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Índios Waiãpi denunciam Funasa e governo por abandono e maus-tratos

Folha do Amapá-Macapá-AP
Autor: Araciara Macedo
11 de Mar de 2005

Os índios Waiãpi estão acusando a Fundação Nacional de Saúde (Funasa) e o Governo do Estado de estarem submetendo não somente eles, como todas as outras etnias, a abandono, tratamento desumano e maus-tratos.

Eles cobram a conclusão da obra da Casa do Índio que se arrasta há quase dois anos e está parada, de acordo com a Funasa, por irregularidades cometidas pelo Governo do Estado, que mexeu no projeto original e alterou o valor de R$ 540 mil para R$ 810 mil. Segundo a instituição, o Estado também não cumpriu os prazos. O governo tenta se defender e garante que a Casa do Índio está sendo tocada. No entanto, a reportagem foi até o local e comprovou que a obra está parada, trancada a cadeados e faltando todos os acabamentos. A construção da Casa do Índio começou em maio de 2003 e teria de ficar pronta em agosto do mesmo ano: - Eu chamei vocês para pedir ajuda. Estamos com problemas sérios. Queremos que o povo amapaense tenha conhecimento do descaso com o qual a comunidade indígena vem sendo tratada nos últimos anos. Queremos que os governantes do Amapá se sensibilizem e nos ajudem - declarou o professor Aykyre Waiãpi. Aykyre contou que o principal problema é com o alojamento onde ficam os índios que precisam vir ao município de Macapá para tratamento de saúde. Os três locais que servem de abrigo não oferecem a mínima estrutura e são jogados ao abandono de abrigos sujos e inadequados à cultura deles. Na casa localizada no Bairro Pacoval, por exemplo, os índios dividem o espaço com ratos, baratas, moscas e carapanãs. A demora no atendimento de saúde leva meses e com isso acabam contraindo outras doenças e a preocupação do líder Waiãpi é que seus parentes morram pelo abandono e maus-tratos: - Vocês podem fotografar para mostrar ao público como a gente está vivendo. Não somos animais e merecemos um tratamento melhor. Queremos que o governador veja a nossa situação e nos entregue a Casai que está sendo construída desde 2003 e até agora ninguém nos informa nada. Se o governador mandar terminar a construção vai resolver os nossos problemas porque a Casai tem estrutura apropriada para a realidade do índio. Os índios vêm pra cá em busca de tratamento, só que quando chegam aqui os problemas que enfrentam são bem maiores. Tem índio que vem para fazer um exame na vista, como é o meu caso, e aqui pega outros tipos de doença - aponta.

Abrigos inadequados - Segundo Aykyre, já ficaram mais de três dias sem água e pelo fato das casas não serem adequadas aos costumes indígenas e serem muito quentes, todos eles contraíram gripe e estão doentes: - Estamos convivendo com a sujeira, com as moscas e ratos porque não podemos limpar - falava o professor enquanto caminhava entre o amontoado de redes e pessoas espalhadas pela casa localizada no Bairro do Trem: - Aquela índia ali é a Karota, a mais velha da tribo. Tem aproximadamente 100 anos, ninguém sabe ao certo porque ninguém viu ela nascer. Karota está aqui porque quebrou a cabeça do fêmur, está fazendo tratamento médico, mas não está sendo medicada - disse Aykyre enquanto apontava uma velha índia sentada em uma cadeira de rodas.

