VOLTAR

Indios de todo o País fazem hoje conferência em Belém

O Liberal-Belem-PA
14 de Jun de 2001

Pela primeira vez na história do Pará, as nações indígenas de todo o País irão se reunir para num grande encontro, discutir temas ligados à sua etnia. Ao final, vão dizer ao governo e à sociedade o que pensam sobre a política brasileira e de que forma podem contribuir para o desenvolvimento do País. Os debates irão ocorrer durante a Conferência dos Povos Indígenas, que será aberta hoje, em Belém, e se estenderá até domingo, 17, numa realização do governo do Estado em convênio com a Fundação Nacional do Índio (Funai).
O encontro será realizado no Parque dos Igarapés, uma área de 160 mil metros quadrados, onde os índios ficarão abrigados até o final do evento. A previsão era de que a conferência reunisse 76 etnias, totalizando aproximadamente 300 índios. Ontem, entretanto, a expectativa da coordenação já havia sido superada diante da inscrição de 78 grupos, o que eleva o número de participantes.
Do evento, irão participar representantes das nações Kaapor, Tembé, Bororo, Xinguanos, Wai-Wai, Xikrin do Kateté, Pataxó, Potiguara, Karipuna, Xavante, Guajajara, Yanomami, Wassu, Gavião, entre tantas outras. A conferência será aberta às 18 horas de hoje, com uma cerimônia indígena, seguida de pronunciamentos de lideranças de tribos e autoridades do Estado e da União.
Em seguida, será feito o lançamento de uma cartilha sobre as 39 etnias existentes no Pará, produzida pelo Programa Raízes, da Secretaria de Estado de Justiça (Seju), que será distribuída nas escolas públicas do ensino fundamental. Em seguida, haverá a abertura de uma exposição fotográfica indígena e a apresentação cultural de cinco etnias.
Nos três dias seguintes, ocorrerá uma série de debates. Entre os palestrantes estarão o secretário nacional de Esporte, Lars Grael, que vai falar sobre Esporte - Modalidades de Identidade Cultural; o deputado federal Luciano Pizzatto, que irá discorrer sobre O Índio na Política Nacional, e ainda três lideranças indígenas estrangeiras: o panamenho Atencio Kuna, que falará sobre o Direito Internacional do Índio; o norte-americano Jonathan Wagers, que fará uma palestra sobre o Crescimento Econômico e Fortalecimento Cultural; e o africano Joseph Ole Simel, da tribo Massai, que abordará o tema Produção e Meio Ambiente.
Público - Nos quatro dias de realização da conferência, o Parque dos Igarapés somente será aberto ao público em geral no horário das 17 às 22 horas, avisou Amaro Klautau, coordenador do evento. Hoje, a entrada será permitida após a abertura dos trabalhos, após as 18 horas, quando o público poderá apreciar a exposição fotográfica indígena e de venda de artesanato.
Para participar da exposição em qualquer um dos dias, cada pessoa só precisa contribuir com a doação de dois quilos de alimento não perecível (menos sal). Outro aviso de Amaro Klautau é para que as pessoas não procurem consultas com a xamã Tengó, uma pajé da tribo dos Terenas, do Mato Grosso do Sul. A xamã ficará numa tenda espiritual perto do igarapé que passa nos fundos do parque, e ficará responsável pela energização do local, para atrair bons fluidos para a cerimônia. Não vai ter consulta, garantiu Klautau, cuja preocupação é com o interesse que pessoas vêm manifestando em procurar a xamã, principalmente em função do Dia de Santo Antônio, o santo casamenteiro, que transcorreu ontem. Alguém pode querer procurar a xamã para querer um reforço, brincou.
Nações querem discutir os rumos do Brasil
A partir da conferência que começa hoje, os povos indígenas brasileiros querem deixar claro para a sociedade que não podem mais ser considerados intocáveis e que têm muito a oferecer para o desenvolvimento do País de forma paralela à luta pelos direitos indígenas. Grande parte dos índios quer discutir a tutela, pois eles não querem mais ser tratados como crianças, disse Amaro Klautau, coordenador do evento. Os índios querem participar da economia e da política nacionais, completou.
Na avaliação de Klautau, o governo e a sociedade precisam parar de bancar a avestruz, enfiando a cabeça no buraco para não querer enxergar a realidade que vem sendo imposta às nações indígenas, a partir do contato com o homem branco, cada vez mais crescente e que vem expondo os índios a doenças, promiscuidade e vícios, de um lado, e ao avanço da sociedade, de outro.
Como não é mais possível evitar esse contato, disse Amaro Klautau, tem-se que pensar de que maneira os povos indígenas podem se ajustar a uma nova realidade, sem, entretanto, deixar de lado suas raízes e tradições. Quinhentos anos atrás, a riqueza que eles tinham era de qualidade de vida, comparou o coordenador da conferência. Hoje, eles também querem ter um outro tipo de riqueza e, por isso, vão discutir o que é a auto-sustentabilidade.
Como exemplo da realidade observada hoje no País, citou Klautau, está o fato de que grupos indígenas continuam a vender madeira, apesar de ser proibido pelo governo federal. Como a proibição não vai impedir que eles continuem a comercializar o produto, é preciso encontrar os caminhos legais que permitam aos índios também se desenvolverem político e economicamente, disse Amaro Klautau, ao observar que as tribos indígenas já estão elegendo seus representantes nas Câmaras de Vereadores, numa demonstração de que não aceitam ficar alijados das decisões do País.
A Amazônia é decantada em prosa e verso, com todo mundo tentando decifrá-la. Mas jamais vamos conseguir decifrar a Amazônia se não entendermos o índio, teorizou, acrescentando que na conferência as nações indígenas irão dizer exatamente o que pensam sobre o assunto. Temos que procurar entendê-los, disse Klautau.
As propostas das nações indígenas irão constar no documento denominado Agenda para o novo século, que será encaminhado ao presidente da República, aos governadores e às entidades ligadas às questões indígenas, segundo informou o coordenador-geral em Defesa dos Direitos Indígenas da Funai, Marcos Terena, que juntamente com o irmão, Carlos Tereza, idealizou a realização da conferência numa conversa com Amaro Klautau durante os jogos indígenas de outubro de 1999.

As notícias aqui publicadas são pesquisadas diariamente em diferentes fontes e transcritas tal qual apresentadas em seu canal de origem. O Instituto Socioambiental não se responsabiliza pelas opiniões ou erros publicados nestes textos. Caso você encontre alguma inconsistência nas notícias, por favor, entre em contato diretamente com a fonte.