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Ibama cria grupo para salvar baleias

JB, Cidade, p.A25
05 de Set de 2004

Ibama cria grupo para salvar baleias
Pesquisadores se unem a bombeiros com intuito de formar equipe capacitada para atuar em encalhes de animais na costa fluminense
Florença Mazza
O triste desfecho dado ao encalhe de três baleias no mês passado - que acabaram morrendo em praias da Região dos Lagos e de Niterói - levou o Ibama a criar, na última semana, um grupo de trabalho voltado para os mamíferos aquáticos que venham a aportar na costa fluminense. Formada por entidades de pesquisa e órgãos estatais, a equipe estuda medidas para melhor receber, no futuro, os ilustres visitantes.
- Criamos o grupo depois da constatação que o Rio não tem uma estrutura capaz de lidar com emergências - explica Walter Plácido, assessor técnico da gerência do Ibama no Rio.
Logo após a morte de uma baleia jubarte, no último dia 11, que ficou três dias na Praia do Imbuí, em Niterói, Plácido esteve em Brasília e propôs a criação do grupo, que servirá como base para a implantação da Rede de Encalhe de Mamíferos Aquáticos do Sudeste, já prevista pelo Ibama. Na primeira reunião, na segunda-feira, estiveram presentes integrantes do Projeto Maqua/Uerj, Fiocruz, UFRJ, Marinha e da Defesa Civil.
O objetivo do grupo é criar uma equipe técnica e operacionalmente preparada para atuar em casos de encalhe de baleias no Estado. Outra prioridade é discutir qual o destino que deve ser dado caso estes animais venham a morrer. Um dos problemas é a falta de um espaço para a realização de necrópsias.
Para o oceanógrafo e coordenador do Projeto Maqua, José Laílson Brito Junior, o principal desafio do grupo é definir ptotocolos para casos de encalhe.
- É preciso ter uma ordenação, estabelecer regras para estes procedimentos. Definir quem dará a voz de comando. O salvamento destes animais depende muito das condições geográficas e climáticas do local onde ele encalha. E, em muitos casos, estas regras vão ser alteradas - afirma o biólogo.
Dos seis encalhes de animais vivos acontecidos nos últimos 12 anos, José Laílson só presenciou um caso de sucesso: o de uma baleia jubarte que encalhou, em 1991, em Saquarema. Grande parte do êxito, segundo ele, se deve às condições da maré e da praia em que ela aportou. Coordenadora do Instituto Ecomama, a bióloga Liliane Lodi presenciou a operação. Ela lembra que a rede utilizada, na ocasião, foi mais apropriada para o resgate destes animais.
- Tem que ser uma rede acolchoada. As de nylon acabam ferindo a pele da baleia, que é muito fina - observa.
Segundo Liliane, a falta de recursos materiais e financeiros são as maiores dificuldades no resgate de baleias. Ela admite, entretanto, a urgência de organizar tais operações:
- É um absurdo ficar aquele monte de gente envolta do animal, que já está estressado. É tudo na base do improviso.
Liliane alerta para medidas que devem ser tomadas - e muitas vezes esquecidas nos casos de encalhe: o corpo da baleia deve ser coberto por panos claros e molhados, o orifício respiratório tem que ficar desobstruído e os ruídos evitados, já que a audição dos cetáceos é muito sensível.
Outra preocupação dos pesquisadores é orientar aqueles que cuidarão da parte operacional do resgate, como Defesa Civil e Marinha. Os bombeiros que atuaram em Niterói estão elaborando um relatório sobre o caso para ser debatido na próxima reunião do grupo, no dia 12. O coronel Marcos Silva, comandante das unidades especiais do Corpo de Bombeiros, lembra que foram oito as tentativas de resgate da jubarte:
- Faltaram equipamentos.
O major Ubaldo de Oliveira, coordenador setorial do Grupo Executivo de Ações de Meio Ambiente da Defesa Civil vai propor a capacitação de guarda-vidas do Grupamento Marítimo para atuação preventiva.
- Nossos homens podem monitorar o litoral e acionar a rede quando um mamífero se aproximar das águas rasas - propõe.
As causas de encalhe podem variar de problemas de doença a os testes sísmicos e poluição.

Baía: berçário de cetáceos
Se hoje o Rio é apenas rota de passagem das baleias, seu litoral já foi, por muito tempo, berçário dos cetáceos. Biólogos revelam que a hoje poluída Baía de Guanabara era um refúgio destes animais, principalmente das baleias franca do sul, que lá se reproduziam.
A bióloga Bernadete Fragoso, do Maqua/Uerj, explica que no início do século 16, cartógrafos já retratavam as enormes criaturas. Padre Anchieta também citou, em alguns de seus escritos, o espetáculo dos cetáceos.
- A quantidade de baleias era tanta que elas eram fonte de alimentação dos índios - informa Bernadete.
O historiador Milton Teixeira acrescenta que as baleias, em geral, eram retratadas como animais tenebrosos. Ele destaca as imagens feitas pelo frade franciscano André Thevet, no século 16, e uma pintura de Leandro Joaquim, de 1790, que retrata a pesca dos cetáceos.
Teixeira explica que as baleias eram caçadas e levadas para Niterói, onde eram destrinchadas. Seu óleo era usado na iluminação da cidade e na construção de casas. No século 18, suas barbatanas serviam para a confecção de espartilhos.
Um dos que lucraram com a pesca dos animais foi Brás de Pina, no século 17. A atividade entrou em decadência na metade do século 19, quando o Centro ganhou a iluminação a gás. De acordo com Teixeira, no século 20 ainda havia a presença de cetáceos na Baía de Guanabara. Tanto que, em 1943, observadores do Forte Duque de Caxias, no Leme, confundiram as baleias com submarinos alemães. Um bombardeio contra os animais durou 15 minutos, até que a confusão foi desfeita. Por sorte, nenhuma foi acertada. A caça, entretanto, acabou por extinguir os animais no litoral do Rio.

Vitória para os animais
Em julho passado, o governo brasileiro ganhou, em solo italiano, uma batalha importante para a preservação das baleias: na 56ª reunião anual da Comissão Internacional da Baleia (CIB), a ministra Marina Silva conseguiu aprovar a criação do Santuário de Baleias no Atlântico Sul. A idéia, proposta pelo Brasil em 1998, ganhou o apoio da Argentina e da África do Sul e, segundo Walter Plácido, está em fase de implementação.
Com a aprovação do santuário, fica probida a caça comercial de baleias em toda a área abrangida entre o Equador e a Terra do Fogo. O objetivo é possibilitar a pesquisa dos cetáceos nesta área - incluindo o monitoramento da recuperação de espécies dizimadas e análise de possíveis ameaças - e promover, a longo prazo, a preservação de grandes baleias.
- Esta é uma vitória muito importante pois, apesar de a caça estar proibida na costa brasileira, estes cetáceos ainda eram ameaçados no meio do Atlântico - ressalta Plácido.
A proibição da caça nesta área será revista 20 anos após a sua adoção inicial e, posteriormente, em intervados de 10 anos.

JB, 05/09/2004, p.

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