Casa do Índio parada por irregularidades

A Casa de Apoio à Saúde do Índio está sendo construída no Bairro Alvorada, através de um convênio no valor de R$ 660 mil, celebrado entre a Fundação Nacional de Saúde e a Secretaria de Saúde do Estado. A obra foi iniciada em maio de 2003 e deveria levar 150 dias para ficar pronta. Ana Dalva, chefe da Divisão do Distrito Sanitário Especial Indígena da Funasa, diz que foram repassados R$ 529 mil para a construção da Casai. O governo entrou com uma contrapartida de R$ 10 mil e depois com um aditivo de R$ 120 mil, no total são R$ 660 mil. O último relatório da Funasa aponta que 70% da obra estão executados, mas há irregularidades na execução. O engenheiro Carlos Augusto, responsável pelo relatório, explicou que o valor do convênio daria para concluir a Casai: - O que aconteceu foi que a Funasa celebrou o convênio com a Secretaria de Saúde. Por questões que não sabemos explicar a execução ficou com a Secretaria de Infra-Estrutura. O problema maior que detectamos na Casai foi que deram prioridade para outras partes da obra, inclusive partes que não estavam no projeto original, como é o caso do almoxarifado e do estacionamento, e não priorizaram o mais necessário - explica o engenheiro. Carlos Augusto diz ainda que a Funasa já tentou, por diversas vezes, obter informações junto ao Governo do Estado sobre a paralisação da obra e todas as vezes a promessa é de que a mesma será concluída. Todavia, a obra continua parada: - A coordenadora da Funasa no Amapá já esteve com o governador e com o secretário de Saúde, por diversas vezes, e recebeu a promessa de que a obra seria concluída, mas até agora nada. Nós estamos tentando obter recursos em Brasília para finalizar a obra - ressalta Carlos Augusto. Na Seinf, o chefe da Divisão de Fiscalização, Manuel de Souza Carvalho, afirma que as obras já foram retomadas: - Essa obra era para ter sido finalizada em agosto de 2003. A partir daí o projeto sofreu algumas modificações e a construção atrasou, mas nós já notificamos a empresa Maquete Engenharia para que finalize e entregue a obra. A empresa já retornou para o canteiro de obras e em breve a Casai estará sendo entregue - garantiu. A Folha foi até ao canteiro de obras, que está parado e trancado a cadeados. Edielson Santos, irmão do vigia da obra, informou que a empresa ainda não retomou a construção. No relatório apresentado por Manuel Carvalho consta que, depois do último termo aditivo o valor da obra subiu para R$ 810.476 e o prazo para a entrega, que no início era de 150 dias, subiu para 420 dias, a contar de 26 de maio de 2004, data do último aditivo.

Diretora da Funasa nega as acusações

Com relação ao tratamento que os índios vêm recebendo, Ana Dalva nega os maus-tratos denunciados pelos Waiãpi e afirma que as informações prestadas por Aykyre não estão corretas. Segundo ela, quando os índios vêm para o município de Macapá, geralmente vêm para tratar mais de uma doença, por isso demoram a retornar para a tribo: - O DSEI é o responsável pelo transporte do índio doente, da aldeia até o município de Macapá. Aqui eles recebem tratamento na rede pública de saúde. Como vocês sabem, a saúde no Amapá vem passando por diversos problemas e o índio também é afetado. Quando o problema de saúde exige providências mais urgentes nós vamos para a rede particular. Isso é possível porque a Funasa mantém um convênio com a Apina, que é uma ONG que nos dá suporte. Na Casai eles recebem acompanhamento de enfermeiros da Funasa, não tenho notícias de maus-tratos de qualquer espécie - afirma Ana Dalva. Ana Dalva afirma também que Aykyre está em Macapá acompanhando a esposa que está fazendo pré-natal e que não sabia que aqui o professor havia contraído dengue: - Eu sei que o lugar onde os índios estão alojados não é adequado, esse é um problema que estamos tentando resolver. É bom que se diga que o índio, quando vem para tratamento de saúde, traz a família inteira, por conta disso o espaço na casa fica pequeno, sem falar que a grande quantidade de pessoas acaba gerando mais problemas e a sujeira é um deles. A índia Karota que Aykyre afirma que quebrou a cabeça do fêmur está, na realidade, com problemas de saúde relacionados à idade dela. Karota não pode andar porque sofre de reumatismo crônico, mas está sendo medicada.

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