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Isolar soja transgenica vira desafio

OESP, Negocios, p.B16
14 de Jan de 2005

Isolar soja transgênica vira desafio
Aumento da produção de OGM torna mais cara a oferta de soja convencional
Agnaldo Brito
Com Dow Jones
O Brasil enfrentará problemas nos próximos anos para segregar a soja convencional da geneticamente modificada em razão da rápida expansão da produção de OGMs no País. Profissionais envolvidos em sistemas de certificação e análise de lotes de sojas alegam que o País não tem infra-estrutura logística e de armazenagem para criar espaços isolados para guardar as duas categorias de produto.
"Já existe uma dificuldade neste momento, mas esta tende a aumentar muito com a expansão do plantio de soja transgênica, que dão mostras de avançar cada vez mais", alerta Johnny Drescher, diretor comercial da Schutter do Brasil, empresa holandesa que se fixou no País em 2000 para monitorar embarques de soja para a Europa e principalmente participar da organização de cadeias de soja livres de OGMs. "Existe um mercado de soja transgênica e outro de soja convencional. É fundamental o País conseguir manter este segundo", diz.
A questão se tornou mais complexa, dado o volume de transgênicos que ano-a-ano são colhidos nas lavouras brasileiras. Isso tem posto à prova estruturas de segregação feitas de forma amadora. Segundo Pablo Molloy, gerente-geral da GeneScan, laboratório alemão que mantém uma estrutura de análise de OGMs no Brasil, localizado na cidade de Itu, interior de São Paulo, muitas empresas que negociam soja convencional começam a ser surpreendidas com resultados positivos de seus lotes.
"Tem crescido muito esta situação. A empresa tem acordos comerciais para recebimento de produto não-geneticamente modificado e ao fazerem os testes constatam que possuem uma carga transgênica. A reação é sempre de surpresa", diz Molloy. Diante desta situação, tem crescido o número de análises quantitativas, que tentam mensurar o porcentual de OGMs num lote. A "contaminação involuntária", considerada por compradores internacionais ou por indústrias de alimento, admite volume máximo 1% da carga de transgênicos num lote no Brasil e de 0,9% na Europa. Acima disso, o lote requer rotulagem. "Pegamos casos em que 98% do lote era de soja transgênica e a empresa não sabia", diz.
Molloy explica que tem sido muito comum a contaminação em caminhões, esteiras de transporte ou em silos usados para os dois produtos. "A infra-estrutura que o Brasil dispõe hoje praticamente suporta o volume de produção do País, mas não foi projetado para separações", diz Drescher. A situação levará inevitavelmente, avalia, a uma elevação dos prêmios pagos aos participantes de cadeias de produção que assegurarem oferta livre de OGM. "Um prêmio razoável chega a US$ 5 por tonelada. Este valor pode ser maior ou menor conforme o nível de segurança agregado à cadeia", afirma. Sistemas com rastreabilidade que observa a cadeia do plantio até o embarque tendem a inflacionar esse prêmio.
É o caso da Coamo Agroindústria Cooperativa, do Paraná. A empresa decidiu concentrar a comercialização no mercado de soja convencional. Congrega 18 mil produtos do Paraná, Santa Catarina e Mato Grosso do Sul e criou um sistema de monitoramento para evitar contaminação de soja transgênica. A medida deu resultado. Segundo Drescher, acaba de receber do Carrefour o aval para se tornar fornecedora mundial de farelo de soja para uso como ração. "Os fornecedores de itens para a linha de produtos da rede receberão a recomendação para comprarem o insumo de empresas que asseguram a produção de soja não transgênica", explica Drescher.
Franca expansão
A criação de cadeias de produção e comercialização de soja não transgênica é de fato um desafio diante do crescimento da produção de soja transgênica. Um estudo divulgado pela entidade Serviço Internacional para Aquisição de Agrobiotecnologia Aplicada (ISAAA) demonstra que o Brasil cultivou 5 milhões de hectares de soja transgênica em 2004 em relação ao ano anterior.
O aumento chegou a 66%, um dos maiores entre os países em desenvolvimento. Expansão surpreendente para o curto tempo em que o Brasil decidiu liberar o plantio mediante medidas provisórias. Segundo o estudo, o País responde agora por 6% do total global de produção de transgênicos, estimativa conservadora, embora um aumento expressivo seja esperado em 2005, em função da maior adoção desta tecnologia e do crescimento da área cultivada com soja no Brasil.
EUA lideram
No mundo, o total de área plantada com alimentos transgênicos atingiu 81 milhões de hectares em 2004, aumento de 20% em relação ao ano anterior. Os dados foram apresentados no mesmo estudo que avaliou a situação brasileira. O presidente e fundador da ISAAA, Clive James, disse que embora os Estados Unidos ainda sejam o país com maior área de transgênicos, os países em desenvolvimento mostram ritmo mais acelerado de implantação da tecnologia de transgênicos. Ele destaca que o número de países que mais cultivam plantas geneticamente modificadas (com áreas acima de 50 mil hectares) aumentou de 10 para 14, em 2004, com a inclusão do Paraguai, do México, da Espanha e das Filipinas.
O número de nações que respondem pela maior parte da plantação global de transgênicos cresceu de cinco para oito e inclui Estados Unidos (59% do total global), Argentina (20%), Canadá (6%), Brasil (6%), China (5%), Paraguai (2%), Índia (1%) e África do Sul (1%).

OESP, 14/01/2005, p. B16

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