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Índios querem mais recursos para trabalhar

Jornal do Commercio-Manaus-AM
Autor: Margarida Galvão
12 de Set de 2002

A introdução de uma cultura empreendedora nos povos indígenas, da forma capitalista como defende o branco, ainda está longe de acontecer. O poder para este povo continua atrelado basicamente ao território, que tem sido a grande bandeira de luta. Sua relação com a terra é tão forte que chega a ser um valor simbólico, porque é onde enterrou seus antepassados, onde vivem os animais, enfim, onde está sua vida.

Pesquisadores e representantes de associações indígenas afirmam que enquanto a terra para o homem branco é vista como um meio de produção para angariar recursos financeiros, o índio produz para se alimentar, inclusive a produção se torna um projeto de compartilhamento de tudo o que é vendido.

O pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), Hiroshi Noda, que trabalha com melhoramento genético de plantas e conservação de recursos genéticos vegetais, além de atuar com comunidades indígenas e ribeirinhas, no Alto Solimões, envolvendo os municípios de Benjamin Constant, Atalaia do Norte e São Paulo de Olivença, disse que o índio ainda não conseguiu expressar o que realmente quer, porque sempre tem a figura do branco no meio.

"Se percebe isso nos encontros promovidos com os índios, enfocando questões ambientais, desenvolvimento sustentável, onde no final dos trabalhos fica sempre aquela interrogação se as propostas lançadas realmente são uma aspiração dos índios ou do branco", menciona, acrescentando que foi esta a sensação obtida no final dos trabalhos da 1ª. Conferência dos Pajés, promovida na semana passada pelo governo do Estado.

Significado cultural é outro

O pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), Hiroshi Noda, disse que a busca por recursos naturais na verdade é mais uma cobiça do branco, porque o índio até agora tem trabalhado na questão da demarcação de seu território, porque a terra tem um significado cultural para ele, que vai além de um fator de produção. "Então tudo isto tem que ser avaliado quando se fazem propostas", avalia.

Ainda, de acordo com o pesquisador, o índio não está preocupado em angariar bens porque a economia deles não é capitalista, é regida mais pela reciprocidade. "Eles, na verdade, plantam para se alimentar, inclusive a produção se torna um projeto de compartilhamento de tudo o que é vendido, seja na agricultura ou no artesanato", avalia.
Noda disse que toda comunidade tem uma estrutura de comando. A do índio é exercida por chefes de tribos, pajés, o que simboliza poder, mas que não chega a ser comparado com o branco que usa o poder para os próprios interesses.

O pesquisador Hiroshi Noda informa que o trabalho desenvolvido com comunidades do Alto Solimões, num total de 1.600 pessoas entre indígenas e ribeirinhos, é financiado uma parte pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico e outra pelo Inpa, com recursos do Tesouro Nacional.

É um programa piloto, cujo foco é trabalhar com organização de comunidades rurais que trabalham com agricultura familiar de subsistência, focalizando diversos componentes, entre os quais produção de alimentos, produção sustentável e auto-suficiente (segurança alimentar), sistema de policultivo, pesca artesanal, extrativismo (fibras, óleos vegetais como copaíba, andiroba).

O trabalho envolve ainda a parte de energia solar, inclusive com a compra de equipamentos que são deixados nas próprias comunidades. "Foram treinados para usar os equipamentos", informa Noda.

Produção esbarra nos bancos

O presidente da Associação Yakinó, Bonifácio José Banina, disse que a maior dificuldade dos índios que trabalham com artesanato no Amazonas é com relação a liberação de financiamentos.

Ele informa que já recorreu ao financiamento do Banco da Amazônia (Basa), cujas exigências passam pela posse de terra, capital, patrimônio, empresas.
"É claro que o índio no geral não tem nada disso, mas tem muita disposição e criatividade para trabalhar", assegura.

Na opinião de Banina, o índio ainda é muito discriminado no que tange a receber ajuda financeira porque não é visto como cidadão.

"A prova é que não existe nenhuma linha de financiamento para a categoria", garante.
Criada em março de 2002 a Associação Yakinó, trabalha com artesanato indígena de 32 etnias com 5 mil peças, que são vendidas na sede da entidade, situada na rua Bernardo Ramos, 160, Centro.

Toda a produção é de organizações indígenas de São Gabriel da Cachoeira, Barcelos, Tabatinga, Benjamin Constant, Atalaia do Norte, região do Alto Madeira.
A entidade programa desenvolver vários projetos na área de agricultura. No momento estão desenvolvendo um projeto de babaçu, em Autazes, na base da agricultura familiar.

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