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Índios apelam à ONU por paz

CB, Brasil, p. 13
20 de Jul de 2005

Índios apelam à ONU por paz
Relatório sobre assassinato, só este ano, de 18 integrantes de diversas etnias brasileiras, será entregue às Nações Unidas por líder truká. Documento acusa governo de ser omisso e cúmplice com a violência

Paloma Oliveto
Da equipe do Correio

A imagem do Brasil no exterior vai sofrer um novo arranhão hoje, durante reunião no escritório da Organização das Nações Unidas (ONU), em Genebra. A indígena Edilene Truká vai apresentar ao relator especial da entidade sobre execuções arbitrárias, sumárias ou extrajudiciais, Philip Alston, denúncia sobre o assassinato de índios brasileiros. Desde o início do ano, foram 18 as vítimas de mortes violentas - quatro delas, entre junho e julho. Os índios assassinados são integrantes de várias etnias, a maioria dos truká (PE), guajajara (MA) e guarani (MS). No documento, o governo é acusado de omisso e cúmplice.
Prestes a receber a visita de um representante das Nações Unidas que irá preparar um relatório sobre a violação dos direitos humanos no Brasil, o país poderá receber recomendações da ONU, caso a denúncia de Edilene Truká seja acatada. Na prática, isso significa uma espécie de sanção moral. Embora reconheça que o provável puxão de orelhas do organismo internacional desgaste ainda mais a imagem do Brasil no exterior, a diretora de pesquisa e comunicação da organização não-governamental (Ong) Justiça Global, Sandra Carvalho, diz que a denúncia à ONU foi a maneira encontrada de chamar atenção para o problema. "A interlocução com o governo brasileiro não está surtindo o efeito desejado", diz.
Um dos líderes dos truká, Mozeni Araújo, diz que seu povo está acuado e com medo. Com uma população de 3.888 índios que vivem em 32 aldeias na Ilha de Assunção e outras ilhotas espalhadas pelo rio São Francisco, em Pernambuco, os truká perderam dois indígenas, no último dia 30. Adenilson dos Santos, 38 anos, e seu filho, Jorge, 17, foram assassinados por policiais militares durante uma festa. Irmão de Adenilson, o cacique Aurivan dos Santos, o Neguinho, foi preso ao prestar depoimento sobre os assassinatos à Polícia Federal. Ele é acusado de participar do furto de dois bois, pertencentes a um fazendeiro que ocupava a terra indígena dos truká.
"A gente se sente impotente, entre crocodilos e leões. Desde a década de 80, denunciamos essas penas de morte anunciadas e nunca nada foi feito. O governo é responsável por essa política de genocídio", acusa Araújo. Segundo os índios da etnia que testemunharam os assassinatos, os policiais militares fazem parte de um grupo de extermínio que atua na região. A Polícia Federal investiga o caso. O Correio procurou a Fundação Nacional do Índio (Funai), mas não conseguiu contactar seu presidente, Mercio Pereira. Em nota oficial, a Funai divulgou que "deplora a brutalidade da ação policial e reivindica às autoridades competentes a apuração dos fatos".
Líderes perseguidos
O presidente do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), Saulo Feitosa, denuncia outra violência praticada contra os índios brasileiros: a criminalização de seus líderes. A prisão de Neguinho, um importante líder da etnia, é citada por ele como exemplo. "Acusam os índios de formação de quadrilha", lamenta. Essa seria uma forma, segundo Feitosa, de desestabilizar a mobilização indígena.
Desde a década de 80, fazendeiros e plantadores de maconha encontram-se em pé de guerra com os truká. A terra indígena está localizada justamente na região do Nordeste conhecida como Polígono da Maconha. Expulsos do local, os índios voltaram dez anos depois, substituindo as mudas de maconha por arroz.
Embora alguns plantadores ainda cultivem a erva para vender aos brancos ou para consumo próprio, a maioria sobrevive da rizicultura. Em março de 2002, o Movimento Nacional de Direitos Humanos (MNDH) visitou algumas cidades do Polígono da Maconha e constatou que os truká eram vítimas de torturas, execuções sumárias e prisões ilegais cometidas por policiais militares ligados ao tráfico de drogas.
Embora demarcada em 5.769 hectares, a terra indígena dos truká ainda não foi homologada. Aguarda a assinatura do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Para o presidente do Cimi, o atual cenário de violência contra povos indígenas é reflexo da debilidade da política de reconhecimento e homologação das terras. Durante o governo Lula, nenhum processo de demarcação foi iniciado. "Por causa do descaso e da omissão, uma população inteira está sendo vitimada", diz Feitosa, lembrando que no Mato Grosso do Sul, no Maranhão no extremo Sul da Bahia também houve assassinatos de índios este ano.

CB, 20/07/2005, Brasil, p. 13

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