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Importação de gás chega a US$ 2,6 bilhões

OESP, Economia, p. B10
06 de Out de 2014

Importação de gás chega a US$ 2,6 bilhões
Gasto de janeiro a agosto disparou com a utilização das usinas para fornecer energia e pressionou o resultado da balança comercial

A decisão do governo de manter as usinas térmicas ligadas para amenizar o esgotamento dos reservatórios das hidrelétricas causada pela estiagem dos últimos anos teve um profundo impacto no consumo nacional de gás. Isso também implicou em prejuízo às contas externas do País, uma vez que boa parte do principal insumo usado nas usinas termoelétricas, importado da Bolívia, é pago em dólares.
Dados compilados pelo Ministério de Minas e Energia (MME) apontam um crescimento de mais de quatro vezes no consumo médio de gás pelas térmicas desde 2011. Em números, a combustão média do hidrocarboneto saltou de 10,42 milhões de metros cúbicos, registrada no primeiro ano de mandato da presidente Dilma Rousseff, para uma média de 45,83 milhões de metros cúbicos neste ano.
A explosão na demanda do gás pelas térmicas repercutiu diretamente nas importações da matéria-prima, quadro que consolida o Brasil como forte dependente do produto que vem do exterior.
Entre janeiro e agosto deste ano, segundo o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC), o País gastou US$ 2,645 bilhões na importação de gás. O número, que inclui o consumo residual do insumo por parte da indústria da região Centro-Sul, supera em US$ 1 bilhão a importação registrada nos primeiros oito meses de 2011.
O quadro preocupa, segundo o consultor Welber Barral, ex-secretário de Comércio Exterior do governo Lula, não apenas porque confirma a dependência nacional de uma matéria-prima que poderia ser beneficiada aqui e revendida para as usinas térmicas, como também pela possibilidade de um pedido de revisão dos preços pelos bolivianos em razão do aumento do consumo. O contrato atual prevê reajuste apenas em 2019.
"A importação é inevitável. No ano que vem voltamos a depender das chuvas, mas essa importação ou aumenta ou continua no mesmo patamar, dificilmente cai", avalia Barral. "Houve negociação com a Bolívia e o contrato está em vigor, mas vão pedir revisão com certeza. Daí, a urgência de o Brasil diversificar as fontes de energia."

Consumo
Os números do MME apontam que a importação de gás, que em 2011 registrava uma média de 28 milhões de metros cúbicos por dia, chega agora a 54 milhões de metros cúbicos. O peso que a geração térmica de energia teve sobre o consumo de gás fica mais evidente quando comparado à utilização do insumo pela indústria.
Antes da crise energética, o setor industrial absorvia mais da metade do gás disponível. Em 2011, a indústria respondeu pelo consumo médio de 40,8 milhões de m³ por dia, de um total de 61,4 milhões consumidos naquele ano, enquanto a demanda térmica não chegava a 11 milhões de metros cúbicos.
Neste ano, a demanda das usinas simplesmente ultrapassou a das indústrias. Da média de 98 milhões de metros cúbicos usados diariamente, 46 milhões são queimados para geração de energia, enquanto a indústria fica com 43 milhões de metros cúbicos.
Mesmo cotado em moeda estrangeira, o gás pode representar uma vantagem competitiva para algumas indústrias de alto consumo de energia, as chamadas eletrointensivas, como cerâmicas e alumínio, por exemplo. Mas neste caso, dificilmente o consumo nacional pela produção vai crescer, pois falta logística para levar o insumo para todas as regiões do País.

País também importa quase todo o combustível nuclear
Dependência reflete falta de investimento no setor; produção nacional de urânio enriquecido não atende 10% da demanda

Apesar de dominar todo o ciclo de enriquecimento do urânio, e ser dono de uma das maiores jazidas deste minério em todo o mundo, o Brasil ainda será, por muitos anos, um fiel importador do combustível para nas usinas nucleares instaladas em Angra, no Rio de Janeiro.
A principal causa dessa dependência é, basicamente, a falta de investimento no setor. O conhecimento local existe, mas não há como industrializá-lo para garantir a autossuficiência ao País. Hoje, a produção nacional de urânio enriquecido é marginal e, segundo os especialistas do setor, não chega a atender 10% da demanda das usinas Angra 1 e 2.
Para montar uma estrutura capaz de alimentar essas usinas, seria necessário um aporte de aproximadamente R$ 2 bilhões, estima a estatal Indústrias Nucleares do Brasil (INB), vinculada ao Ministério da Ciência e Tecnologia. No ano passado, aponta a INB, o Tesouro destinou apenas R$ 38 milhões para essa tarefa.
Por lei, a INB detém o monopólio de todo o ciclo do urânio no País, da extração mineral até a fabricação do combustível usado na geração nuclear. Por conta disso, não é permitido a outra companhia fazer o enriquecimento no País.
Para alimentar Angra 1 e 2, usinas que têm capacidade conjunta de 1.990 megawatts, são necessárias 380 toneladas de concentrado de urânio por ano. Depois de ser extraído no Brasil, esse material passa por um processo de transformação, que culmina na fase do enriquecimento. Essa etapa tem sido executada em países como França, Holanda e Reino Unido.
Investimento. "Hoje ainda temos uma capacidade muito pequena de enriquecimento. Na realidade, estamos longe de ter capacidade plena de execução dessa etapa no país, por conta das necessidades de investimento", diz o presidente da INB, Aquilino Senra.
Essa dependência do combustível importado, no entanto, tem prazo para acabar. A INB assinou um contrato com a Eletronuclear, no qual se compromete a fornecer 100% do urânio que será usado pela usina de Angra 3, em construção no Rio, até o ano de 2022. "Temos um contrato para cumprir. Sabemos que o País tem muitas outras prioridades de investimento, mas esse acordo terá de ser atendido, em algum momento", afirma Senra.
A usina de Angra 3 está prevista para iniciar suas operações em junho de 2018. A obra, atualmente avaliada em R$ 13,9 bilhões, ampliará a capacidade do parque nuclear de 1.990 MW para 3.395 MW.

