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Investidas históricas contra o Código Florestal Brasileiro

Amazônia.org
19 de Nov de 2009

Investidas históricas contra o Código Florestal Brasileiro

Aldrey Riechel

Criado em 1965, o Código Florestal vem sendo objeto de polêmica entre ambientalistas, que defendem a conservação dos biomas brasileiros, e ruralistas, que visam o uso da terra para produção agropecuária.
Diversas tentativas e mudanças reais para uma flexibilização da norma vem acontecendo durante esses quase 15 anos. Nesta semana organizações elaboraram uma carta criticando as propostas de mudanças e entregaram ao ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, contra o ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes. A alegação do documento foi a de que este ministro estaria tentando modificar o Código Florestal por meio de uma Medida Provisória (MP), que pode ser publica nos próximos dias. Os movimentos pediram providências e escrevem que "mais um remendo no Código Florestal não é a solução".
A polêmica que contempla o Código Florestal vem de encontro aos debates mundiais sobre ações para combater a mudança climática, às vésperas da realização da Conferência Nacional do Clima (COP-15) que será realizada em Copenhague. Na ocasião espera-se que líderes mundiais se comprometam com metas para reduzir a emissão de gases de efeito estufa e dessa forma minimizar os impactos do aquecimento global. Ambientalistas temem que ao "afrouxar" a legislação nesse momento o País pode sair prejudicado.
Apesar disso as mudanças já começaram a sair do papel. Os ruralistas apresentaram uma nova versão do projeto de anistia aos desmatadores e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva deve anunciar o adiamento do decreto de crimes ambientais para junho de 2011. Nilo D'Ávila, coordenador da campanha do Greenpeace acredita que se era tempo que os produtores precisavam para se adequar, isso foi dado, "mas eles querem mudar a legislação, eles acreditam que a legislação engessa o Brasil. Então pra essa parte da Bancada Ruralista não tem remédio".
Processo polêmico
Propostas para mudança da norma (ou total substituição dela) vem sendo apresentadas no Congresso. Como uma tentativa de avançar nos debates sobre o Código Florestal foi criado, em 2008, um Grupo de Trabalho formado pelos ministérios da Agricultura (Mapa), do Meio Ambiente (MMA), do Desenvolvimento Agrário (MDA) e representantes dos movimentos sociais ambientalistas.
Diante da falta de consenso entre as partes, o ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes extinguiu, em janeiro deste ano, o grupo de trabalho criado para discutir o código. A extinção do GT foi motivo de rusgas entre Stephanes e Carlos Minc, ministro do MMA.
No mês seguinte, a comissão Coordenadora do Zoneamento Ecológico-Econômico do Território Nacional, composta por 13 ministérios, mudou um ponto do código sobre reflorestamento obrigatório no entorno da BR-163, que liga Santarém a Cuiabá, e da BR-230, a Rodovia Transamazônica e de outras rodovias próximas, aprovando a redução de 80% para 50% da área de Reserva Legal mínima obrigatória. Com a nova regra, estima-se que cerca de 700 mil hectares de floresta deixarão de ser recompostos com árvores nativas da Amazônia.
Em março, Stephanes voltou a propor novas mudanças na norma. Entre elas está a que prevê a permissão para manter atividades em Áreas de Preservação Permanente (APPs), como várzeas, matas ciliares, encostas e topos de morros, desde que já tenham atividade produtiva consolidada e que técnicas agrícolas de conservação sejam adotadas. Outro ponto abordado é a garantia de que produtores não sejam penalizados por atos que passam a ser considerados como infrações.
A ala ambientalista também sofreu outro revés durante o processo para a reformulação do Código Florestal: a presidência e a relatoria dessa comissão da Câmara que analisa a norma estão nas mãos de Moacir Micheletto (PMDB/PR) e Aldo Rebelo (PcdoB-SP), respectivamente.
Moacir Micheletto ganhou o prêmio "Motosserra de Ouro" do Greenpeace por seu empenho ao tentar aprovar um projeto de lei que pretendia reduzir para 25% a Reserva Legal de propriedades rurais na Amazônia. Aldo Rebelo, por sua vez, recebeu o título de Inimigo da Amazônia por acreditar que Terras Indígenas são um atraso para o País.
Diante deste contexto, mais de duas mil organizações da sociedade civil, movimentos e ambientalistas vem protestando contra a flexibilização do código, meta pretendida pelos ruralistas. Em 31 de julho deste ano, os manifestantes protocolaram um documento, endereçado ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmando defendendo do Código.
