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Indígenas ocupam secretaria de Educação no Pará contra extinção de programa que leva ensino presencial a comunidades

Info Amazônia - https://infoamazonia.org
Autor: Jullie Pereira
15 de Jan de 2025

Até às 10h desta quarta-feira (15), líderes indígenas ocupavam a Secretaria de Educação e pediam que o Sistema de Organização Modular de Ensino Indígena (Somei), de ensino presencial, não seja substituído pelo ensino à distância.

Líderes indígenas do Baixo e Médio Tapajós, no Pará, ocupam desde a manhã desta terça-feira (14) a sede da Secretaria de Educação do estado, em Belém. Eles protestam contra a extinção do Sistema de Organização Modular de Ensino Indígena (Somei), programa estadual que leva professores não indígenas para dar aulas nas comunidades do interior.

O programa foi extinto por meio da Lei no 10.820, sancionada pelo governador Helder Barbalho (MDB), em dezembro de 2024, que estabeleceu um novo Estatuto do Magistério Público no Pará. O novo texto cita apenas o Sistema de Organização Modular de Ensino (Some), modalidade de ensino semelhante ao Somei que leva aulas do ensino médio a regiões mais afastadas, com difícil acesso por estradas e rios, e não há menção ao programa voltado aos povos indígenas.

Chamada de "PL do Magistério", a norma foi proposta pelo governo em 16 de dezembro e aprovada dois dias depois em regime de urgência, no dia 18, na Assembleia Legislativa do Pará (Alepa), em sessão à época marcada por protestos de professores, como ocorre agora, no ato liderado por indígenas na Secretaria de Educação.

Até as 10h desta quarta-feira (15), ao menos 200 indígenas de vários povos, entre eles os Sateré-Mawé, Wai Wai, Munduruku, Arapiuns, Borari, Jaraqui e Guarani, permaneciam no prédio da secretaria. O objetivo deles é falar com o secretário de Educação Rossieli Soares e pedir a permanência do Somei. Soares é ex-ministro da Educação do governo de Michel Temer e ex-secretário de educação dos estados de São Paulo e do Amazonas.

A ativista Alessandra Karop Munduruku participa das manifestações, critica Soares e o acusa de não entender os desafios da educação indígena no Pará. Ele assumiu o cargo atual em fevereiro de 2023.

"Nós sabemos onde estamos sofrendo, sabemos que os professores estão sofrendo, eu sou uma que dá apoio aos professores. Eles dizem que não têm dinheiro, mas eles estão ganhando muito dinheiro em cima das nossas florestas. Nós temos documentos para mostrar ao Rossieli e ao governador. Nós não vamos sair daqui, se não virem aqui, [é porque] eles são uns covardes", disse Alessandra.

Enviada ao local, a Polícia Militar cortou a energia do prédio por volta das 8h e, na sequência, jogou spray de pimenta nos banheiros para impedir o acesso. A equipe policial inclui agentes de rondas ostensivas com apoio de carros de polícia (Rocam), considerada da tropa de choque.

A principal preocupação dos indígenas em relação à retirada do Somei do sistema educacional paraense é a de que o ensino presencial seja extinto das comunidades e substituído pelo novo programa de ensino à distância, o Centro de Mídias da Educação Paraense (Cemep). Líderes indígenas pedem que ele não seja implementado nos territórios.

O Cemep tem sido instituído desde junho de 2024 pelo governo do Pará e prevê que alunos assistam as aulas gravadas pela televisão. Para isso, a secretaria de Educação distribui para as escolas do interior, incluindo unidades indígenas, kits com antena de internet Starlink, notebook e televisão.

Questionada, a secretaria não explicou como o Cemep deve afetar o ensino indígena.

Professores da rede estadual também fazem manifestações desde o início do ano passado contra as mudanças do estatuto. O professor de filosofia Fábio Pinto é um deles e esteve na porta da secretaria nesta terça. Servidor há 29 anos, ele apontou falta de diálogo e questionou a rapidez com que a lei foi sancionada.

"É o Somei que atende esses povos tradicionais e foi revogado junto com o nosso estatuto. O governo tinha prometido aos indígenas que desenvolveria políticas. Mais uma vez, o governo não cumpre com a palavra", disse.

É o Somei que atende esses povos tradicionais e foi revogado junto com o nosso estatuto. O governo tinha prometido aos indígenas que desenvolveria políticas. Mais uma vez, o governo não cumpre com a palavra.

Fábio Pinto, professor da rede estadual no Pará
A reportagem da InfoAmazonia esteve na sede da Secretaria nesta terça e registrou quando indígenas que estavam do lado entraram no prédio por uma brecha na grade de acesso, dentre eles uma criança, enquanto policiais militares tentavam impedir. Do lado de dentro, PMs da Rocam acompanhavam.

O protesto ocorre no ano em que Belém está no foco das atenções por ser a sede da COP30, marcada para ocorrer em novembro e com previsão de ser a maior da história em participação dos indígenas.

Ato defende educação indígena presencial
Em 1o de janeiro, a indígena Ligiane Jaraqui viajou, durante 12 dias, da Terra Indígena Cobra Grande, no oeste do Pará, para Belém. A ideia dela era participar da manifestação contra a lei, mas não esperava que teria de enfrentar a polícia.

"Isso daí é uma destruição muito grande. A gente está aqui para pedir a revogação dessa lei e a gente construir um decreto ou uma lei que nos assegure, que mantenha esse ensino dentro das comunidades, porque nós precisamos dessa educação nas aldeias", disse.

No território de Ligiane, existe uma escola de Ensino Básico e Fundamental com 102 crianças. Em 2024, as aulas ocorreram normalmente, mas, com a nova lei, vivem a incerteza em 2025, sem informações sobre novas matrículas e como ocorrerá o ano letivo.

A InfoAmazonia procurou a Secretaria de Educação e questionou sobre a permanência do Somei após a nova lei. Em nota, a Secretaria respondeu que "não é verdade que o Sistema de Organização Modular de Ensino (Some) será finalizado", sem mencionar o projeto Somei, motivo do protesto dos indígenas.

A reportagem também questionou se o CEMEP vai afetar a educação indígena no estado, mas sobre isso a Secretaria não respondeu. Ainda em nota, foi citado que o governo do Pará "paga o segundo melhor salário inicial para professor, no Brasil".

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