Produção de gás deve dobrar

Fontes do governo informam que o País deve mais do que dobrar a produção de gás natural nos próximos dez anos, com a maior exploração das reservas do pré-sal. Esse potencial, no entanto, não deverá ter impacto sobre as importações do produto no abastecimento das usinas termoelétricas, por conta do tipo de gás que será produzido. Isso significa que a tendência é, no mínimo, manter os gastos do País com o gás que é importado da Bolívia.
Apesar de o preço estar fixado em contrato, a valorização do dólar e a possibilidade de aumento dos juros nos Estados Unidos significam que o País gastará cada vez mais reais para adquirir o hidrocarboneto.
As usinas térmicas a gás têm batido recordes de produção. Em janeiro de 2011, quando Dilma Rousseff tomou posse, o consumo médio foi de 2.340 megawatts/hora. No mês passado, o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) registrou 15.599 MW/h.

Crise do etanol segura plano de usinas de biomassa
Dados oficiais apontam que 58 usinas devem iniciar operação até 2020, mas apenas 14 estão com cronograma em dia

A crise que toma conta da indústria do etanol passou a contaminar os projetos de geração de energia alimentados pelo bagaço de cana, uma fonte que hoje responde por 9,2% de toda a capacidade instalada de energia no País. A maior parte das usinas de biomassa em construção vive situação preocupante de atraso ou simplesmente não tem mais previsão para conclusão. Aquelas em situação financeira mais grave já deram início a processos de revogação de contratos com a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel).
A geração por biomassa equivale a toda a capacidade produzida por usinas movidas a carvão, óleo diesel e nuclear - um conjunto de 1.224 usinas que entregam 10% do parque instalado de energia. Os dados oficiais apontam que, atualmente, há 58 usinas de biomassa outorgadas pela Aneel com previsão de iniciar operação comercial até 2020. A realidade, porém, é que apenas 14 usinas estão com seus cronogramas em dia. Em 20 empreendimentos, a situação é de alerta e tudo indica que haverá novos adiamentos.
Para 24 projetos, contudo, o cenário é crítico: oito deles estão com proposta de revogação de contrato em andamento, 13 estão sem perspectiva de início de obras e três estão parados.
"Isso é o reflexo da situação difícil que todo o setor vive no País. É um efeito dominó. As usinas de açúcar e álcool passam por complicações devido ao alto grau de endividamento", diz Newton Duarte, presidente da Associação da Indústria de Cogeração de Energia (Cogen).
A origem de todos os problemas, criticam os especialistas, está na política de controle de preços da gasolina imposta pelo governo, o que tira a competitividade do etanol nos grandes mercados consumidores do país. "Essa falta de política para o etanol nos levou a ter hoje 70 empresas em situação financeira extrema, com paralisação de operações ou em processo de recuperação judicial", diz Duarte.
A geração de energia a partir da biomassa é feita hoje por 486 usinas no País, que somam capacidade de 12.056 megawatts.
A oferta de energia dessas usinas, geração que a princípio tinha o propósito de autoconsumo, acabou se convertendo em um integrante importante na matriz elétrica nacional - sobretudo, em um momento em que o País precisa poupar água em seus reservatórios para garantir o abastecimento.
Apesar do cenário nebuloso, os especialistas apostam numa possível retomada dos projetos de geração a biomassa, a partir do leilão de energia chamado "A-5", marcado para 28 de novembro, quando serão contratadas usinas de todas as fontes para entrada em operação daqui a cinco anos. Um total de 32 projetos de térmicas a biomassa se cadastrou para o leilão, com previsão de entregarem até 1.917 megawatts de energia. Dos 32 cadastrados para o leilão, dez térmicas estão previstas para São Paulo.
Para esses empreendimentos, o governo fixou um preço-teto de pagamento por megawatt/hora, de R$ 197. Vence o leilão aquele que apresenta o maior deságio em relação a esse preço. A avaliação no setor é de que o preço permitirá competição entre as empresas, com possibilidade de que ao menos metade da energia cadastrada seja efetivamente contratada pelo governo.

Potencial

A evolução da biomassa na matriz energética depende, essencialmente, da capacidade de inovação técnica das usinas sucroalcooleiras. O setor, que inicialmente só usava a biomassa para o autoconsumo, seja em produção de calor ou de eletricidade, passou a ser um exportador de energia para a matriz elétrica do país. As estimativas apontam que o negócio de energia com o bagaço pode responder por mais de 10% do faturamento dessas empresas.
A União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Unica) diz que a bioeletricidade tem um potencial de mais de 13 mil megawatts médios no Brasil, o equivalente a quase três vezes a energia firme a ser entregue pela hidrelétrica de Belo Monte.

OESP, 06/10/2014, Economia, p. B10

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