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Guerrilha colombiana planeja ataques na fronteira

OESP, Nacional, p. A10
27 de Jun de 2004

Guerrilha colombiana planeja ataques na fronteira
Objetivo é capturar armas, remédios e alimentos para os combatentes das Farc

ROBERTO GODOY

A guerrilha das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) planeja há dois meses ataques contra posições do Exército Brasileiro na fronteira. O objetivo das ações é obter armas, munições, suprimentos médicos e alimentos para abastecer as colunas guerrilheiras em atividade na área. O efetivo militar do Brasil no local foi reforçado com 40 homens, profissionais especializados em luta de selva.
Há cerca de um mês os serviços de inteligência do Comando Militar da Amazônia (CMA) levantaram a informação da realização de uma reunião da coordenação superior das Farc, dia 1.o de maio, na cidade de Montenegro, em território colombiano. No encontro, discutiu-se a invasão do 2.o Pelotão Especial de Fronteira (PEF), em Querari.
Poucos dias depois um grupo de reconhecimento das Farc, composto por 12 homens, foi localizado a apenas dois quilômetros da divisa com o Brasil.
Fotos de satélite produzidas para o Ministério da Defesa, mostram as marcas de um acampamento na área habitualmente utilizada pela guerrilha em meio à mata baixa.
Coluna - No momento a guerrilha está agrupando uma coluna (que pode chegar a 160 homens e mulheres) em Jurupari. Quando estiveram em Montenegro, os insurgentes procuraram saber qual era o formato do 2.o PEF, seu armamento e tamanho dos quadros.
De acordo com o general Villas Boas, chefe do Estado Maior do CMA, por conta da ameaça o Comando de Fronteira do Rio Negro/5.o Batalhão de Infantaria de Selva (CFRN/5.o Bis) enviou uma tropa de 40 homens para apoiar o 2.o PEF de Querari.
Cada pelotão possui 70 soldados bem armados e treinados. De acordo com Villas Boas, "a formação tem condições de sustentar fogo até receber reforços". O Estado Maior do CMA considera a ameaça de incursões no território brasileiro "uma possibilidade que, por si só, justifica o constante preparo da tropa".
Os melhores - Esse corpo de batalha abrange cerca de 27 mil homens, entre os quais os integrantes das unidades de Infantaria de Selva, talvez os melhores combatentes desse tipo em todo o mundo. Envolve também os avançados recursos da Força Aérea Brasileira (FAB) - aviões eletrônicos R99A, de alerta avançado, e R99B, de sensoriamento remoto, ambos montados sobre as plataformas dos jatos civis da Embraer, os ERJ-145. Essas aeronaves atuam combinadamente com os radares do Sistema de Vigilância da Amazônia (Sivam) e podem lançar caças ou turboélices de ataque leve em missões de interceptação de aeronaves clandestinas ou de ataque ao solo.
É um trabalho complexo. Em 2003, foram detectados perto de 3 mil vôos irregulares. O Comando da Aeronáutica sustenta que 220 deles eram criminosos, a serviço do narcotráfico ou do contrabando de armas.
Em um só dia de setembro do ano passado houve 28 invasões do espaço aéreo.
Em várias ocasiões o intruso foi acompanhado por aviões da FAB até deixar os limites nacionais ou pousar em uma pista não cadastrada.
Constrangedor - O País ainda não regulamentou a Lei do Tiro de Destruição, aprovada em 1998, que permite abrir fogo contra aeronaves que não respondem à ordem de pouso imediato quando em situação anormal e hostil.
Pelas normas vigentes só pode ser abatido um avião que eventualmente ameace o centro do governo ou instalações estratégicas. Ainda assim, a ordem tem de partir diretamente do presidente da República.
Essa situação vai ficar constrangedora a partir da entrada em operação, até outubro, dos moderníssimos aviões de ataque leve Supertucano. São 76 unidades construídas pela Embraer a um custo de US$ 400 milhões. Do lote total, 25 foram designadas para servir ao braço armado da FAB junto ao Sivam.

Choques na região ocorrem há 40 anos
Combates e mortes aumentaram a partir dos anos 90, mas eram mantidos em sigilo
A guerrilha colombiana está em luta contra as tropas do governo há 40 anos e desde 1990 tem entrado em choque com forças do Exército Brasileiro. Só agora esses choques armados estão sendo admitidos, por inspiração do general-de-exército Cláudio Barbosa de Figueiredo, o chefe do Comando Militar da Amazônia.
O ex-presidente Itamar Franco determinou que os confrontos fossem mantidos em sigilo. Fernando Henrique Cardoso aprovou a doutrina da tolerância zero em relação a incursões guerrilheiras pelo território brasileiro com a ressalva, proposta reservadamente pelo então chanceler Luiz Felipe Lampreia, de que todos os episódios deveriam, em princípio, ser reduzidos à dimensão de ocorrência policial. Foi assim em 2002, quando um grupo das Farc trocou tiros com soldados do 3o Pelotão Especial de Fronteira. A primeira nota sobre o assunto atribuía a escaramuça a garimpeiros clandestinos.
Mortes - Em fevereiro de 1991 o Destacamento do Rio Traíra foi atacado por 40 rebeldes. No confronto morreram 3 soldados e 9 ficaram feridos. Três semanas mais tarde houve um novo choque. Sete guerrilheiros foram mortos.
Há dois anos, também em fevereiro, em Vila Bittencourt, um barco motorizado, ocupado por um grupo avançado das Farc, tentou escapar de uma barreira de Inspeção e Controle no Rio Japurá, no porto do 3.o PEF. Houve intensa troca de tiros. Um sargento brasileiro foi dado como desaparecido. Embora os corpos nunca tenham sido encontrados, o próprio comando das Farc admitiu cinco baixas entre os rebeldes colombianos.
Durante a Operação Querari - um grande exercício envolvendo 5 mil soldados e 36 aviões de diversos tipos - uma companhia guerrilheira infiltrada além da fronteira com o Brasil esperava em Açaí, Amazonas, um vôo clandestino transportando armas que a guerrilha pagaria com pasta de cocaína.
Foram surpreendidos por pára-quedistas, lançados à noite. O time das forças especiais cercou a pista. Houve fogo pesado. Os guerrilheiros se retiraram.
A ameaça atual, novamente sobre Querari, "pode ser considerada sob controle:
a presença da infantaria de selva de Manaus reforçando o Pelotão de Fronteira terá efeito dissuasivo" afirma o coronel colombiano José Rangel, do Estado Maior das Forças Militares da Colômbia.
O oficial reconhece que do lado colombiano o controle do dos 1.600 quilômetros de fronteira com o Brasil "tem sido fraco nos últimos dois ou três anos". Para ele, "os terroristas das Farc, fustigados em outras frentes, acorrem agora para esse setor".

OESP, 27/06/2004, Nacional, p. A10

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