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Índios acreanos: o medo da rejeição

Página 20
Autor: Andréa Zílio
19 de Abr de 2007

Em novo governo eles expressam no seu dia o receio de serem esquecidos. Gestor diz que avanço não tem como retroceder

Todos os anos, no dia 19 de abril, eles estão sempre em pauta, mas o que os índios ressaltam é que não podem ser tratados como temas de exceção na discussão, planejamento e, principalmente, execução da política de desenvolvimento do lugar onde vivem. De um lado, na avaliação de lideranças indígenas, existe o receio de não serem vistos com a atenção necessária aos olhos de uma nova administração do governo do Acre. Do outro, dos gestores, o processo de avanço não tem como retroceder - e o que vale é avançar.

Hoje, Dia do Índio, o Acre comemora em seu estilo. Em uma das etnias mais articuladas do Estado, os yawanawá, o povo está reunido na aldeia principal - Nova Esperança, Tarauacá - para expressar as preocupações, avaliar onde não avançou e trabalhar a articulação que pretendem colocar em prática. Na capital acreana, cerca de 40 lideranças de várias etnias também se reúnem, em assembléia geral, junto ao assessor dos Povos Indígenas, Francisco Pinhanta, para discutir a política indigenista no Estado.

O Acre possui 15 etnias com a mais nova oficialização de um povo, os Nawá. Mas o Estado trabalha também com três outras etnias - Apurinã, Pauíni e Jamamadi -, que pertencem ao Amazonas e têm melhor acesso ao Estado. A população indígena é de cerca de 15 mil pessoas, eles estão em onze municípios e habitam 163 aldeias, segundo os dados da Fundação Nacional de Saúde (Funasa).

A maior área demarcada é a do Mamoadate, com cerca de 313 mil hectares. A menor corresponde ao povo Kaxinawa de Feijó, a Colônia 27, com 300 hectares, segundo a Fundação Nacional do Índio (Funai-AC).

Por muito tempo no Acre, a política indigenista foi feita unicamente pela Funai, de acordo com as próprias lideranças e o assessor Pinhanta. Isso mudou nos últimos oito anos, quando foi criada a Secretaria de Povos Indígenas, como fortalecimento de uma nova proposta, que prometia um olhar atento. Mas com a troca de governo, o que os índios discutem hoje, é se continuarão recebendo a mesma atenção. O assessor garante que sim porque "o trabalho continua e a autonomia dos índios independe de governo, pois é a do cidadão".

O grito da aldeia
Biraci Brasil Yawanawa e Tahsca Yawanawá, ambos reunidos na aldeia com seu povo, afirmam que ao longo dos anos conseguiram construir uma relação com o poder executivo que foi de grande valia. Mas estão com o receio de o diálogo frequente acabar. "Construímos um saquinho de farinha e hoje estamos vendo ele ser espalhado por toda a casa. Não queremos que isso aconteça, queremos manter o diálogo como base do trabalho em parceria, queremos estar envolvidos as discussões sobra a política indigenista", diz.

Biraci destaca que o povo Yawanawa é articulado e, ainda assim, sente dificuldade em trabalhar com as instituições, muitas vezes sem saber aonde ir, portanto é necessário que no planejamento do governo exista o elo, um setor de referência entre eles, e não sabe se a mudança da secretaria para assessoria vai conseguir cumprir o papel.

"Sabemos que a mudança de governo traz também um outro projeto, mas desejamos que ele esteja no caminho do projeto anterior. Queremos pedir ao governador Binho Marques, que nos olhe com atenção. Temos um carinho grande por ele, e temos esperança de uma continuidade na política indigenista" diz.

Bira e Tahska falam que a mensagem do dia do índio que têm a passar é esse pedido de atenção, para que não haja um retrocesso no que conseguiram avançar depois de muita luta. "Se precisar, teremos de trabalhar novamente com articulação fora do Estado, mas o que queremos é participar desse processo de construção no Acre. Não somos e não queremos ser empecilho, somos índios, somos cidadãos", diz Tahska.

O coordenador da Funai no Acre, Antonio Apurinã, diz que a fundação existe para atuar em defesa e direito dos povos indígenas, e que procurar aliados para a luta é sempre a melhor opção. Diz que isso aconteceu com êxito no governo Jorge Viana, e que trabalhará para se repetir no governo Binho Marques, inclusive, propondo encontros que coloque o objetivo em prática.

... e o eco na cidade
O assessor indígena, Francisco Pinhanta, afirma que ouve um avanço na política indígena no Acre com a própria criação da secretaria, e que a mudança do órgão para assessoria não representa retrocesso, ao contrário, é uma nova tática de avançar.

Pinhanta conta que antes do governo Jorge Viana, os índios eram ignorados no Estado, vistos como problema e atraso e nos últimos oito anos, a Funai deixou de ser o único órgão responsável na atuação voltada à eles. Diz que houve também a falta de cultura da sociedade em conhecer os povos indígenas, em que parecia que os povos indígenas não pertenciam ao Estado, e hoje a cultura do índio acreano é orgulho.

Quanto ao novo papel da assessoria, é de apoiar os projetos e ações das comunidades indígenas, orientando também no que for necessário. Pinhata garante que atuação será mais forte desta forma. "Naquele momento foi necessário a secretária, mas o Estado não tinha a estrutura para atender a demanda toda e foi uma novidade, acertamos mais do que erramos sem nunca ter feito isso antes. Hoje, transformar a secretaria em assessoria nos dá mais autonomia atuar, e de forma mais próxima das comunidades", comenta.

Pinhanta responde a aflição dos índios e diz que o projeto político continua, mas a forma de trabalhar é outra, porque o momento é outro, agora a prioridade é o social, por isso, a assessoria terá a função de definir com todas as secretárias competentes, os projetos e programas voltados aos povos indígenas.

"Os povos indígenas não ficam sem referência. Vamos trabalhar a partir do que a comunidade quer e precisa, não é o programa de governo que será imposto a ela, ela vai construir junto a nós. O avanço que tivemos não tem como retroceder, e o índio é independente de Governo", diz Pinhanta.

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