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Índios ocupam fazenda em Olivença

A Tarde-Salvador-BA
Autor: Luiz Conceição
21 de Fev de 2006

Cacique Valdelice disse que se trata de um protesto contra a morosidade do governo federal em demarcar área reivindicada

Cerca de 200 índios tupinambás de Olivença retomaram a Fazenda Limoeiro, de cerca de 700 hectares, propriedade supostamente de um português residente em Lisboa. A área fica a cerca de 40 km de Olivença, distrito de Ilhéus, em um local de difícil acesso, pela precariedade das estradas rurais. A situação até a tarde de ontem, estava tranqüila, já que não houve resistência do fazendeiro e das famílias de trabalhadores que se encontravam no local.

Os indígenas estariam cansados de esperar pela morosidade da Funai (Fundação Nacional do Índio), que constituiu um grupo técnico para levantar a área de 42 mil hectares reivindicada pelos tupinambás, como seu território. Os trabalhos ficaram a cargo dos antropólogos Suzana Viegas e Jorge de Paula que deveriam ter produzido o relatório a ser entregue, em outubro de 2005, à Funai, em Brasília. Já foram feitas diversas visitas à capital federal pelos tupinambás para a conclusão e a devolução do relatório, sem sucesso.

A Fazenda Limoeiro produz cacau e seringa e já foi alvo de ocupação anterior por trabalhadores rurais sem-terra, mas o Incra não a desapropriou pelo fato de ter sido externada a reivindicação dos índios e da Funai em relação àquelas terras. Os tupinambás, no sul da Bahia, eram conhecidos como "caboclos de Olivença", até a década de 90, quando reiniciaram a luta pelo reconhecimento étnico, cultural e territorial.

SOBREVIVÊNCIA - Em 2000, foram recepcionados na Conferência Indígena, em Coroa Vermelha, o que lhes deu animação para a luta reivindicatória. Atualmente, os cerca de três mil tupinambás de Olivença vivem em pequenas glebas de terra nos municípios de Ilhéus, Una e Buerarema. Para sobreviver, trabalham para os fazendeiros de cacau, seringa, piaçava e gado e em pequenos serviços nas periferias das cidades de Ilhéus e Una, em troca de diárias.

As comunidades tupinambás estão divididas em três regiões: os Acuípes, onde o cacique é Alício Amaral; Olivença, tendo como cacique Valdelice Amaral, e na Serra do Padeiro, onde o cacique se chama Rosivaldo Ferreira da Silva, Babau. Os tupinambás participam ativamente do Movimento Indígena Regional lutando por terra, políticas públicas diferenciadas e pela garantia dos direitos indígenas em geral.

Recentemente conquistaram o direito às equipes de Programa de Saúde da Família Indígena (PSFI), depois de protesto em que ocuparam a Prefeitura de Una. É que os tupinambás da Serra do Padeiro, entre Uma e Buerarema, temia pela vida de gente de sua comunidade que sofre um surto endêmico de catapora, apesar de a Fundação Nacional de Saúde (Funasa) ter repassado cerca de R$ 150 mil, que ficaram retidos nas duas prefeituras, só sendo liberados há 15 dias, após o protesto.

A cacique Valdelice Amaral visitou o escritório da Funai em Ilhéus onde confirmou que a ocupação da Fazenda Limoeiro é realmente um protesto contra a morosidade do governo federal em demarcar a reserva reivindicada por sua comunidade. Ela disse que se reuniu em Ilhéus com o diretor de Assuntos Fundiários da Funai, Artur Nobre Mendes, quando reiterou o pedido de demarcação da reserva. Teria recebido como resposta a negativa do diretor do DAF (Funai) sobre o processo demarcatório. A reunião se deu no começo deste mês quando Nobre participou em Ilhéus de um encontro entre fazendeiros e ínidos sobre a questão pataxó na Delegacia da Polícia Federal, em Ilhéus.

Obras da escola indígena na reta final

Os curumins das comunidades tupinambás de Olivença, em Ilhéus, estão ansiosos pela conclusão das obras de construção do prédio escolar, na zona de Sapucaeira, o que deve acontecer até final de março. Atualmente, as crianças e adolescentes indígenas estudam, da pré-
escola às séries iniciais do ensino fundamental, em uma sala de aula improvisada na sede da Associação dos Pequenos Produtores e Moradores, na fazenda de Pedro Brás.

A Escola Indígena de Olivença atenderá a 720 alunos da Tribo Tupinambá e integra o Projeto Bahia, que financia as ações da Secretaria Estadual de Educação, em uma parceria entre o governo baiano e o Banco Mundial. O projeto conta com investimentos da ordem de US$ 1, milhão para expansão e qualidade das escolas indígenas, até o final do ano. Segundo o gerente administrativo da obra, Gedeon Brandão, o atraso decorreu dos efeitos das chuvas durante todo o final de 2005.

Com esta nova unidade escolar, Ilhéus poderá registrar um avanço na área de educação indígena, criando um sistema que atenda às necessidades educacionais dos povos indígenas de acordo seus interesses. A escola deverá manter atributos particulares, como o uso da língua indígena, a sistematização de conhecimentos e saberes tradicionais, o uso de materiais adequados preparados pelos próprios professores índios.

DEMORA - Além disso, um calendário que se adapte ao ritmo de vida e das atividades cotidianas e rituais da tribo e currículos diferenciados, com participação efetiva da comunidade na definição dos objetivos e rumos da escola. A demora na construção da Escola Indígena de Olivença foi motivo de protestos dos Tupinambás que chegaram a ocupar o saguão do Palácio Paranaguá, em dezembro de 2004, e de onde só saíram depois de um encontro com o então procurador-geral do município Otávio Augusto Carmo.

A cacique Valdelice Amaral recorda que a Prefeitura de Ilhéus alegava dificuldades com a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) para repassar os R$ 10,9 mil necessários à aquisição do terreno, o que acabou sendo resolvido pela interferência do prefeito eleito, à época, Valderico Reis. "Para nós e nossa gente é a realização de um sonho, principalmente agora que vamos ter demarcada a Reserva Tupinambá", declarou a cacique.

Segundo informou, a partir do início de março um Grupo de Trabalho da Funai começa o levantamento da área reivindicada para a reserva, que totalizaria 42 mil hectares, já que incluirá as comunidades da Serra do Padeiro, entre os municípios de Una e Buerarema. Para os curumins, como são chamadas as crianças índias, a conquista da terra onde viveram seus antepassados, e a nova escola são motivo de muita alegria.

O prédio em construção tem formato semelhante a uma taba e é integrado por seis salas de aula, laboratórios de informática e de ciências, sala de diretoria e demais dependências administrativa, biblioteca e arena poliesportiva. A expectativa da cacique Valdelice Amaral e de membros da comunidade Tupinambá é de que a escola seja inaugurada em 21 de abril no Dia do Índio. (L.C.)

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