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Índios do Alto Xingu fazem 'expedição' pelo bairro

Estado de S. Paulo-São Paulo-SP
Autor: ARDILHES MOREIRA
06 de Dez de 2002

Kalapalos gastaram R$ 800,00 na viagem, mas só conseguiram R$ 900,00 com artesanato

Parte da renda obtida pelo artista com a venda de quadros é destinada às tribos que inspiraram sua pintura

Foi preciso, pelo menos durante uma semana, que três índios deixassem a tranqüilidade do Alto Xingu para enfrentar as complicações da cidade grande. Hospedaram-se no ateliê do artista plástico Élon Brasil, em Pinheiros, para uma espécie de expedição em meio às ruas agitadas. A longa viagem até São Paulo e os encontros com comerciantes paulistanos tinha um só objetivo: vender artesanato para comprar um barco, motor e combustível para levar para a aldeia Kalapalos.

Quem pensa que a arteétnica não sofre os efeitos da recessão está muito enganado. O pajé Numü, seu filho Urisé, de 24 anos, e o sobrinho Mátula, de 25, visitaram três lojas de arte indígena e não encontraram muita receptividade. "Fiquei meio bravo, calado. Disseram que tinham de vender outras coisas primeiro", comentou Urisé. A idéia dos três kalapalos era vender, na semana passada, cerca de dez bancos, colares, máscaras e cocares produzidos na tribo. Na viagem, gastaram R$ 800,00. Com as vendas, conseguiram pouco mais de R$ 900,00.

O artista plástico Élon Brasil conhece parte da dificuldade dos índios. Desde os 11 anos vive de arte. Hoje, com 45, faz dos povos indígenas motivo de suas telas e objeto de amizade. Tanto que vai comprar o restante do material e já prometeu o motor desejado pelos kalapalos. Os índios ganharam vida nas telas de Élon pela primeira vez em 1985, quando fez a primeira viagem ao Mato Grosso e conheceu os xavantes. Daí em diante, a pesquisa étnica das 16 tribos da região do Alto do Rio Xingu rendeu várias expedições.

Ateliê - A amizade o faz constantemente hospedar índios em seu ateliê (Rua Arthur de Azevedo, 536, telefone 3064-5390). O espaço também serve de loja para alguns dos artigos trazidos pelos índios, além de galeria das obras dos artistas. Tanto que Urisé volta em abril para tentar vender mais mercadorias e verificar se o amigo branco conseguiu negociar parte do material que não foi adquirido pelos comerciantes. "É irrisório o que eles cobram. O banco é um trabalho maravilhoso que vendem por R$ 150,00", comenta Brasil. Um colar de cascos de caramujos consome mais de um mês de trabalho e cerca de 50 pequenos animais. São vendidos também por R$ 150,00 e chegam a ser revendidos pelo triplo.

Para colaborar com as tribos, cerca de 25% do valor dos quadros que o artista produz são destinados às aldeias que serviram como tema. Os retratos expressivos dos primeiros habitantes do País, captados na forma de fotografia e depois transformados em belos quadros, custam entre R$ 4 mil e R$ 33 mil. Sobrevivência - Mas nem sempre os trabalhos de Brasil tiveram essa valorização, Quando decidiu percorrer o País em busca de temas, em 1985, o bloco de papel e o carvão eram usados para pagar a hospedagem e a comida. "Fazia o retrato do proprietário e recebia algo em troca", comenta o artista.

De certa forma, os índios buscam com a venda do artesanato a mesma sobrevivência. O barco e o motor servirão para a comunidade recorrer ao auxílio médico, para ir a festas promovidas por outras aldeias e para levar para as aulas curumins - em um posto situado no parque nacional onde moram 5 mil indígenas. Os kalapalos estão divididos em três aldeias, com uma população de aproximadamente 340 indígenas. Urisé estuda no parque o português e outras matérias típicas das escolas de ensino fundamental. Depois, partilha o conhecimento na tribo e sonha cursar a faculdade de Letras. De acordo com ele, o barco que desejam conseguir ajudará a buscar atendimento para índios com problemas de saúde, como diarréia, tuberculose ou malária.

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