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Índios retomam área 30 anos depois

A Tarde-Salvador-BA
Autor: Letícia Belém
16 de Mai de 2003

Terra ocupada é hoje um Parque Nacional, com espécies ameaçadas de extinção, como a onça pintada e a anta

Trinta famílias de índios pataxós, que na década de 70 foram expulsas de suas terras por funcionários da empresa madeireira Brasil-Holanda, retomaram o local onde hoje é o Parque Nacional do Descobrimento, no município do Prado, a 812 km de Salvador. Há quatro anos, o governo federal, por meio do Ibama, comprou a propriedade de 21.129 hectares da madeireira, que ocupa 50% do município do Prado, e transformou-a em parque para preservar um dos últimos remanescentes de Mata Atlântica do País.

O Parque do Descobrimento, reconhecido pela Unesco como sítio do patrimônio mundial natural, é a maior unidade de conservação da Mata Atlântica do Nordeste do País e tem o endemismo como sua característica principal. "Existem várias espécies ameaçadas de extinção que só ocorrem aqui em todo o mundo, como a anta, a onça pintada, a parda e a negra, e árvores como o jacarandá, a arruda e a braúna. Toda a área que tinha sido degradada está se regenerando sozinha de forma surpreendente", informou o biólogo e coordenador de fiscalização do Parque, Luiz Fernando Guimarães Brutto.

Desde que foram expulsas do local, as famílias indígenas não possuem um local para viver e montar sua aldeia. "Eu estou há 33 anos morando nas ruas, mendigando. Já chega de sofrer. Daqui eu não saio e se na Bahia não tem Justiça, eu vou mudar para outro mundo. Será que o governo vai deixar a gente sofrer desse jeito?", desabafou a índia Siriá, Romilda Pereira Pires. Segundo ela, que é a índia mais velha da tribo, havia um homem chamado Duarte, da Brasil-Holanda, que passava nas casas todos os dias pedindo para eles desocuparem, até que um dia expulsou a todos e ateou fogo nas casas e nas plantações. "Queimou tudo, perdi minhas máquinas, plantação de café, mandioca. Os documentos da minha terra estão na Funai, eu não aceito eles fazerem disso aqui um parque porque isso aqui tudo é meu", reclamou.

O índio Patiguri, José Pereira da Conceição, avisou que enquanto a Justiça não decidir, eles vão permanecer na terra. "Não queremos dinheiro e nem outra propriedade. Queremos ficar onde sempre foi nosso. O governo vai consentir matar a nação indígena para fazer parque? Eu vou ficar aqui, não tenho medo não".

JUSTIÇA FEDERAL - A gerência do Ibama de Salvador já havia entrado com uma ação de interdito proibitório na Justiça Federal de Ilhéus para impedir que as famílias entrassem no Parque. "Comunicamos as ameaças dos índios às instâncias superiores do Ibama porque temos a responsabilidade de zelar pelo Parque e não poderíamos ser negligentes em relação ao patrimônio", informou Brutto. Agora o Ibama está em procedimentos para ajuizar uma ação de reintegração de posse.

A Funai encomendou um estudo para verificação de terras indígenas nas áreas do Parque Nacional do Descobrimento à antropóloga Maria do Rosário, que prometeu conclui-lo até o final do mês. "Se for constatado que as terras são realmente indígenas, a Funai terá como assentá-los dentro do Parque".

Há um mês, quando eles ocuparam áreas próximas ao parque pela primeira vez, o cacique Gentil Conceição de Brito reuniu-se com o administrador da Funai de Eunápolis, Valdir Mesquita, o chefe do Parque, Benevaldo Nunes e o coordenador da fiscalização do Ibama, Fernando Brutto, onde foi feito um acordo pacífico entre as partes. Os índios concordaram em sair da área chamada Alegria Nova com a condição de a Funai adquirir uma outra propriedade de 16 hectares. A Funai já tinha negociado o recurso para comprar a terra, mas os índios não agüentaram esperar, entraram

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