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Incra fará assentamento em reserva

OESP, Nacional, p. A7
12 de Jun de 2006

Incra fará assentamento em reserva
Cem famílias vão ocupar área de 7,7 mil hectares coberta pela Mata Atlântica em Apiaí, no Vale do Ribeira

José Maria Tomazela

O Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) vai assentar cem famílias do Movimento dos Sem-Terra (MST) numa área de 7,7 mil hectares coberta pela Mata Atlântica. O órgão federal desapropriou a Fazenda Vitória, em Apiaí, no Vale do Ribeira, a 326 quilômetros de São Paulo, para a instalação do assentamento. A posse do imóvel está marcada para o dia 28 de julho. Os sem-terra já estão acampados na entrada da propriedade. A fazenda fica no entorno do Parque Estadual Turístico do Alto Ribeira (Petar) e faz parte do continuum do Vale do Ribeira, o maior maciço dessa floresta no País, considerado Reserva da Biosfera. A Mata Atlântica é protegida por leis federais por ser um dos ecossistemas mais ameaçados do mundo. O Petar abriga ainda o principal conjunto de grutas e cavernas do Brasil - algumas delas, no Núcleo Santana, abertas ao ecoturismo. O Incra desembolsou R$ 7,7 milhões pela terra com as benfeitorias, e ainda não se sabe quanto vai investir no assentamento. O órgão promete desenvolver um Projeto de Desenvolvimento Sustentável (PDS), em que as famílias realizem programas de geração de renda sem destruir a mata.

A Secretaria de Meio Ambiente do Estado de São Paulo é contra o projeto. Um laudo elaborado pelo Departamento Estadual de Proteção dos Recursos Naturais (DEPRN) mostra que 80% da fazenda é coberta por vegetação nativa da Mata Atlântica, cuja supressão é impossibilitada pelas leis existentes. Cerca de 60% dos solos são impróprios para a agricultura, em grau máximo. Uma incursão pelas terras mostra por que antigos projetos de exploração agrícola do local fracassaram. A fazenda fica nas encostas da Serra de Paranapiacaba e o terreno é muito acidentado. A terra, escura e arenosa, com muita turfa, fica encharcada e fofa quando chove. Do espigão do Morro da Bandeira, o ponto mais alto da fazenda, com 1.180 metros de altitude, é possível avistar grande parte do Petar.

Ninguém ainda sabe que uso dar à terra
Líder diz que seminário com Incra vai ajudar a "amadurecer" decisão
As cem famílias que serão assentadas, cerca de 400 pessoas, estão acampadas há um ano e oito meses nas duas margens da Rodovia SP-250 e ainda não sabem o que vão fazer quando se apropriarem das terras da Fazenda Vitória. "Isso será amadurecido num seminário que vamos ter com o pessoal do Incra", diz o líder que se identificou apenas como Gabriel. "A gente soube que a terra ia sair e veio para cá", explicou. Gabriel garante que a mata será preservada. "Vamos produzir mel e fazer agricultura orgânica."

O diretor da Divisão de Reservas e Parques Estaduais do Instituto Florestal, Luís Roberto Numa de Oliveira, teme que os impactos do assentamento ultrapassem a área da fazenda e se reproduzam dentro do parque. "É uma pena que uma área dessas vá ser utilizada para um tipo de ocupação que demanda a supressão da vegetação." De acordo com ele, a fazenda é mais propícia para o reassentamento de tribos indígenas que se instalaram em parques estaduais. Moradores de Apiaí também se articulam contra o assentamento.

"Não há como os sem-terra tirarem o sustento de um lugar como aquele", diz o ex-prefeito Nilton Passoca de Toledo Silva. "Tudo ali é mata e nascentes formadoras da Bacia do Ribeira, por isso deve ser preservado."

O Incra informou que este será o terceiro assentamento com o conceito Projeto de Desenvolvimento Sustentável no Estado. Os outros funcionam na região de Serrana, norte do Estado, com 80 famílias, e em Eldorado, Vale do Ribeira, com 70 grupos familiares.

OESP, 12/06/2006, Nacional, p. A7

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