Mudando as regras do jogo
Um dos grandes impasses diz respeito à diminuição do percentual de terras que devem ser destinadas à reserva legal. Na Amazônia, ambientalistas defendem a restrição do desmatamento e exigência de manutenção de 80% de floresta preservada, como está no código atualmente. A bancada ruralista apresentou diversas propostas, mas pretendem que esse percentual seja diminuído para 50% no bioma. O Projeto de Lei 6424 é conhecido como "Floresta Zero".
Quando foi proposta, a exigência de Reserva Legal foi fixada em 50% da propriedade, mas teve que ser ampliada por causa do aumento do desmatamento. Com isso muitos produtores alegam que começaram a produzir na Amazônia, a área de Reserva Legal foi fixada inicialmente em 50% da propriedade, mas logo depois, com o aumento do desmatamento, foi elevada para 80% das terras.
A grande questão, avaliada por especialistas, é que o processo de exploração agropecuária já havia começado antes da fixação desses percentuais. Diante disso, muitos produtores alegam que suas áreas produtivas já ocupam quase a totalidade da área das propriedades. De acordo com eles, a obstrução de parte da área para recuperar a Reserva Legal desmatada no passado significaria reduzir consideravelmente a produção no campo.
Com o novo texto apresentado, os ruralistas pretendem anistiar os desmatadores até 2001, cedendo neste ponto que previa até 2006. Por outro lado, esperam que sejam retirados a delegação de poderes aos Estados em questões ambientais, permissão para recomposição de até 30% das Áreas de Preservação Permanentes (APPs) na Amazônia com espécies exóticas, mas sem possibilidade de corte raso dessa vegetação, e a possibilidade de comprar áreas de até 30% de reserva legal na Amazônia para conservação. Na lista de proposta também consta que as áreas de APPs sejam somadas como reservas legais. Atualmente as áreas de topos de morros e encostas de morros.
Quem está no jogo?
Para Raul do Valle, coordenador do Programa de Política e Direito Socioambiental do Instituto Socioambiental (ISA), o debate não será esquecido pelos ruralistas. Segundo ele, esses políticos não estão interessados em propostas que visem o melhoramento das leis ambientais já existentes e sim na modificação da lei para que o que é ilegal vire legal.
"Isso é um jogo político dos ruralistas, que não é um jogo às claras. Percebe-se que não há boa-fé na discussão pública deles, têm várias janelas abertas e eles vão trabalhando nessas janelas concomitantemente, e aquela que avançar mais, eles dão um peso maior em detrimento das negociações, acordos eventualmente feitos nos outros", explica o ambientalista.
A Bancada ruralista são políticos dos poderes legislativos federal, estaduais e municipais que realizam ações unificadas independentemente do partido político que pertençam. Os mais ativos nos debates sobre o Código Florestal são: a presidente da CNA (Confederação Nacional da Agricultura), senadora Kátia Abreu (DEM-TO), Moacir Micheletto (PMDB-PR), Valdir Colatto (PMDB-SC), Marcos Montes (DEM-MG), Giovanni Queiroz (PDT-PA), Mozarildo Cavalcanti (PTB-RR) e Homero Pereira (PPS/MT).
"Os ruralistas não são maiorias no Congresso, isso que é incrível. Eles não são a maioria, são a minoria! Eles não são nem 20% da Câmara dos Deputados, mas são bem organizados e uma grande massa de outros deputados que não tem nada a ver com eles, mas acabam votando porque ou estão mal informados ou possuem acordos políticos bobos", explica Valle sobre a atuação da bancada no Congresso.
O ministro da Agricultura defende abertamente aos interesses da bancada ruralistas, enquanto isso, Carlos Minc, tenta facilitar os debates e alega que mudanças no Código não representam flexibilização das normas ambientais. Minc já confirmou que o decreto de crimes ambientais, que estava previsto para entrar em vigor no dia 11 de dezembro, será adiado. Apesar do anúncio, o ministro garantiu que não haverá relaxamento das normas. Será?
Enquanto isso, o outro lado da discussão, as organizações não governamentais e representantes dentro do Congresso como a senadora Marina Silva (PV-AC) lutam para que o meio ambiente será respeitado.
O ambientalista Mario Menezes escreve em um artigo sobre o tema que "Nesse diapasão, estamos criando uma Federação com duas categorias de entes federados: os que produzem e os que preservam, quando deveríamos ter os que produzem preservando e os que preservam produzindo, num país sustentavelmente único".

Amazônia.org., 19/11/2009

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