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Impunidade amazonia

JT, Editorial, p.A3
24 de Fev de 2005

Impunidade amazônica
Pouco tempo após a execução brutal da missionária nascida nos EUA e naturalizada brasileira Dorothy Stang em Anapu PA, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva tem demonstrado uma justa, natural e, no caso, até sagrada indignação. No programa de rádio Café com o Presidente, ele prometeu não descansar enquanto não forem presos executores e mandantes do assassínio. No dia seguinte, na implantação do programa Luz para Todos, no assentamento Geraldo Garcia, em Sidrolândia MS, asseverou: "O Brasil tem lei, não é terra de ninguém."
Benditas sejam as palavras do chefe do governo! Tão benditas que os mesmos jornais que as noticiaram reproduziram também a informação (infelizmente incomum em nossa realidade de impunidade generalizada) de que o caso foi resolvido em prazo recorde: a freira foi executada por Fogoió e "Eduardo", contratados por Tato e pagos por Bida. Tolice seria dar seus nomes e sobrenomes, bastando lhes citar os apelidos, pois eles são a mais miúda arraia do capitalismo selvagem do Norte remoto.
Na verdade, não foi tão complicado assim desvendar o crime. Basta ver que em setembro de 2003 (e lá se vão um ano e cinco meses), o procurador-geral da República, Cláudio Fonteles, encaminhou ao Palácio do Planalto um relatório do Ministério Público Federal acusando seis madeireiros (agora chamados de "conservadores e reacionários" por Lula) na chamada Terra do Meio, onde a tragédia se consumou, de explorar ilegalmente o mogno e participar do tráfico de drogas. Segundo o relatório, eles seriam "testas-de-ferro" do deputado federal Jader Barbalho (PMDB-PR) e teriam contratado os serviços de uma tropa de 100 jagunços com o objetivo de "limpar a área", sendo a impunidade (que o presidente agora garante ter acabado) deles assegurada por cúmplices poderosos em órgãos federais e estaduais. Um de seus alvos preferenciais era a missionária, empenhada em denunciar a devastação da floresta e o crime organizado.
Em maio de 2004, a própria religiosa narrou esse quadro à CPI da Terra, cujo presidente, senador Álvaro Dias (PSDB-PR), encaminhou seu depoimento para o mesmo destinatário da acusação do MP. Não se sabe se o presidente do Incra, Rolf Hackbart, deu destino semelhante à carta que recebeu, de próprio punho, da mesma missionária denunciando as ameaças recebidas por ela e constatando o "estado de terror" na região onde vivia. Não há notícia de que o presidente tenha tomado alguma providência para evitar que se consumasse a morte previamente anunciada da militante, a não ser depois da comoção e da repercussão, principalmente no exterior, dos tiros que a calaram para sempre.
Nunca, contudo, é tarde para reparar uma situação dessas. Para se redimir de tanta omissão, o governo Lula tem de agir agora, mesmo que tenha de atingir aliados fiéis no Congresso e enquadrar todos, até o MST, no império da lei e da ordem.
JT, 24/02/2005, p.A3

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