas cidades. Nenhuma de suas capitais apresenta índices de perdas inferior a 20% - o que seria considerado apenas razoável. Porto Velho (RO), por exemplo, perde 75,9% de toda a água que é distribuída para as residências, um reflexo da falta de investimentos em saneamento, perdendo o líquido em sua própria estrutura ou permitindo as ligações clandestinas de moradores das áreas mais pobres.
Esse não é um caso isolado. Outras 11 capitais perdem mais da metade da água que deveria abastecer as residências. A média brasileira é de 41,6% de perdas - as capitais que puxam um pouco o índice para baixo são Florianópolis e Goiânia, ambas com perdas de 25%.

Casa é adaptada para gastar menos
Biólogo do Butantã tem de cisterna a mictório

Vitor Hugo Brandalise
Pouco a pouco, o biólogo César Pegoraro, de 38 anos, melhorou a estrutura de sua casa, no Butantã, zona oeste da capital, sempre buscando consumir menos água.
Primeiro, transformou a antiga caixa d"água em cisterna no jardim. A cada chuva, guarda 800 litros, usados para regar a horta que plantou no quintal. A água também serve para lavar a calçada. Depois, trocou as cinco torneiras de casa: colocou um dispositivo que adiciona ar entre os jatos d"água. Assim, o consumo de água caiu a um terço dos de torneiras comuns.
E o "requinte" veio quando reformou o banheiro: construiu um mictório ao lado do vaso sanitário - o que diminuiu em 92% o gasto de água por descarga.
"A conta interessa menos. O melhor é o bom exemplo para os filhos, mesmo com atitudes tão simples", diz. São lições que João Pedro, de 6, recebe sem precisar sair de casa - no banheiro, a criança ganhou até banquinho, que usa para alcançar o mictório. "Na próxima reforma, vou instalar a cisterna no telhado e usar a água para lavar alguns tipos de roupa."

Em dez anos, consumo cai 14% na Grande São Paulo

Renato Machado e Vitor Hugo Brandalise

Apesar das ainda consideráveis perdas de água, o consumo na Região Metropolitana de São Paulo vem caindo nos últimos dez anos. A água consumida por domicílio na região diminuiu 14% entre 2001 e 2011 - foi de 17.080 litros por mês para 14.650 litros. Nos cálculos da Sabesp, isso representa economia suficiente para abastecer uma cidade de 2,9 milhões de habitantes, do porte de Salvador, ou de toda a região do ABC paulista.
A projeção feita pela Sabesp leva em conta os hábitos de consumo de hoje e de há dez anos, mas multiplicando-se os dois pela quantidade de domicílios atuais.
"É uma redução importante para a Região Metropolitana, área em que a oferta de água, pelas próprias características geográfica, fica em patamares críticos. Alivia o sistema todo", disse a diretora-presidente da Sabesp, Dilma Pena. "O combate a perdas tem de ser política contínua, sempre com novas tecnologias. É o que estamos fazendo."
Um dos motivos para a queda é que hoje em dia as famílias estão menores, com média de 3,2 ocupantes por residência, segundo dados do Censo 2010 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Mas a própria Sabesp, ambientalistas e consultores em saneamento dizem que existem outras razões que chegam a ser mais decisivas para a queda. Entre os pontos destacados estão equipamentos mais econômicos (avanço na tecnologia), redução nas perdas na rede, conscientização ambiental, com campanhas contra o desperdício, e educação ambiental.
Outros tempos. "Não precisa nem ser equipamento extremamente moderno. É só lembrar que muitas casas tinham aquelas descargas de cordinhas há dez anos, que despejavam uma quantidade imensa de água", diz Maria Luísa Borges Ribeiro, da SOS Mata Atlântica. Ela também ressalta que houve mudança de comportamento, principalmente em decorrência dos problemas de abastecimento de anos atrás, que levavam à adoção de rodízio de água. E as contas ficaram caras, o que pesou no bolso dos consumidores.

OESP, 03/07/2011, Metrópole, p. C1, C3

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